PF faz buscas em casas e endereços ligados ao vereador Carlos Bolsonaro

De acordo com as investigações, Carlos Bolsonaro, filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, recebia informações coletadas pela Abin e teria benefícios políticos com os dados das pessoas monitoradas ilegalmente. PF faz buscas em casas e endereços ligados ao vereador Carlos Bolsonaro
Nesta segunda-feira (29), a Polícia Federal fez buscas em endereços ligados ao vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, do Republicanos. A investigação é sobre espionagem ilegal dentro da Agência Brasileira de Inteligência durante o governo de Jair Bolsonaro.
A Polícia Federal chegou nesta segunda-feira (29) pela manhã na casa do vereador Carlos Bolsonaro, do Republicanos, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. É no mesmo condomínio onde Jair Bolsonaro morava antes de se mudar para Brasília.
Nesta segunda de manhã, o ministro Alexandre de Moraes autorizou também a busca na casa da família Bolsonaro na Vila Histórica de Mambucaba, em Angra dos Reis, no litoral sul do estado. Quando os policiais chegaram, o vereador e o pai não estavam em casa. O advogado de Jair Bolsonaro, Fabio Wajngarten, disse, em uma rede social, que ex-presidente saiu para pescar às 5h com filhos e amigos, bem antes de qualquer notícia sobre a operação.
Jair e Carlos Bolsonaro voltaram, por volta de 11h. Às 12h15, os dois saíram da casa, acompanhando alguns policiais, mas não quiseram falar.
“Senhor Carlos, o senhor tem algo para falar em relação à operação?”, questionou um repórter.
A Polícia Federal estava em carros descaracterizados, já que o ministro Alexandre de Moraes determinou que a polícia deveria evitar a exposição indevida, abstendo-se de toda e qualquer indiscrição. No total, foram nove mandados de busca e apreensão no Rio, em Brasília, em Goiás e na Bahia.
A Polícia Federal esteve na casa de Luciana Paula Garcia da Silva Almeida, assessora de Carlos Bolsonaro. Também foi alvo de buscas a casa de Priscilla Pereira e Silva, assessora do ex-diretor-geral da Abin e atual deputado federal, do PL, Alexandre Ramagem. Na casa de um outro assessor dele, Giancarlo Gomes Rodrigues, foram apreendidos computadores, dez celulares e uma arma. Giancarlo é militar e trabalhou na Abin durante a gestão de Alexandre Ramagem.
A esposa de Giancarlo ainda trabalha na Abin, e um dos computadores apreendidos pertenceria à agência. A Abin informou que abriu uma investigação sobre os equipamentos da agência que foram apreendidos na operação desta segunda.
Segundo a Polícia Federal, os alvos da operação desta segunda formavam o chamado núcleo político na estrutura paralela da Abin. Ou seja, de acordo com as investigações, Carlos Bolsonaro recebia informações coletadas pela Abin e teria benefícios políticos com os dados das pessoas que eram monitoradas ilegalmente.
Bem antes da atual investigação da Polícia Federal, a suposta participação de Carlos Bolsonaro em uma estrutura paralela na Abin já tinha sido mencionada pelo ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência durante o governo Bolsonaro, Gustavo Bebianno. Em uma entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura, em 2020, ele contou:
“Um belo dia o Carlos me aparece com o nome de um delegado federal e de três agentes, que seria uma Abin paralela, porque ele não confiava na Abin. O general Heleno foi chamado, ficou preocupado com aquilo, mas o general Heleno não é de confrontos. E o assunto acabou ali, com o general Santos Cruz e comigo. E nós aconselhamos ao presidente que não fizesse aquilo de maneira alguma, porque muito pior que o gabinete do ódio, aquilo também seria motivo para impeachment. Eu não sei, depois eu saí, se isso foi instalado ou não.”
Embora fosse vereador da cidade do Rio de Janeiro desde 2001, na prática, Carlos Bolsonaro teve uma atuação política mais ampla durante o mandato de Jair Bolsonaro na presidência. Ele era o responsável pelas comunicação do pai nas redes sociais.
Entenda o que é a Abin e quais são suas principais funções
Repercussão
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou que houve abuso na operação desta segunda-feira (29) por causa da apreensão de objetos de outras pessoas, que estavam no mesmo endereço do vereador Carlos Bolsonaro.
A operação da Polícia Federal foi autorizada pelo ministro do STF – Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.
A decisão de Alexandre de Moraes se baseou em pedido da Polícia Federal, que contou com o aval da Procuradoria-Geral da República. Moraes apontou que a investigação da PF está relacionada com eixos de atuação na Abin entre os anos de 2019 e 2021.
Na época, o diretor da agência era Alexandre Ramagem. Na semana passada, ele foi alvo de uma operação. A Polícia Federal afirma que, sob a direção de Ramagem, uma organização criminosa dentro da Abin monitorava ilegalmente pessoas e autoridades.
No documento desta segunda (29), Moraes disse que, segundo a investigação da PF, havia diversos núcleos, como: núcleo político; alta gestão núcleo PF; núcleo gestão Abin; e núcleo consultas. E que a Polícia Federal identificou o núcleo político de atuação na Abin, composto por Carlos Bolsonaro, a assessora dele, Luciana Paula Garcia da Silva Almeida, e Priscilla Pereira e Silva, assessora de Ramagem, que, em conjunto com ações do núcleo alta gestão PF, sob o comando de Ramagem, monitorou indevidamente “inimigos políticos” e buscou informações acerca da existência de investigações relacionadas aos filhos do então presidente da República Jair Bolsonaro.
Ainda segundo Moraes, de acordo com a investigação, se mostrou visível no monitoramento ilegal, para fins políticos, do servidor Hugo Ferreira Netto Loss (responsável por operações de fiscalização ambiental no Ibama), posteriormente exonerado de sua função, em possível represália às ações de combate aos crimes ambientais. A Polícia Federal aponta que a organização criminosa identificada na Abin era, potencialmente, uma das células de organização criminosa de maior amplitude, cuja tarefa primordial era realizar a “contrainteligência” de Estado.
Segundo a Polícia Federal, a investigação encontrou “informações sigilosas impressas por Alexandre Ramagem possivelmente para entregar aos destinatários do núcleo político”. O documento diz também que a Controladoria-Geral da União identificou a impressão de documento por Ramagem, contendo a lista dos inquéritos eleitorais da Polícia Federal no Rio de Janeiro.
A lista impressa, de acordo com os investigadores, apresentava o número de inquérito, nome do investigado, o cargo político e o partido político em 20 de fevereiro de 2020 na Superintendência Regional da PF.
O ministro Alexandre de Moraes reproduziu mensagem encontrada pela Polícia Federal no celular do deputado Ramagem. A Procuradoria-Geral da República relatou que é uma conversa mantida por WhatsApp entre o parlamentar e Luciana Almeida, assessora do vereador Carlos Bolsonaro, que compreende que a assessora Luciana solicitava de Ramagem a ajuda relacionada ao inquérito policial em andamento em unidades sensíveis da PF. O evento foi tratado como um indicativo de que o núcleo político possivelmente se valia do delegado Ramagem para obtenção de informações sigilosas e/ou ações ainda não totalmente esclarecidas.
Na conversa do dia 11 de outubro de 2022, Luciana escreve: “Bom dia! Tudo bem? Estou precisando muito de uma ajuda”. E repassa os dados da delegada Isabela Muniz Ferreira e números de inquéritos envolvendo o presidente da República e três filhos. Na época, Ramagem já havia sido eleito deputado federal e não estava mais na Abin. A procurador-geral da República afirmou que a solicitação da “ajuda” se referia a investigações que envolveriam filhos do então presidente e deste mesmo.
Na investigação, a Polícia Federal identificou que os números dos inquéritos citados na mensagem não eram referentes ao ex-presidente e seus filhos. Mas que no período existiam investigações em andamento no interesse dos sujeitos, razão pela qual, provavelmente, a fonte não obteve os números dos procedimentos corretos.
No domingo (18), a União dos Profissionais de Inteligência da Abin divulgou uma nota afirmando que: “uma instituição de Estado pode ter sido utilizada de forma indevida por seus dirigentes, especialmente se estes tiverem pretensões político-partidárias, como é o caso que ora se investiga”, mas que o debate sobre utilidade da Abin deve ser feito desvinculado de discussões sobre eventuais desvios promovidos por gestões passadas.
Nesta segunda-feira (29), depois de deflagrada a operação, o presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco, do PSD, afirmou que vai pedir ao STF os possíveis nomes de parlamentares clandestinamente monitorados pela Agência Brasileira de Inteligência.
O ministro da Secretaria de Relações Institucionais relacionou a existência de uma suposta ação paralela na Abin com os atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
“As novas operações, tanto da Polícia Federal, vêm mostrando que a cena do crime do dia 8 de janeiro, que não era um crime isolado, continua trazendo novidades. Não só em relação a Abin, mas toda a ação que o Judiciário determina de apuração, que a PF faz de forma autônoma, vai continuar”, afirma Alexandre Padilha.
Em nota, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou que houve um excesso no cumprimento da busca e apreensão com a apreensão de objetos de outras pessoas apenas pelo fato de estarem no mesmo endereço. Os advogados dizem que esses objetos não têm relação com a investigação informada pelos agentes policiais, como um computador pessoal e um tablet do assessor do ex-presidente, mesmo tendo sido demonstrado no local que tais objetos eram do profissional que não está sendo investigado. Assim como anotações pessoais utilizadas na preparação da live ocorrida no dia anterior.
Nas palavras da defesa, “apesar da minuciosa busca feita pelos agentes em todos os cômodos do imóvel, com a nítida tentativa de encontrar algo que pudesse comprometer a reputação ilibada do ex-presidente da República, nenhum item seu foi apreendido”.
A nota da defesa declara que uma “ordem de busca e apreensão genérica, como a executada nesta segunda-feira (29), não autoriza revistas e apreensões de qualquer cidadão que esteja próximo do alvo do mandado”.
A nota da defesa de Jair Bolsonaro afirma, ainda, que a medida empreendida hoje, em uma residência familiar, com a apreensão indiscriminadas de bens pessoais de terceiros, sem ordem judicial específica, configura inegável abuso e uso excessivo do poder estatal.
A defesa de Carlos Bolsonaro não deu retorno ao contado do Jornal Nacional.
O Jornal Nacional não conseguiu contato com Luciana Paula Garcia da Silva Almeida, Priscila Pereira e Silva e Giancarlo Gomes Rodrigues.
A defesa do deputado Alexandre Ramagem disse que está aguardando os desdobramentos.
A Abin declarou que vai continuar colaborando com as investigações.
A delegada Isabela Muniz Ferreira disse que a Polícia Federal vai fazer uma auditoria para saber como informações foram vazadas e que o fato de o nome dela ter sido citado em mensagem não compromete o trabalho dela à frente do inquérito policial.
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