Ocupação Maria da Conceição Tavares, no centro de Porto Alegre, celebrou um ano nesse domingo (8)

No dia 8 de junho de 2024, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) ocupou o antigo prédio do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) na Av. Borges de Medeiros, no centro histórico de Porto Alegre. Em homenagem à economista Maria da Conceição Tavares, falecida no mesmo dia, batizou a ocupação com seu nome.

A ocupação surgiu como resposta à retirada de famílias atingidas pela enchente de maio de abrigos improvisados (como escolas) devido ao retorno às aulas.

Após um ano de ocupação, o MTST celebrou a data neste domingo (8) com um almoço coletivo aberto à comunidade, com pratos tradicionais e veganos. O “Tempero de Luta”, evento já tradicional realizado na Cozinha da Azenha, reforçou a conexão entre alimentação, resistência e construção coletiva. O espaço, que hoje abriga cerca de 100 famílias, nasceu da articulação entre a cozinha solidária e o movimento por moradia. Segundo o coordenador da ocupação, Caio Belolli, a ausência de respostas do poder público foi decisiva para a mobilização do movimento.

“O poder público não tinha plano. Foi o povo que se organizou”, afirma Caio Belolli, coordenador da ocupação – Foto: Jorge Leão

“Durante a enchente, a gente atendeu 38 territórios e vimos que o poder público não tinha nenhum tipo de ação para a população atingida”, afirmou. “Ocupamos espaços que deveriam cumprir a função social da propriedade e não cumprem.” Para ele, a localização da ocupação também carrega um significado político. “O centro de Porto Alegre tem muitos prédios desocupados. Por que não trazer o povo trabalhador para cá, dando pertencimento ao centro da cidade?”

“A ocupação me tirou da rua”

Juciara de Oliveira, de 33 anos, moradora de Eldorado do Sul, relata que precisou deixar sua casa após um incidente em seu bairro, agravado pela enchente. Sem alternativas, passou a viver nas ruas da Capital com o companheiro, até que conheceu a cozinha solidária do MTST.

“No começo, íamos só pegar marmita. Depois começamos a ajudar na cozinha”, conta. “Nos disseram que quem ajudasse poderia conseguir moradia. Viemos com esse intuito e acabamos ficando.” Para ela, a ocupação é uma resposta concreta à falta de políticas públicas. “Estava na rua, à mercê da sociedade, que julga sem saber. Eu estudava, trabalhava, pagava aluguel. Do nada, a vida virou.”

Juciara também destaca a organização interna da ocupação. “Não pode usar droga, não pode beber. Não é lugar de vagabundo. Tem mães, pais, filhos. Se não fosse a ocupação, estariam na rua.”

Zoraia e Juciara (da esquerda para direita) vivem hoje no prédio ocupado. “Se não fosse o movimento, eu tava na rua. Aqui a gente tem teto, comida e dignidade”, fala Juciara – Foto: Jorge Leão

“É o movimento que dá dignidade pra gente”

Zoraia Caldas Peres, 39 anos, está na ocupação há cinco meses com seus quatro filhos. Ela chegou ao local por meio da cozinha solidária e hoje é uma das responsáveis pelas refeições da ocupação.

“Meus filhos só têm alimento graças ao movimento. O meu filho autista só tem medicação porque o movimento ajuda”, explica. “Cama, colchão, toalha, tudo foi o movimento que conseguiu pra gente.”

Zoraia afirma que a estrutura oferecida pela ocupação ajudou a recuperar a estabilidade de sua família. “Se não fosse o movimento, eu tava numa depressão complicada. A sociedade só sabe fechar portas. Aqui a gente tem um teto, comida, dignidade.” Ela também chama atenção para a importância da solidariedade. “A gente precisa que a sociedade tenha mais empatia, que olhe por nós e pelos nossos filhos.”

Almoço comunitário marca um mês da ocupação. Cozinha popular garante alimentação e fortalecimento dos laços entre as famílias – Foto: Jorge Leão

Ocupação defende o direito à moradia e à reparação

O movimento defende que o prédio público deixe de ser operacional, seja transferido à Secretaria do Patrimônio da União (SPU) e reformado para moradias populares via programa Minha Casa, Minha Vida. Desde a ocupação, o MTST enfatiza que moradia não é apenas teto, mas estrutura para reconstrução de laços e superação de traumas. A proposta apresentada defende que reconstrução sem reparação é insuficiente: “é preciso preservar vínculos com saúde, educação e trabalho, e incluir as famílias no planejamento urbano”.

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