Após mortes em hospital psiquiátrico, MP cria grupo de trabalho para monitorar saúde mental no DF

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) criou um grupo de trabalho para acompanhar a ampliação de leitos psiquiátricos na rede pública de saúde do DF. Segundo o órgão, a iniciativa surgiu em resposta a uma crescente preocupação com a política de saúde mental na região, especialmente após duas mortes de pacientes no Hospital São Vicente de Paulo (HSVP) em um período de quatro meses.

O grupo também vai monitorar a desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos, conforme prevê a legislação distrital e nacional. A lei 10.216 de 2001, que instituiu a Reforma Psiquiátrica, preconiza uma política de tratamento humanizado para pacientes com transtornos mentais, visando a integração à sociedade. No entanto, o DF tem uma das piores coberturas de Centros de Atenção Psicossocial (Caps) do país, com apenas 18 serviços desse tipo.

Segundo a 13ª edição do relatório Saúde Mental em Dados, divulgado pelo Ministério da Saúde neste ano, o indicador de cobertura de Caps por 100 mil habitantes no Brasil é de 1,17, enquanto no DF esse índice é de 0,55, o segundo pior do país, ficando atrás apenas do Amazonas (0,49). Além disso, o DF conta com apenas uma Residência Terapêutica – moradia destinada ao tratamento assistido de pacientes que necessitam de suporte contínuo à saúde mental.

A Rede de Atenção Psicossocial (Raps), da qual os Caps fazem parte, é a alternativa para o modelo manicomial de isolamento dos pacientes em instituições com internações prolongadas. A política propõe outras modalidades de assistência, por meio, por exemplo, de equipes multidisciplinares e da participação comunitária no tratamento. Já o atendimento de emergências em saúde mental deve ser feito em leitos psiquiátricos de hospitais gerais.

Com o grupo de trabalho, o MPDFT pretende monitorar a expansão da Raps. O GT é composto por membros de promotorias e núcleos especializados, sob a coordenação do procurador distrital dos direitos do cidadão, Eduardo Sabo. Participam promotores de justiça das áreas de saúde, infância e juventude, direitos difusos e coletivos, gênero, enfrentamento à discriminação e populações vulneráveis.

Cenário preocupante

A primeira reunião do GT aconteceu na última quinta-feira (8). Os participantes destacaram que apesar das melhorias na estrutura do HSVP, que esteve em reforma entre 2019 e 2023, as práticas adotadas no atendimento estariam em desacordo com as diretrizes da política de saúde mental.

Segundo o relatório da diligência realizada no HSPV no dia 23 de abril, um dia após a morte de Eva de Oliveira, 52 anos, os relatos de tortura são frequentes. Uma das pacientes teria chegado a afirmar “com riqueza de detalhes” que durante uma contenção mecânica, teria sido sufocada por um enfermeiro com um pano colocado nas vias aéreas. Ela também disse que a equipe teria dito que ela seria “a nova Raquel”, referindo-se ao fato de que a Raquel França era amarrada com frequência no hospital.

O grupo do MPDFT também discutiu o diagnóstico sobre os atrasos na execução do plano distrital de desinstitucionalização, previsto para ser implementado entre 2024 e 2027. O documento tem seis eixos principais: gestão, assistência, regulação, desinstitucionalização, comunicação e saúde. O órgão cobrou da Secretaria de Saúde um novo cronograma para a execução das medidas.

“É um tema sensível e desafiador, mas vejo todos comprometidos. Precisamos atuar com equilíbrio e responsabilidade para avançar nessa pauta tão urgente”, afirmou Eduardo Sabo. O procurador ressaltou ainda a necessidade de ampliar o olhar sobre a saúde mental, especialmente para populações historicamente negligenciadas.

Os promotores também debateram a falta de serviços voltados ao cuidado em saúde mental do público infantojuvenil. Segundo o MPDFT, há carência de Caps especializados e de leitos para adolescentes em crise. Também foi observado um aumento nos pedidos de internação compulsória via plantão judicial, o que indicaria a falta de alternativas adequadas na rede.

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