
Um fungo resistente a tratamentos convencionais, causador de infecções de pele graves e difíceis de tratar, foi identificado pela primeira vez no Brasil em 2023. O Trichophyton indotineae foi isolado em um paciente brasileiro após viagem a Londres, segundo estudo publicado nos Anais Brasileiros de Dermatologia.
De acordo com Gil Benard, coordenador do Laboratório de Micologia Médica do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da USP, o fungo provoca infecções cutâneas inflamatórias e é resistente à terbinafina, medicamento considerado padrão no tratamento de micoses. “Até então, não tínhamos identificado esse fungo no país”, afirmou.
A dificuldade de diagnóstico contribui para a subnotificação dos casos na América do Sul. “É necessário o sequenciamento genético para identificar a espécie e o gene de resistência. No microscópio, é possível ver que é um dermatófito, mas não distinguir o T. indotineae”, explica Benard.
O caso que levou à descoberta foi atendido na Santa Casa de São Paulo, sob coordenação do dermatologista John Verrinder Veasey. O paciente foi submetido a diferentes tratamentos, mas apresentou recidivas até receber a medicação adequada, com melhora posterior.
Especialistas alertam que alterações climáticas e o uso indiscriminado de antifúngicos e pesticidas podem favorecer o surgimento de fungos resistentes. “Pesticidas vendidos em pet shops e usados em casa têm estrutura química semelhante aos antifúngicos humanos. A exposição frequente pode gerar resistência”, destaca Maria da Glória Sousa, professora de Micologia Médica da USP.
Benard acrescenta que a automedicação agrava o problema. O uso inadequado de antifúngicos tópicos, muitas vezes combinados com corticoides, pode mascarar sintomas e dificultar o tratamento. “As infecções de pele, antes consideradas simples, estão se tornando um desafio”, diz.
A preocupação é reforçada pela falta de opções terapêuticas. “Temos poucos antifúngicos disponíveis”, lembra Maria da Glória. Embora a micose causada pelo T. indotineae não tenha alta letalidade, as lesões extensas e resistentes impactam seriamente a qualidade de vida dos pacientes.
Para prevenir infecções, os especialistas recomendam evitar andar descalço em ambientes públicos úmidos, como academias e piscinas, manter a pele limpa e seca, usar roupas leves que permitam ventilação e evitar a automedicação em casos de micose, buscando orientação médica ao primeiro sinal de lesão.