Hotel em Cascais garante experiência completa e espaço de fuga

Hotel em Cascais garante experiência completa e espaço de fugaCamila Iannicelli

Em 2021, estive em Cascais num projeto de uma residência literária. Numa dessas voltas estranhas do calendário, exatos três anos depois, eu estava de novo em Cascais para um breve retiro literário. Dessa vez, foi a convite do Hotel Villa Itália.

Um hotel de luxo, com muitas estrelas e onde eu, normalmente, não me hospedaria. Afinal, vivo de escrever. Já escrevi e escrevo frequentemente sobre essas fugas oníricas que chamamos de hotéis. A tensão de escapar encontra um respiro profundo ao cruzar a porta giratória.

Estou no hall, sentada no canto de um esguio sofá de revestimento verde-escuro. Não consigo me lembrar se é de veludo ou não, o que é incomum, já que sofro com veludo o que tanta gente sofre com a unha deslizando no quadro negro.

Não consigo me lembrar dessa textura talvez porque pouca coisa me incomoda neste momento de ver as pessoas que chegam: ajeitam a coluna, ficam eretas, os músculos da boca parecem relaxar, os passos estão leves e decididos à bancada de check-in. Essas pessoas conseguiram escapar.

Naquele período suspenso onde toda manhã alguém cozinha ovos Benedict para mim, espero o rapaz que traz meu café com leite com a suavidade dos que não têm preocupações na vida. Mas ele tem. Eu também. Nossa interação nesse ambiente luxuoso que alterna o verde-musgo e os tons pasteis é brevíssima, temporária.

Há qualquer coisa não dita entre nós que esclarece nosso papel de infiltrados num mundo tão esplêndido e que não nos pertence. Sei disso porque quando termino de comer, junto os farelos num prato, empilho os pratinhos e garfos e tenho certeza que, se alguém me vê, imagina que eu, sem maneiras, não sei o que fazer diante do luxo.

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Durante os dias penso em me esconder no quarto que é mais amplo do que o apartamento que eu alugava no Bairro Peixoto, em Copacabana, no final dos anos 90.

Certamente os dois chuveiros desse quarto só pra mim são infinitamente melhores do que o que vivia queimado na kitnet com vista para a área de serviço de parede cinza e manchada do prédio vizinho naquele Rio de Janeiro caótico, nojento e sexy. Mas no quarto não tem uma escrivaninha com vista pro mar.

A imensa TV se impõe inútil e profundamente negra durante a minha estadia. Por isso, desço para procurar o som ondulante que escuto constantemente da minha varanda. O mar de novembro em Cascais é cinza, feroz, inquieto e faz um barulho angustiado. Escolho a maior mesa do terraço.

Estou sozinha, mas tenho livros, caderno, computador, lápis, apontador, preciso desse espaço, mas preciso mais ainda ocupar essa mesa sem pedir desculpas por estar ali. A impostora insistente que me acompanha mesmo quando a expulso da minha vista dá um risinho cínico. Me lembro, no entanto, que estou ali porque a minha moeda de troca é a minha escrita.

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Curvo os ombros, posição natural de escrever, começo um texto. Aceito o café feito pra mim. Quando termino ou quando me canso, arrasto a cadeira, fico ereta como aqueles que entram no saguão, imagino como deve ser a vida de alguém que viaja e escreve. Olho minhas próprias mãos. O lugar é meu, afinal.

(agradecimento ao Real Hotel Vila Itália, em Cascais)

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