Por volta do ano de 2008, estava numa pequena sala onde havia duas ilhas de edição no Ponto de Cultura Para’iwa em João Pessoa, capital paraibana. Eu era estudante de Jornalismo da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e estagiário, aprendia audiovisual enquanto conhecia o trabalho desta ONG que tinha um vasto currículo com projetos relacionados a meio ambiente, cultura popular e formação de jovens em informática e audiovisual, além de apoiar a produção de filmes de cineastas paraibanos.
Enquanto eu organizava filmes de curta-metragem realizados em oficinas de cinema em que era monitor, o produtor cultural Danylo Aguiar entrou na sala. Ele buscava apoio para a pós-produção de um DVD musical de Paulo Ró, integrante do Jaguaribe Carne e importante nome da música paraibana. Nós já éramos companheiros do movimento estudantil da UFPB, integramos a gestão do DCE Levante e Lute (aqui valeria outro relato), e tínhamos a militância cultural em comum, e muita vontade de fazer os nossos sonhos acontecerem.
Danylo precisava de ajuda para reeditar o musical Paulo Ró — A Música em Si, e eu me ofereci para participar do projeto e tentar fazer uma nova versão do musical realizado em parceira com a TV Cidade de João Pessoa. Ao conhecer o material, e depois de algumas conversas, nós decidimos que era necessária a captação de depoimentos e imagens para complementar a riqueza musical do projeto: era inevitável transformar este “DVD” em um documentário musical. Iniciamos uma jornada que duraria anos.
Com o apoio de amigos e do Núcleo de Produção Digital da Paraíba (NPD-PB), fomos para a cidade de Lucena (PB), onde Paulo Ró reside com sua esposa Tina. Foi um momento riquíssimo. Os depoimentos do “Paulo Roberto do Nascimento” foram uma aula sobre música e produção artística paraibana, de uma geração da qual fazem parte Chico César, Pedro Osmar (irmão de Paulo), Totonho, Escurinho, Milton Dornelas, Adeildo Vieira, Águia Mendes, Sandoval Fagundes, Diógenes Chaves, estes aqui citados porque deram depoimentos para o nosso trabalho. Além de Haley Guimarães, já da minha geração, que fazia parte do Coletivo Burro Morto na época das gravações. A mãe de Paulo Ró e Pedro Osmar, Maria Isabel do Nascimento, já falecida, faz uma pequena participação no filme. Também o músico Ruy José, que aparece ao lado de Haley, não está mais entre nós. Vale também como homenagem e registro de suas vidas.
Outro ponto importante do processo de edição e montagem foi a inserção de fotografias do livro Nação Jaguaribe, de Gustavo Moura e Wênio Pinheiro. Este projeto conta com fotos feitas no bairro de Jaguaribe, em que Paulo Ró cresceu e que também aparece no filme. As imagens deram a dinâmica e a beleza que foram fundamentais para acrescentar mais poesia visual aos clipes gravados no estúdio Giulian Cabral, com a direção de Marcelo Macêdo, parceiro de Paulo também em outros projetos musicais, e a direção musical foi de Helinho Medeiros, que toca teclado nas gravações.

Após várias idas e vindas de como deveria ficar o documentário em sua montagem final, acabou que nós da produção sempre tínhamos a sensação de que faltava alguma coisa, e ficávamos adiando o lançamento. Desta forma, o doc-musical ficou engavetado até que fosse oportuno a gente trazer ele à tona e fazer a sua estreia.Em 2013, fui convocado para o concurso que fiz para a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). O tempo era curto e tive que mudar para Brasília às pressas. Trouxe o material junto comigo.
Contudo, ao verificar a última versão do trabalho, a master estava corrompida. Tentei reverter a situação, mas simplesmente os softwares de edição não reconheciam o arquivo: o documentário estava perdido. Havia apenas uma versão inicial do trabalho no canal do Youtube de Paulo Ró, que ele subiu em 2020, o qual nos dava a sensação de que pelo menos alguma lembrança tinha ficado do registro, mas sem depoimentos e outros conteúdos que nós tivemos tanto trabalho para realizar.
Chegou 2025. Devido à necessidade que tive de descartar alguns materiais de informática ultrapassados ou inúteis, fiz uma verificação em todos os meus HD’s que ainda funcionam. Por acaso, achei o arquivo do documentário Paulo Ró — A música em si. Tentei recuperar o arquivo que, para minha surpresa, com a evolução dos softwares de pós-produção, deu certo: consegui fazer a master funcionar. Aproveitando, fiz uma atualização no formato, apliquei um filtro para retirar um pouco do aspecto de câmera de TV, e ampliei para a resolução HD. Era a hora de colocar esse trabalho nas plataformas digitais e entregar esse filme e seu destino para o universo.
Com muita satisfação, publiquei o documentário no Youtube e espero que as novas gerações conheçam Paulo Ró. Um guerrilheiro cultural, compositor e autor de músicas antenadas com o mundo muito antes que se falasse em internet e redes sociais. E assim, a gente deseja que a música, a poesia, a fotografia, as artes visuais e o cinema da Paraíba, desse Brasil de um céu só, sejam fontes de inspiração para aquilo que gente sabe fazer muito bem: cultura!
*Thomas de Freitas é diretor, produtor e roteirista de audiovisual, atualmente é coordenador de serviços de produção de programas do Canal Educação e Canal GOV da EBC.
**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.
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