Mulheres trabalhadoras da saúde e educação desejam mudanças: equidade de gênero e salarial

No ano de 2023, o Brasil alcançou um recorde histórico no número de mulheres no mercado de trabalho. Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, 43.380.636 mulheres estavam ocupadas, superando o número de 42.675.531 registrado em 2022. São dados para comemorar, porém longe de serem os ideais para as mulheres que ainda lidam com dificuldades e desafios para se manter no mercado de trabalho.

O Brasil de Fato Paraná conversou com mulheres trabalhadoras das áreas da saúde e educação, carreiras com predominância feminina. As entrevistadas citaram sobrecarga e desigualdade de gênero e salarial como os principais desafios para se manter no mercado de trabalho. E, entre os sonhos, que as mulheres possam ser respeitadas livre do machismo e misoginia.

Sobrecarga entre o cotidiano e a profissão

A enfermeira socorrista Franciely Shadeck atua no Serviço de Atendimento Móvel (SAMU), e esta há dez anos na área da saúde. Entre os maiores desafios para se manter na carreira em que ela se realiza, destaca precisar ter dois trabalhos para alcançar uma remuneração para se manter, além da sobrecarga com outras tarefas do cotidiano. “Os maiores desafios primeiramente é conciliar trabalho na enfermagem que normalmente precisamos ter dois vínculos para podermos nos manter. E, depois com as demais tarefas cotidianas como o cuidado com a casa, família, dormir 8h, comer saudável e ter tempo para nos exercitar,” cita.

Para ela, o cenário de melhor homenagem às mulheres trabalhadoras seria o reconhecimento. “Desejo que nós mulheres sejamos valorizadas e reconhecidas. Ainda em 2025 sofremos preconceitos e desvalorizações mesmo em serviços que somos indispensáveis,” diz Franciely.

Também da área da saúde, a enfermeira e professora Olga Estefânia hoje está aposentada após 54 anos dedicados ao trabalho no Estado do Paraná. E ela também cita os desafios das multitarefas das mulheres como um dos principais para permanecer no trabalho.

 “Ao longo destes 54 anos a minha vida foi bastante intensa sob o ponto de vista do trabalho formal assim como desafiadora, pois sou mãe de 2 filhos e 1 filha. Considerando que no período da infância do meu filho a Creche não era uma realidade você pode imaginar o malabarismo que vivemos naquele momento para prover o nosso sustento e ao mesmo tempo cuidar da segurança, da saúde e do desenvolvimento deles. Impossível abstrair a trajetória do trabalho institucional da 2ª ou 3ª jornada que enfrentei afinal como mulher este é o papel que nos é destinado pelo patriarcado na sociedade capitalista,” diz.   

Desigualdade de gênero e salarial

Olga que também foi dirigente sindical destaca a diferença salarial e a violência de gênero também como um problema diário para as mulheres.  “Segundo o Relatório de Transparência Salarial e de Igualdade, produzido e divulgado pelo Ministério das Mulheres, em cooperação com o Ministério do Trabalho e institutos de pesquisa, as mulheres continuam recebendo, em média, 20,9% a menos do que os homens. Entendo também que a violência de gênero é um desafio imenso porque somo assediadas sexualmente e moralmente nos ambientes de trabalho,” diz.

Olga diz que continua lutando para que o modo capitalista de organização do trabalho seja superado. “Este modo de produção capitalista impacta principalmente na vida das mulheres. E, por isso, também quero ver mais mulheres na luta pela emancipação da nossa classe e libertação do patriarcalismo, machismo e misógina”, diz.

Já a enfermeira Evelin Moreira que começou a trabalhar aos 19 anos na área de enfermagem e almejando se manter na carreira vê a desigualdades salarial um dos maiores desafios para a mulher trabalhadora. Ela que atuou na linha de frente durante a pandemia diz que há dificuldades para progressão na carreira devido à desigualdade de gênero também.

“Um dos maiores desafios para ser mulher trabalhadora são as desigualdades no mercado de trabalho especialmente no que se refere à desigualdade salarial, assédio moral e, inclusive, as dificuldades de promoção, pois os homens são naturalmente vistos como prontos e preparados para cargos de liderança e as mulheres são tratadas como incapazes apear de segundo pesquisas apontam que as mulheres estudam e se qualificam mais,” diz.

Evelin diz que deseja ver mudanças neste cenário. “Um dos maiores sonhos enquanto mulher trabalhadora é ver a equidade salarial e equidade de gênero chegando a todos os ambientes de trabalho,” cita.

Mulheres têm maior escolaridade, mas seguem com menor presença em cargos de liderança, aponta IBGE

Apesar de serem maioria entre os formandos do ensino superior, as mulheres ainda enfrentam desigualdades no mercado de trabalho, especialmente em cargos de liderança. É o que revela uma pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2024.

Segundo o levantamento, 21,3% das mulheres concluem o ensino superior, frente a 16,8% dos homens. A superioridade feminina na formação acadêmica também é observada nos cursos de graduação presencial, onde elas representam 60,3% dos concluintes, contra 39,7% do público masculino.

Mesmo com esse maior nível de escolaridade, a presença feminina em cargos gerenciais continua inferior. Do total de pessoas ocupando essas posições, 60,7% são homens e apenas 39,3% são mulheres. Os dados evidenciam que a qualificação não garante, por si só, igualdade de oportunidades para as mulheres no mundo do trabalho.

Machismo diante de uma carreira predominantemente feminina

A carreira na área da educação especialmente a voltada para anos iniciais tem sido uma das mais desvalorizadas no país com baixos salários exigindo muita resiliência das mulheres professoras que enfrentam também o machismo. Fernanda de Almeida Carvalho diz que esse sempre foi um sonho almejado desde pequena. Já foi docente de diferentes níveis de ensino e diz que permanece porque tem o ideal de transformar a sociedade especialmente diante de problemas que enfrenta no cotidiano da sua profissão, como o machismo.

Mesmo o magistério sendo ocupado por mulheres trabalhadoras em sua grande maioria, Fernanda diz que o machismo impera nas relações de trabalho e com a comunidade. “Estar à frente de uma sala de aula ou no meu caso enquanto pedagoga parece que sempre é esperado que em todas as relações sociais sejam homens que estejam à frente. Já presenciei situações em que o responsável pelo aluno pedia para falar com “o diretor”, mesmo que tenhamos mulheres como diretoras,” conta.

Por isso, Fernanda diz que continuar como professora é também para mudar este cenário. “Eu almejo que possa repassar para meus estudantes que as meninas podem ocupar espaços esses que historicamente sempre foram ocupados por uma maioria de pessoas do gênero masculino,” diz.

Já para a professora da rede estadual de ensino, Evelise Mueller, o maior desafio é superar diariamente a tripla jornada. “Meu maior desafio como mulher trabalhadora é conseguir conciliar todas as demandas que tenho trabalho, dona de casa, mãe, esposa, trabalho extra e as demandas pessoais. Sou professora estadual concursada há 15 anos, trabalhei em vários colégios e acredito na educação pública de qualidade. E nas horas vagas assumi a gestão do condomínio onde moro,” cita.

Diante deste seu desafio, seu maior sonho é que a desigualdade de gênero seja superada. “Que tenhamos uma sociedade mais igualitária e justa com as mulheres dentro do ambiente corporativo. Bem como, que a maternidade e serviços domésticos sejam vistos como encargo de ambos os gêneros e não apenas da mulher,” diz.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.