
Um enorme réptil extinto, que costumava se alimentar de dinossauros tinha um focinho largo como o de um jacaré, mas devia seu sucesso a uma característica que os jacarés modernos não possuem: tolerância à água salgada. As informações são da CNN Sciense.
O Deinosuchus foi um dos maiores crocodilianos que já existiram, com um corpo quase do tamanho de um ônibus e dentes do tamanho de bananas grandes.
De cerca de 82 a 75 milhões de anos atrás, esse predador nadava em rios e estuários da América do Norte. Seu crânio era largo, comprido e possuía uma protuberância bulbosa que não é vista em nenhuma outra estrutura craniana de crocodilianos. Marcas de dentes em ossos do período Cretáceo sugerem que o Deinosuchus caçava ou se alimentava de carcaças de dinossauros.
Apesar do nome científico — que significa “crocodilo do terror” — o Deinosuchus era frequentemente chamado de “grande jacaré”, e análises anteriores o agrupavam com os jacarés e seus parentes antigos. No entanto, uma nova análise de fósseis, juntamente com DNA de crocodilianos modernos, como jacarés e crocodilos, sugere que o Deinosuchus pertence a outra parte da árvore genealógica.

Diferente dos aligatoroides, o Deinosuchus manteve as glândulas de sal de seus ancestrais, permitindo que tolerasse água salgada, conforme relataram os cientistas na revista Communications Biology. Os crocodilos modernos ainda têm essas glândulas, que ajudam a eliminar o excesso de sal.
Essa habilidade teria ajudado o Deinosuchus a navegar pelo Mar Interior Ocidental, que dividia a América do Norte durante uma fase de aquecimento global e aumento do nível do mar. Assim, ele teria se espalhado por todo o continente, habitando pântanos costeiros em ambos os lados do antigo mar interior e ao longo da costa atlântica da América do Norte.
Essa nova árvore genealógica dos crocodilianos oferece outras perspectivas sobre a resiliência climática do grupo e indica como algumas espécies se adaptaram, enquanto outras foram extintas.
Com suas glândulas de sal permitindo viajar onde seus “primos” não podiam, o Deinosuchus se instalou em habitats repletos de presas grandes. Evoluiu para se tornar um predador gigante e amplamente distribuído, dominando ecossistemas pantanosos e se alimentando do que quisesse.
“Ninguém estava seguro nesses pântanos quando o Deinosuchus estava por perto”, disse o autor sênior do estudo, Dr. Márton Rabi, do Instituto de Geociências da Universidade de Tübingen, Alemanha. “Estamos falando de um animal absolutamente monstruoso”, disse ele à CNN. “Com certeza, media cerca de 8 metros ou mais de comprimento.”

Um estranho entre os jacarés
Desde meados do século XIX, fósseis do Deinosuchus foram encontrados em ambos os lados do antigo mar interior, pertencendo a pelo menos duas espécies. A maior delas, Deinosuchus riograndensis, vivia no lado oeste, ao longo da costa leste de uma ilha chamada Laramídia, que representava menos de um terço da massa terrestre da América do Norte. A outra parte do continente era conhecida como Apaláxia.
Apesar de classificado por muito tempo como parente dos jacarés, a presença do Deinosuchus nos dois lados do imenso mar interior era um mistério. Se fosse um aligatoroide — grupo que hoje vive apenas em água doce — como teria cruzado um mar de mais de 1.000 km? Uma hipótese sugeria que os primeiros jacarés toleravam água salgada e perderam essa característica com o tempo, mas não havia evidências para isso, exceto a suposição de que o Deinosuchus era de fato um aligatoroide.
Outra explicação era que o Deinosuchus se espalhou antes de o Mar Interior Ocidental se formar, mas os fósseis não sustentam essa ideia. O mar surgiu há cerca de 100 milhões de anos — 20 milhões antes dos primeiros fósseis conhecidos do Deinosuchus.
“Era um cenário incoerente”, disse Rabi.
Os pesquisadores incluíram dados de crocodilianos extintos que não haviam sido amostrados nas árvores genealógicas anteriores. Esses “elos perdidos” ajudaram a conectar espécies que antes não eram reconhecidas como aparentadas e reorganizaram a ordem de surgimento de certas características no grupo.
“Nossa análise descobriu que a tolerância à água salgada é uma característica bem antiga em muitos crocodilianos, e foi perdida depois nos aligatoroides”, afirmou Rabi. Ter mesmo uma tolerância moderada ao sal teria sido uma enorme vantagem para os parentes dos crocodilos antigos, conforme mudanças climáticas alteravam seus habitats, disse a Dra. Evon Hekkala, da Universidade Fordham, que não participou do estudo.
“Esse traço ecológico teria permitido que linhagens de crocodilos fossem mais oportunistas em tempos de mudanças ambientais drásticas, como o aumento do nível do mar, enquanto espécies menos tolerantes eram extintas”, acrescentou Hekkala.

Não era um “superjacaré”
Os pesquisadores também criaram uma nova árvore genealógica dos crocodilianos com dados moleculares de espécies modernas, para esclarecer características comuns aos aligatoroides. Os primeiros jacarés eram bem menores do que outros crocodilianos da época. Eles só começaram a evoluir para tamanhos maiores cerca de 34 milhões de anos atrás, após o resfriamento do clima e a extinção de seus concorrentes. Quando os aligatoroides surgiram, o Deinosuchus já era um gigante, destoando do padrão.
O nanismo nos primeiros aligatoroides foi outro indício de que o gigantesco Deinosuchus não era um “superjacaré”, mas provavelmente um ramo distinto da árvore genealógica, divergindo antes da evolução dos aligatoroides.
A abordagem do estudo — combinando genética moderna com a análise da forma dos corpos e crânios — fornece uma visão mais clara de como o Deinosuchus evoluiu, disse Hekkala. A realocação do Deinosuchus para fora do grupo dos aligatoroides “se encaixa muito melhor com o que sabemos hoje sobre a flexibilidade ecológica entre crocodilos vivos e extintos”, completou. “Este novo estudo realmente ilumina tanto o papel evolutivo quanto ecológico desse animal incrível.”
Embora o Deinosuchus tenha sido um dos maiores crocodilianos, ele não foi o único gigante. Crocodilianos enormes evoluíram de forma independente em ambientes aquáticos mais de uma dúzia de vezes nos últimos 120 milhões de anos — inclusive durante eras do gelo. Até mesmo em espécies vivas, há registros de indivíduos com mais de 7 metros até o século XIX, sugerindo que monstros como o Deinosuchus talvez fossem regra, e não exceção.
“Crocodilos gigantes são quase o padrão — em qualquer época”, concluiu Rabi.