Coordenador do Movimento da População de Rua critica políticas assistencialistas e defende moradia como eixo central

Em entrevista ao Conexão BdF, do Brasil de Fato, o coordenador nacional do Movimento Nacional da População de Rua, Darcy Costa, criticou a abordagem predominantemente assistencialista das políticas públicas voltadas às pessoas em situação de rua. Para ele, a resposta do poder público continua limitada a oferecer comida, cobertores e pernoites, sem atacar as causas estruturais do problema.

“A centralidade da política não pode ser unicamente a assistência social, tem que ser a habitação. O que essas pessoas mais precisam nesse momento são locais de moradia. […] A questão do álcool, da droga, é algo histórico, existe no mundo desde o século 18. Mas o que faz com que as pessoas vão para a situação de rua é realmente a falta de geração de renda, a falta de trabalho. Elas não conseguem pagar seus aluguéis, não conseguem pagar suas prestações, não conseguem garantir a sua alimentação.”

No primeiro trimestre deste ano, quase 3 mil pessoas passaram a viver em situação de rua na cidade de São Paulo, elevando o número total para 96.220 em março, em comparação com 93.355 em janeiro. No estado paulista, o aumento foi semelhante, alcançando 143.509 pessoas em março, contra 140.543 em janeiro. Os dados são do levantamento realizado pelo Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua (OBPopRua), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com base nas informações registradas no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico).

Costa defende uma política realmente inclusiva, e não “simplesmente dar um prato de comida, um cobertor e um pernoite para essa pessoa dormir”. “É preciso criar políticas estruturantes em que a base seja a moradia, educação, saúde, assistência social também, visando a garantia dos direitos humanos dessas pessoas”, afirma.

Ele também ressalta a importância de uma política habitacional em escala, citando a nova portaria do programa Minha Casa Minha Vida, que prevê a destinação de parte das unidades para pessoas em situação de rua. “Nós temos, historicamente, uma quantidade enorme de imóveis na cidade de São Paulo muito maior, muito superior ao número de pessoas que estão em situação de rua”, ilustra.

Para o coordenador, a falta de regulamentação da Lei da Renda Básica de Cidadania, aprovada há mais de uma década, mas ainda sem implementação, é um gargalo. “Qualquer pessoa pode ter uma desventura na vida e acabar na rua. A situação de rua, a situação de fragilidade e de pobreza não pode ser a calçada, o papelão, a praça, debaixo do viaduto. É necessário que se garanta, na base dessa pirâmide, a dignidade humana, o direito à sua subsistência”, destaca.

‘A rua também merece viver’

Darcy Costa relembra que a violência contra a população em situação de rua vem de todos os eixos: física, institucional e política. “Cria-se uma retórica medíocre, estigmatizante, preconceituosa e criminalista da população em situação de rua, que continuamente vem sofrendo violações.” Ele reforça que essas pessoas são parte do país e da democracia: “A população de rua também merece viver. A população de rua também é cidadã de direito.”

Para ele, essa violência é resultado de uma longa história de negligência. “Essa população vem crescendo por conta de um processo social de exclusão histórica”, afirma Costa. “Até o presente momento, não existe ainda uma contagem do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] do número de pessoas que estão vivendo em situação de rua”, denuncia. Ele explica que a visibilidade política dessa população só começou em 2009, com o decreto presidencial que criou as bases da política nacional.

A ausência de informações confiáveis se soma à dificuldade de acesso aos serviços básicos e à cidadania. “Muitas pessoas que estão chegando na situação de rua ainda não foram cadastradas no CadÚnico”, explica. Para Darcy, sem essa identificação, o Estado falha em garantir direitos mínimos.

Para ouvir e assistir

O jornal Conexão BdF vai ao ar em duas edições, de segunda a sexta-feira, uma às 9h e outra às 17h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo, com transmissão simultânea também pelo YouTube do Brasil de Fato.

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