Venezuela rejeita proposta de El Salvador para troca de presos, e Maduro chama proposta de ‘abusiva’

O governo da Venezuela rejeitou a proposta do presidente de El Salvador, Nayib Bukele, de trocar os 252 venezuelanos que estão presos em um presídio de segurança máxima salvadorenho por 252 presos no país sulamericano. Segundo o presidente Nicolás Maduro, a proposta é “totalmente ilegitima, ilegal e abusiva”.

Em seu programa de televisão semanal Con Maduro+, o mandatário reforçou novamente o pedido para que seja divulgada uma lista oficial com todos os presos em El Salvador. Os venezuelanos viviam nos Estados Unidos e foram presos pela agência ICE (Imigração e Fiscalização Aduaneira, na sigla em inglês). As autoridades estadunidenses afirmaram que enviariam esses venezuelanos de volta para Caracas, mas eles foram encaminhados em 13 de fevereiro para um presídio na Geórgia e depois ao Texas, antes de chegarem a El Salvador.

Nenhum dos jovens, no entanto, foi julgado nos EUA antes de serem detidos. A maioria estava esperando a tramitação da autorização para residir no país.

“Dê provas de vida de todos os jovens sequestrados, diga onde estão sendo julgados, quais os casos, quais os crimes que cometeram, permita que advogados e familiares visitem o presídio onde estão detidos, abandone o caminho do desaparecimento forçado”, disse Maduro.

Para as deportações dos venezuelanos, Trump usou a Lei de Inimigos Estrangeiros, de 1798. A legislação estabelece que qualquer pessoa que esteja nos Estados Unidos e seja considerada de uma organização terrorista está sujeita a ser deportada como “inimigo estrangeiro”. Esses cidadãos, no entanto, precisam ter mais de 14 anos e não podem ser naturalizados ou residentes permanentes dos EUA.

A Casa Branca afirma que eles pertenciam ao grupo criminoso Trem de Aragua. O governo estadunidense, no entanto, não apresentou nenhuma prova para isso. Maduro também questionou o direito de defesa desses venezuelanos. Além de não serem submetidos a um julgamento, o mandatário afirmou que eles não puderam recorrer a nenhum órgão de direitos humanos.

“Eles não tiveram acesso a nenhum órgão de direitos humanos das Nações Unidas, não têm um juiz natural, não cometeram nenhum crime lá, foram simplesmente sequestrados, é um sequestro de Estado”, disse.

O presidente de El Salvador respondeu pelo X (antigo Twitter) e disse que a resposta de Maduro “precisa de coerência”. Segundo o salvadorenho, o chefe do Executivo venezuelano já trocou 30 presos pelo empresário colombiano Alex Saab em 2023. Ele trabalhou como aliado do governo da Venezuela e estava preso desde 2020 após ser acusado de lavagem de dinheiro pela Justiça estadunidense.

Ainda de acordo com Bukele, o presidente da Venezuela deveria aceitar a proposta já que disse que faria “de tudo pelos venezuelanos”. Em sua publicação, ele anexa também o pedido formal feito pelo Ministério das Relações Exteriores de El Salvador para essa troca.

A proposta salvadorenha inclui 50 cidadãos de diferentes nacionalidades que estão presos na Venezuela, cita países como Estados Unidos, México e Colômbia, mas não detalha quem seriam eles, apenas diz que são presos políticos. O pedido formal, no entanto, não inclui nomes que foram citados na publicação anterior feita por Bukele.

No primeiro texto divulgado pelo presidente de El Salvador no domingo, ele pediu a liberação de Rafael Tudares, genro do ex-candidato Edmundo González Urrutia, da ativista Rocío San Miguel, de Corina Parisca de Machado, mãe da ultraliberal María Corina Machado e dos quatro políticos de extrema direita que estão na embaixada argentina em Caracas. Não há indícios, no entanto, de que essas pessoas estejam presas. Os nomes não foram confirmados como presos nem pelo governo venezuelano, nem pelos próprios familiares.

A chancelaria venezuelana também respondeu a essa publicação de Bukele. Em nota, o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela afirma que o pedido formal de El Salvador expõe ao menos 5 crimes cometidos pelo governo de Bukele. Primeiro a violação dos direitos humanos, “presos de maneira arbitrária, sem ordem de prisão ou julgamento prévio”. Ainda de acordo com o texto, eles estão em uma “situação degradante” e não tem contato com suas famílias, o que constitui “tráfico de pessoas”.

Caracas também indica uma “criminalização coletiva e xenofóbica” de um grupo de pessoas que não foram indiciados de maneira individual e foram vinculados a um grupo criminoso sem que se respeite a “presunção de inocência”, já que não foram apresentadas provas. O texto aponta também para a negação ao direito de defesa e a falta de assistência jurídica.

O Ministério das Relações Exteriores também chama de “aberração” a proposta de trocar venezuelanos que não receberam o devido processo legal com outros cidadãos que foram punidos e julgados na Venezuela e que nem sequer são salvadorenhos. A nota termina denunciando a violação do direito público ao promover um traslado forçoso para outro país e pede a liberação imediata dos 252 venezuelanos.

O governo venezuelano questionou também as motivações para que El Salvador receba esses deportados. Os EUA pagarão US$ 6 milhões (R$ 35 milhões) para salvadorenho manter presos os supostos integrantes do Trem de Aragua por um ano.

Justiça proíbe deportações

Donald Trump afirmou que integrantes do Trem de Aragua invadiram o país e estavam “conduzindo guerras irregulares e tomando ações hostis” com o objetivo de desestabilizar os Estados Unidos. Segundo o republicano, o grupo expandiu as operações para os EUA depois da imigração massiva de venezuelanos nos últimos anos.

A Suprema Corte dos EUA, no entanto, suspendeu a determinação de Trump no último sábado (19), em resposta a um pedido de emergência feito pelo grupo União Estadunidense de Liberdades Civis (ACLU). A entidade processa o governo pelas deportações de venezuelanos, que são levados a uma prisão no Texas, antes de serem deportados.

A Casa Branca respondeu e afirmou que o governo concordou em não continuar com as deportações, mas pediu o fim dessa suspensão, já que o processo teria sido rápido demais.

“O governo concordou em não remover aqueles detidos sob a Lei de Inimigos Estrangeiros que buscam alegações de habeas corpus. Este tribunal deve dissolver sua atual suspensão administrativa e permitir que os tribunais inferiores abordem as questões jurídicas e factuais relevantes em primeira instância, incluindo o desenvolvimento de um registro factual adequado”, escreveu nas redes sociais o procurador-geral dos EUA, John Sauer, advogado de apelação do governo Trump.

A decisão da Justiça foi tomada no mesmo dia que um tribunal federal impediu que o governo republicano continue com o fim do Status de Proteção Temporária, o TPS, para mais de 350 mil venezuelanos que vivem de maneira irregular no país. Logo após assumir o mandato, Trump derrubou o TPS para venezuelanos. A medida garantia que os migrantes poderiam morar e trabalhar no país até outubro de 2026 e a decisão do republicano pode atingir mais de 600 mil pessoas.

Idas e voltas

Caracas voltou a receber em março os deportados venezuelanos dos Estados Unidos. A medida foi firmada em reunião com o enviado especial estadunidense, Richard Grenell.

A decisão vem na esteira de um descompasso entre Caracas e Washington. Os dois governos anunciaram no começo de fevereiro um acordo para as deportações. Grenell viajou à Venezuela e foi recebido pelo presidente Nicolás Maduro. O governo venezuelano concordou não só em receber os voos, mas também em buscar os migrantes com um avião da companhia estatal Conviasa. O enviado estadunidense chegou a afirmar que o governo de Trump não quer uma “mudança de regime” para a Venezuela.

Em março, no entanto, a Casa Branca anunciou que não renovaria a licença que permitia que a petroleira estadunidense Chevron atuasse na Venezuela. Em resposta, o governo venezuelano disse que não receberia mais os deportados. Depois dessa troca de declarações, os dois governos chegam agora a um acordo para retomar a deportação de venezuelanos.

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