Moinho vive tensão por possibilidade de despejo; entenda histórico da última favela do centro de SP

Na próxima terça-feira (22), moradores da favela do Moinho, na região central de São Paulo, podem ser forçados a deixarem suas casas. A medida faz parte de um processo de “negociação” entre o governo de São Paulo e parte da comunidade para que a área seja liberada para a construção de um parque.

Instalada há trinta anos no Campos Elíseos, o Moinho é a última favela da região central de São Paulo e seus moradores resistem à especulação imobiliária desde então. A área pertence à União, mas por dentro passam os trilhos da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).

A intenção do governo de São Paulo, sob Tarcísio de Freitas (Republicanos), é driblar a necessidade de um mandado judicial para desapropriar a área, o que seria impossível sem a anuência da Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Por isso, o governo tem apostado em negociar diretamente com os moradores do Moinho, oferecendo contrapartidas para que abandonem a área.

Tarcísio de Freitas tem um projeto de transferir para a região central a sede do governo estadual, que hoje está no bairro do Morumbi, na zona sul de São Paulo. O Palácio dos Bandeirantes batizou a ação que precederá a chegada do poder público no centro como “Operação Dignidade”, que pretende levar “segurança aos bairros do Bom Retiro e Campos Elíseos.”

Sem conseguir forçar a saída dos moradores do Moinho, o governo de São Paulo ofereceu um acordo que tem sido criticado pelas lideranças do espaço. A proposta é que as pessoas que vivem comunidade aceitem a transferência para unidades habitacionais da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) nas periferias da cidade, ou que optem por sair das casas em troca de R$ 800 de auxílio-moradia, enquanto aguardam outras unidades habitacionais.

A área que o governo pretende demolir para a construção do parque corresponde a cerca de 30% da favela do Moinho. De acordo com o governo Tarcísio, 86% dos moradores teriam aceitado as condições apresentadas para uma saída negociada. A informação é contestada pelas lideranças da comunidade.

A CDHU ofereceu até dia 22, próxima terça-feira, para que os moradores saiam do espaço e liberem suas casas que seriam demolidas. Nos últimos seis dias, em quatro oportunidades a Polícia Militar coordenou ações na frente ou dentro da favela, em sinal evidente de intimidação. Moradores denunciaram à ouvidoria das polícias que sofreram “terrorismo psicológico”. Policiais militares teriam dito nas incursões dentro da comunidade, que voltariam para despejar os moradores.

Moradores da favela do Moinho, a última da região central de São Paulo (SP), protestam contra ameaças de despejo por parte da PM, no dia 18 de abril de 2025
Moradores do Moinho protestaram na última sexta-feira (18) Foto: Igor Carvalho/Brasil de Fato

Exigências

Os moradores pedem ao governo federal a regulamentação da área e, consequentemente, a construção de moradias populares dentro da comunidade. Caso tenham que sair sem a regularização fundiária, as exigências que a Associação de Moradores do Moinho apresentaram ao Palácio dos Bandeirantes são:

  • Regularização fundiária ou reassentamento em um raio de até 5 km, sem custo para as famílias;
  • Moradia gratuita, com metragem adequada (mínimo de 50 m²);
  • Suspensão imediata das remoções e demolições;
  • Indenização aos pequenos comerciantes locais;
  • Auxílio-moradia de, no mínimo, R$ 1.200, até a entrega definitiva das novas moradias.

Em condição de anonimato, o Brasil de Fato escutou uma moradora do Moinho que aceitou o acordo, na última sexta-feira (18). “Não é nada bom, vão me mandar para longe, vou ter que conseguir escola para as crianças num bairro que nem conheço. Mas os R$ 800 não pagam aluguel em casa alguma aqui pelo centro. As duas propostas são ruins, mas fiquei com medo da polícia vir aqui e tirar a gente na força e eu ficar sem nada.”

Em nota, a SPU informou que “ainda não há previsão para a cessão da área, pois o processo depende de ajustes e complementações, por parte da CDHU, no plano de reassentamento enviado em abril deste ano, para que contemple as necessidades dos moradores. A SPU também aguarda a entrega do detalhamento do projeto a ser implantado na área pelo Governo de SP, a fim de que seja definido o instrumento de destinação a ser utilizado. Somente após esse acordo será possível avançar nos trâmites administrativos para a formalização do contrato de cessão.”

Sem se comprometer com prazos para a remoção dos moradores, o governo de São Paulo, também em nota, informou: “houve um cadastro de todas as residências da favela pela CDHU e também foram feitas reuniões individuais para apresentar as opções de moradias já disponíveis. Até agora, 86% das famílias já iniciaram adesão para o atendimento habitacional e 531 já foram habilitadas, ou seja, estão prontas para assinar contrato. Destas, 444 já têm um imóvel de destino. Num primeiro momento, foi oferecido auxílio mudança de R$ 2.400,00, além de auxílio-moradia de R$ 800,00.”

Por precaução e desconfiança, moradores organizaram uma vigília no local que deve começar ainda na madrugada de terça-feira, na entrada da favela.

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