
A recente viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China resultou na abertura de novos mercados que somam US$ 20 bilhões em oportunidades para o agronegócio brasileiro, incluindo exportações de carne, soja, milho e subprodutos como o DDG (farelo de milho usado na alimentação animal). Para o analista de economia e política Miguel Daoud, o movimento é estratégico e necessário — mas escancara uma limitação histórica do Brasil: a dependência de commodities com baixo valor agregado.
“O Brasil está certo em buscar novos mercados, especialmente num momento em que a agropecuária é o setor que sustenta o país. Mas ainda exportamos o que pesa e importamos o que vale”, afirmou Daoud, em entrevista à BM&C News.
Brasil exporta à US$ 20 e importa à US$ 1.000
Segundo Daoud, o problema está na estrutura das trocas comerciais. O Brasil exporta commodities em larga escala — soja, carne, café, petróleo, minério de ferro — e importa bens de alto valor agregado, como máquinas, tecnologia e produtos industriais. “Se colocarmos na balança tudo que exportamos e dividirmos pelo que recebemos, o quilo do que vendemos vale cerca de US$ 20. O que importamos custa, em média, US$ 1.000 o quilo”, exemplifica.
Essa defasagem, de acordo com o analista, limita o avanço econômico e a geração de renda no país. “Quando você exporta inteligência, tecnologia, bens industriais, há distribuição de riqueza, qualificação profissional, inovação. Mas estamos presos à exportação primária. É como vender o milho e não o etanol ou o bioplástico feito a partir dele”, completou.
Brasil corre o risco de perder nova janela de industrialização?
Para Daoud, o Brasil corre o risco de perder mais uma oportunidade histórica de transformar o superávit agrícola em alavanca para o desenvolvimento. “No passado, o país usou o dinheiro do café para se industrializar. Agora, deveríamos estar fazendo o mesmo com o agronegócio — usar essa força para investir em cadeias de valor, tecnologia e inovação”, argumentou.
Embora celebre a abertura chinesa para o DDG — subproduto da fabricação de etanol de milho — como exemplo positivo de valor agregado, o analista reforça que o país ainda depende excessivamente da exportação bruta de insumos e alimentos.
Relações com China e EUA: pragmatismo com cautela
A China é hoje o principal parceiro comercial do Brasil. Com as tensões geopolíticas entre Pequim e Washington, o Brasil tem ocupado lacunas deixadas pelos americanos, especialmente no mercado de proteína animal e grãos. No entanto, Daoud alerta para o risco de dependência excessiva.
“É claro que temos que aproveitar essas janelas, mas isso não pode ser feito sem estratégia. Precisamos de um projeto de nação, de reindustrialização. Senão, vamos continuar vendendo commodities e comprando iPhones”, concluiu.
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O post Abrir mercado com a China é avanço, mas Brasil precisa exportar valor, alerta analista apareceu primeiro em BM&C NEWS.