Em marcha por terra e dignidade, MST chega a Porto Alegre (RS) após percorrer quase 100 km

Após cinco dias de caminhada pelas estradas do Rio Grande do Sul, a Marcha Estadual “Para o Brasil Alimentar, Reforma Agrária Popular”, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), chegou à capital Porto Alegre. A marcha teve como destino final a sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para as famílias acampadas e assentadas apresentarem suas reivindicações.

“Chegamos com a nossa marcha depois de 16 dias de luta, que trazem o espírito do Abril Vermelho, reivindicando nossos direitos pela terra, pela reforma agrária. Depois de cinco dias de marcha, quase 100 quilômetros andados, chegamos aqui no Incra para fazer as nossas audiências e pressionar os governos, tanto do Estado quanto do Governo Federal, para que a nossa pauta avance. Foram dias cansativos, de muita alegria e muita luta para dialogar direto com a sociedade porto-alegrense e também com a sociedade gaúcha sobre essa pauta que beneficia não só os acampados ou assentados, mas toda a sociedade gaúcha e brasileira”, afirmou Marlon Rodrigues, acampado e dirigente estadual do MST, no início da chegada ao Incra.

Ao longo de cerca de 100 quilômetros percorridos, passando por municípios como Arroio dos Ratos, Charqueadas e Eldorado do Sul, cerca de 400 trabalhadores rurais carregaram bandeiras vermelhas, entoaram cantos de luta e reafirmaram a defesa da reforma agrária popular. A mobilização cobra do governo estadual e federal ações concretas para a desapropriação de terras improdutivas, novos assentamentos, reassentamento de famílias atingidas pelas enchentes de 2024 e avanços em políticas de agroecologia.

Chegada na capital: após cinco dias de marcha, trabalhadores rurais ocupam o Incra para entregar suas reivindicações – Foto: Rafa Dotti

“Caminhamos até Porto Alegre para cobrar do governo uma medida que ele nos prometeu, que é a terra, e também para as famílias atingidas pela enchente”, afirmou Carla Camila Marques, dirigente estadual do MST. “Convocamos toda a militância a se somar à marcha. Vamos reivindicar nossa pauta por assentamento, educação e saúde.”

A direção do MST tem audiência marcada com o governo do estado, com o secretário-chefe da Casa Civil, Artur Lemos, e outros representantes, para a definição de medidas concretas às pautas apresentadas. Entre as reivindicações centrais está a desapropriação de áreas improdutivas, como a antiga Usina de Beneficiamento de Postes e Horto Florestal Renner, da CEEE-D, em Triunfo. Embora o governo estadual tenha alegado contaminação no local, segundo laudo da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), comprometeu-se a solicitar uma nova avaliação e buscar alternativas para a criação de assentamentos.

Pés no barro, bandeiras no alto: marcha estadual reafirma o compromisso com a luta por novos assentamentos e políticas públicas – Foto: Rafa Dotti

Vozes da marcha

Durante o trajeto, diversos acampados relataram suas impressões sobre a caminhada e a importância da luta pela terra:

Adão Richard de Almeida, do Acampamento 8 de Março, em Charqueadas, avaliou de forma positiva a mobilização. “A gente ainda não tomou chuva, hoje deu uns pingos. E estamos na pele, né? E não vamos afrouxar. O governo do estado e o governo federal vão ter que nos dar uma solução. Nós não queremos conversa, queremos fatos que têm que acontecer.”

Pedro Andrade Rodrigues, 17 anos, do Acampamento Sebastião Salles, em Hulha Negra, também celebrou a caminhada. “Foi um grande percurso, caminhamos bons quilômetros. Mas estamos aí pela luta pela terra, é muito importante essa caminhada pra nós, e vamos chegar lá!”

Rosi de Oliveira, do Acampamento Herdeiros da Luta, em Tupanciretã, relatou que a marcha trouxe aprendizados e novas experiências. “Estamos aí em marcha, pressionando o governo do estado e o governo federal. Aprendemos muitas experiências, foi muito bom para mim.”

Carla Camila Marques reforçou o caráter combativo da mobilização: “Estamos indo cobrar do governo as medidas para os assentamentos, para as enchentes que o governo ainda não deu retorno. Estamos levando também a pauta da agroecologia, alimentação saudável, reforma agrária popular, e sobre a seca que o estado enfrentou nos últimos tempos.”

A força coletiva em movimento: Famílias Sem Terra marcham lado a lado cobrando ações do governo estadual e federal – Foto: Rafa Dotti

Uma tradição de resistência

A marcha estadual integra as ações do Abril Vermelho, mês que marca os 29 anos do Massacre de Eldorado do Carajás, onde 21 trabalhadores rurais sem terra foram assassinados pela Polícia Militar do Pará. O MST no Rio Grande do Sul já protagonizou mobilizações históricas em anos anteriores, como em 2014 e 2017, combinando pressão direta com formação política e diálogo com a sociedade.

Com seus pés no barro e os olhos voltados para a justiça social, o MST reafirma sua luta por um modelo de produção agrícola sustentável, voltado à soberania alimentar e ao bem viver no campo e na cidade.

Sem Terrinha em marcha pelo RS

Ao longo da Marcha Estadual por reforma agrária e justiça social, as crianças Sem Terrinha também são protagonistas. Elas estão sendo recebidas pelas escolas dos assentamentos por onde a marcha passa, como a Escola no Assentamento Padre Josimo e a Escola Almirante Tamandaré, no Assentamento Irga, em Eldorado do Sul.

Primeiros passos de resistência: crianças realizam marchinha no Assentamento Integração Gaúcha, celebrando a esperança e a solidariedade – Foto: MST/RS

Os pequenos estão conhecendo as escolas e visualizando o que o futuro pode reservar para eles e seus assentamentos. A Escola Almirante Tamandaré, que foi a primeira a voltar a funcionar após as enchentes de 2024, representa a força e a solidariedade dos acampamentos, que participaram das brigadas que ajudaram a reconstruir o local. Hoje, ela acolhe e ensina aqueles que marcham com esperança por uma vida melhor.

Educação que floresce: Sem Terrinha visitam escolas nos assentamentos e sonham com um futuro de luta e conhecimento – Foto: MST/RS

A programação do fim de semana contou com atividades de educação, música, brincadeiras e muita diversão, fruto do trabalho coletivo da educação do MST. No domingo (27) pela manhã, as crianças Sem Terrinha realizaram sua própria marcha no Assentamento Integração Gaúcha. Muito animadas, percorreram o assentamento em preparação para a chegada à capital. Ao final da atividade, foram presenteadas com cestinhas de doces organizadas pelas famílias assentadas.

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