Saco de cimento, fibra de bananeira e retalhos de jeans: estilistas apostam na moda sustentável


Stands com marcas de moda autoral participaram da 32ª Edição do MinasTrend na capital mineira. Estilista exibe roupas e bolsas feitas com reaproveitamento dos papéis de sacos de cimento, em BH
Patrícia Luz/g1
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Preocupadas com os impactos ambientais, marcas mineiras investem na produção de moda sustentável e na criatividade. Retalhos de jeans, papéis de sacos de cimento e até ervas medicinais são utilizados em peças de roupas que estiveram expostas na 32ª edição do MinasTrend, em Belo Horizonte.
Iáskara Oliveira, de 36 anos, é formada em design de moda pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Em 2013, o tema do seu trabalho de conclusão de curso (TCC) era moda sustentável.
A inspiração surgiu após uma disciplina chamada ‘artes da fibra’, onde ela aprendeu a trabalhar com papel. A partir disso, produziu uma “peça-piloto”. Por conta da repercussão positiva, as pessoas queriam adquirir o produto.
Estilista exibe roupas feitas com reaproveitamento de papéis dos sacos de cimento
“Eu queria fazer algo que fosse sustentável, que eu conseguisse tirar resíduo do meio ambiente, mas que não tivesse cara de reciclado, que não tivesse cara sustentável”, disse.
A empresária também produz bolsas modelo carteira. Segundo ela, durante os 13 anos da marca autoral, a arrecadação dos sacos de cimento são feitos periodicamente com o setor da construção civil.
Estilista reaproveita papel de saco de cimento para produzir roupas, em Belo Horizonte
Acervo Pessoal/Reprodução
“A última vez eu processei 500 sacos de cimento, então eu faço uma grande remessa. Geralmente vou na obra, converso com a pessoa responsável pela obra, explico o projeto, mostro o trabalho, peço pra eles juntarem e no final de semana eu busco.”
Para o processo de coloração e tingimento das roupas, Iáskara utiliza café, cochonilha ou substâncias químicas.
“Na verdade, eu pego o saco de cimento, vou limpar ele, ele vai ficar de molho, ele fica de molho por dias, bato ele no liquidificador e ele vira uma fibra. Aí eu misturo fibra de bananeira pra deixar ele mais resistente”, afirmou.
Iáskara Oliveira faz desenhos com fibras feitas com papel de saco de cimento
Acervo Pessoal/Reprodução
Como armazenar?
A empresária afirma que existem clientes que têm a mesma peça há dez anos. A forma de armazenar precisa ser cuidadosa, mas há quem prefira pendurar no cabide ou guardar dobrado, vai de cada um. Ela alerta que a roupa não é impermeável.
“Então, tem uma forma de higienização, que eu recomendo pra quem compra. Você pode dobrar normalmente a roupa, passar com ferro à vapor, pode ir no cabide, pode guardar dobrado, vai depender da pessoa, né?! Mas assim, você pode dobrar, vai amassar obviamente porque é papel, mas depois você passa e fica novo.”
Indústria têxtil e os danos ao meio ambiente
O projeto “Fios da Moda”, feito por Juliana Picoli, pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em parceria com o Instituto Modefica, mostrou que em 2022, só no Brasil, foram produzidas quase 9 bilhões de novas peças por ano. Isso dá uma média de 42 novas peças de roupa por pessoa em 12 meses.
Vista aérea de lixão de roupas em Alto Hospicio, no Chile
Martin Bernetti/AFP
Para Flávio Luiz Santos Soares, especialista em educação ambiental e mestre do núcleo de qualidade do ar da Universidade Federal do Espírito Santo, o descarte de resíduo, é um problema em toda a sua escala. Ele afirma que a indústria têxtil também é responsável pela emissão de CO² na atmosfera.
” O CO² com a questão do aquecimento global, os raios solares são retidos na superfície e aí tem o aumento do calor, eventos extremos climáticos e outras consequências na troposfera, além da perda da biodiversidade e alterações de ecossistemas” explicou o engenheiro ambiental.
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Outras apostas
Durante a feira, outras marcas autorais e com foco em sustentabilidade, exibiram peças em um espaço compartilhado.
Ângela Baltazar mostra roupas naturais com o uso de ervas
Patrícia Luz/g1
Ângela Baltazar, fundadora da marca Savre – que significa ervas ao contrário – faz um trabalho de hemoterapia com roupas naturais. Tudo começou em 2022, quando ela iniciou um projeto por conta de um estudo na pós-graduação. Ela utiliza o tecido como veículo energético e trabalha com tecidos naturais, como linho, algodão e seda.
Segundo a estilista, de 47 anos, todo tecido é reaproveitado em lenços ou mini almofadas com erva dentro, para dar ‘cheirinho’. Ela diz ter uma ancestralidade “dentro das ervas”.
“Minha avó e minha mãe eram erveiras. […] Eu faço as peças sob medida. […] O tingimento das peças é feito com ervas. Todo resíduo das ervas viram adubo, então também não existe desperdício. Eu faço os blends com várias ervas, uso a composição das ervas de acordo com o caráter fitoterápico e fitoenergético pra fim terapêutico”, explicou.
Bia Pereira exibe bolsa que criou com reaproveitamento de jeans, em BH
TV Globo/Reprodução
A estilista Bia Pereira, criou uma coleção chamada “Broto”, inspirada na natureza. Antes conhecida como Bia Jeans, desde 2012, ela comercializa as peças autorais feitas com reaproveitamento de retalhos do jeans. Certamente, o tecido mais famoso e utilizado no mundo.
“Eu plantei a sementinha lá atrás. […] Esse conceito é quando você pega uma peça que seria descartada e da vida a outra peça. Eu vejo que a moda mineira é sempre uma referência e agora dando esse conceito de sustentabilidade que é o futuro. […] Sou muito feliz e realizada,” afirmou.
Estilista usa enfeite com “jeans reciclável” em blazer
TV Globo/ Reprodução
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