Especialistas avaliam mercado imobiliário em cenário de juros elevados

Foto: Johannes Plenio (Pexels).

No ano de 2015, os juros praticados nas transações no Brasil atingiram o patamar de 14,25%. A julgar pelos efeitos na economia naquele período, há motivos para preocupação com os juros atuais. Naquele ano, o setor de construção civil teve a maior retração das últimas décadas, com queda de 33% nos financiamentos imobiliários. De modo geral, a atividade econômica no Brasil desacelerou, houve aumento da taxa de desemprego, culminando em 2017 num dos piores cenários econômicos da história recente do país.

Com a taxa Selic hoje em 14,75%, 2025 vem mostrando resiliência até agora, com níveis de empregabilidade acima da expectativa (em janeiro, fevereiro e março a taxa de desocupação foi de 7%, a menor em 13 anos). Mas, diante dos juros elevados e das incertezas globais contemporâneas, será que essa resiliência terá fôlego para os anos que virão?

Para responder a essa pergunta, a coluna ouviu dois especialistas no assunto. A primeira análise é da advogada Gabriela Campostrini, que atua com reestruturação empresarial, e falou mais especificamente do setor imobiliário. A segunda é do economista Vaner Correa, auditor e perito judicial, que tratou do cenário macro econômico.

Desafio

Gabriela Campostrini. Foto divulgação.

Gabriela Campostrini considera que hoje, mais do que nunca, as empresas do setor devem se adaptar às novas regras e encarar o desafio de se reinventarem para se manterem ativas. “A alta da Selic, entre 14% e 15%, impõe um novo jogo ao mercado. Para o setor, a disciplina financeira e um planejamento jurídico sólido serão essenciais para garantir estabilidade e crescimento sustentável. A euforia dos tempos de crédito abundante acabou. Agora, a regra é cortar custos, ajustar preços de venda, otimizar processos e garantir liquidez. Empresas que compreenderem que não há mais espaço para aventureiros prosperarão; as que insistirem em velhas fórmulas pagarão o preço”.

Recuperação judicial

E para fazer esse freio de arrumação, em especial aquelas empresas em maior dificuldade, Gabriela cita a importância de um instrumento legal considerado antipático pela maioria, mas que pode ser uma luz no fim do túnel. Trata-se da Lei Federal 11.101, que normatiza as recuperações judiciais. “A construção civil, espinha dorsal do desenvolvimento urbano, não pode ignorar essa salvaguarda. O mercado pune a ineficiência, mas recompensa quem se adapta. A recuperação judicial não deve ser um atalho para postergar o inevitável, mas uma ferramenta legítima de reestruturação, capaz de oferecer às empresas viáveis um fôlego necessário para atravessar a tempestade sem comprometer sua capacidade de retomada”, analisa.

Na contra mão da teoria liberal

A coluna também traz a visão de Vaner Correa, economista formado pela Ufes, com mestrado em Economia e doutorado em Geografia, que possui larga experiência como auditor e perito judicial.

Vaner lembra da Teoria Geral do Emprego, Juro e Renda, do economista inglês John Maynard Keynes, segundo o qual, quando o retorno médio dos negócios reais da economia fosse maior do que a taxa de juros base, o rentismo (o lucro sem produção de bens e serviços, apenas especulativo) desapareceria. Para ele, por ações erráticas do Governo Federal, o caminho seguido hoje é o inverso.

Vaner Correa. Foto divulgação.

“Estamos vivendo uma realidade bem diferente daquela que Keynes mencionou em sua obra, a saber, elevamos a taxa base de juros da economia para um patamar tão elevado, tendo o objetivo de reduzir a inflação, que estamos tirando tanta energia do sistema econômico para conter as pressões inflacionárias, que o remédio já deixou de ser remédio e passou a ser veneno. A economia se desacelerará”, aposta Correa.

Falta equilíbrio fiscal

Para ele, o Governo Federal deveria reduzir as despesas públicas e assim equilibrar o orçamento fiscal, mas não o faz. Desse modo, os títulos lastreados no IPCA e na SELIC passaram a render bastante para os bancos, donos da maioria desses títulos. “Por conta disto, por qual motivo vão continuar a financiar a economia? Com todos os riscos inerentes aos empréstimos, o maior deles a inadimplência, se já estão financiando o inchaço do Estado brasileiro?”, critica.

O economista lamenta a desconexão entre a política econômica do Governo Federal e a linha de atuação do Banco Central, e finaliza dizendo que, quanto mais persistir esse cenário, mais o mercado de capitais se tornará o destino de investimentos do setor privado.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.