A ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, participou de coletiva de imprensa nesta segunda-feira (12), em Porto Alegre, referente ao encontro “Violência Digital e a Proteção de Crianças e Adolescentes”. A ministra esteve no Rio Grande do Sul a convite da deputada federal Maria do Rosário (PT).
“Muitas vezes por trás de um joguinho inocente, ou um desenho infantil que o seu filho ou sua filha está acompanhando na internet, tem ali redes de pedofilia, ofertas de jogos digitais. Temos por trás ofertas de plataformas que trabalham inclusive com prostituição, redes de aliciamento”, ressaltou.
Além de participar do encontro organizado em parceria com a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), a ministra também compareceu na abertura do Seminário “Desafios e novas perspectivas para o pós-enchentes”e da 2ª Conferência Estadual do Povo de Terreiro.
“É muito importante, nesse mês de maio, em que a gente intensifica a nossa agenda para a eliminação da exploração e violência sexual contra crianças e adolescentes, tratar da proteção das crianças e adolescentes em um ambiente digital. Nosso governo já tem feito ações muito efetivas, nós tivemos a legislação que proíbe o uso do celular na escola, uma legislação que ela já surte efeitos concretos”, destacou Evaristo. No dia 18 de maio é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes no país.

A ministra também apresentou o guia Crianças Adolescentes e telas,Guia sobre Usos de Dispositivos Digitais, formulado com a participação de vários estudiosos. Conforme observou a dirigente da pasta, no Brasil ainda não há legislação suficiente para fazer a devida proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital.
“Esse é um debate interno, mas é um debate que se dá também de maneira mais ampla no ambiente das empresas transnacionais, várias dessas plataformas estão disponíveis no ambiente digital, não são plataformas brasileiras, que estão devidamente regulamentadas e sob a legislação brasileira. Temos que debater e regular as empresas e plataformas que operam por trás dessas plataformas e que usam o bullying, usam a violência, usam o racismo e usam a misoginia como mecanismo de auferir lucro’.
De acordo com a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024, desenvolvida pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br) e o Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (Nic.br), 83% de crianças e adolescentes de 9 a 17 anos tem perfil em alguma rede social. Já como usuárias da internet, o percentual chega a 93%. O WhatsApp é a plataforma mais usada, seguida do Instagram, TikTok e Youtube.
“Vamos ter que trabalhar nas duas redes, o Ministério, através das instruções públicas, como está fazendo com o presidente Lula, e a Câmara, que não pode mais deixar de falar em regulamentação concentrada na proteção dos direitos humanos das crianças e adolescentes. Estamos atuando fortemente, articulado com outros setores do governo federal. Mas para coibir esse tipo de crime, também temos que trabalhar com as famílias a prevenção, que é muito importante”.
A importância da denúncia e diálogo
Em janeiro deste ano a Polícia Civil do Rio Grande do Sul prendeu, na cidade de Taquara (RS), um homem suspeito de pedofilia. De acordo com a Polícia Civil, o homem teria praticado crimes ao longo dos últimos 16 anos, utilizando um perfil falso no Instagram.
De acordo com a polícia ele fingia ser uma menina para criar laços de amizade virtual, em seguida as convencia a enviar fotos de nudez, e posteriormente fazia chantagens ameaçando disponibilizar o conteúdo. Até o início de maio já haviam sido identificas 158 vítimas, com idades entre 8 a 13 anos. A estimativa é que o número seja maior, uma vez que foram encontradas 700 arquivos. O caso veio à tona após uma menina de 13 anos, colega de Muay Thai do investigado, ter alertado os pais, que procuraram a polícia.
“Denunciar é muito importante, mas também é importante que essa conversa chegue até as crianças, para que ela saiba se defender, porque muitas vezes a criança fica constrangida, é ameaçada, não sabe que ela pode recorrer a alguém”, afirmou Evaristo.
Nesse sentido, reforçou a ministra, a importância do Guia. “Quando nós atuamos nessa formação, disponibilizamos um material que foi pensado, debatido por educadores, pesquisadores da área, por redes que atuam monitorando esses grupos na internet, nós estamos dando elemento para que essas pessoas possam aprimorar o seu trabalho, a sua observação. Então tratar isso em um ambiente familiar, em um ambiente escolar é muito importante”.

Evaristo lembrou também sobre um programa trabalhado há muitos anos no país que versava sobre a e educação afetivo-sexual, tema que se tem muita resistência. De acordo coma ministra trata-se de ensinar a criança a conhecer o seu corpo, mas também a pôr limite, saber se proteger, saber que ninguém pode tocar indevidamente, não pode expor a sua imagem indevidamente.
“As pessoas precisam aprender, nós temos que sempre considerar que nessa relação a criança é uma vítima. Uma adolescente de 13 anos é vítima. Uma jovem de 15 anos é vítima. A gente não pode tolerar esse tipo de situação, relativizar essas questões. Exploração e violência sexual, seja fisicamente, seja por meio das redes sociais, é crime”.
De acordo com o Disque 100, do Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania até o dia 4 de maio foram registradas 102.047 violações contra crianças e adolescentes. Destas 570 no ambiente virtual. Em 2024 o registo foi de 2.416 denúncias.
Regulamentação
“A gente tem um debate de regulamentação, de regularização das mídias, da imprensa, que é importante. Mas primeiro a gente precisa distinguir imprensa, meios de comunicação, de ambiente digital”, pontuou a ministra.
Conforme apontou a ministra uma série de crimes são cometidos cotidianamente na internet, por trás da defesa de uma “suposta liberdade”.”Eles imputam a liberdade de imprensa, que não tem nada a ver com imprensa, nada a ver com meios de comunicação formal. Muitas vezes são pessoas que organizam essas redes de fora do país, mas isso fica disponível completamente para as crianças”, expôs.
Evaristo enfatizou que as plataformas precisam se responsabilizar sobre o que elas estão disponibilizando. “A gente precisa avançar para entender que cada conteúdo, por trás dele, tem que ter um CPF ou um CNPJ. É um debate duro, porque tem a ver com temas complexos, mas precisaremos falar sobre isso. Precisamos falar, por exemplo, sobre a TV a cabo. O que os canais brasileiros estão submetidos, e o que os canais que operam no Brasil por meio da TV a cabo não estão submetidos”.
Para a ministra, é preciso fomentar a discussão sobre soberania nacional e de um projeto que se quer para o país em direitos humanos. “Isso tudo está correlacionado. O que a gente está fazendo aqui é chamar a atenção. É preciso que a sociedade brasileira venha participar desse debate. O caso que aconteceu aqui no Rio Grande do Sul não é único. Esse é o que veio à tona, que foi descoberto e que vai ter consequências. A pessoa será penalizada. Mas nós temos inúmeros processos de impunidade”.
