Universidade do Paraná reinaugura monumento em memória ao Massacre de Eldorado do Carajás

Os 21 trabalhadores rurais sem terra mortos no Massacre de Eldorado do Carajás, no Pará, ganharam um espaço permanente de homenagem no campus da Universidade Estadual de Maringá (UEM), no Paraná. A reinauguração ocorreu nesta quinta-feira (17), data que marca os 29 anos do crime ocorrido na Curva do S.

Duas esculturas do artista Jorge Pedro Lemes, intituladas “Flores para os Sem Terra” e “Nossas raízes”, foram restauradas e reinstaladas em espaço aberto próximo à Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da universidade. Criadas em 2003, as obras foram deterioradas pelo tempo e, agora, retornam com nova estrutura e materiais mais resistentes.

Maria Zelzuita, testemunha do Massacre de Eldorado do Carajás. Fotos: Breno Ortega

A cerimônia contou com a presença da reitoria da UEM, militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), estudantes e representantes de sindicatos. Estavam presentes ainda João Pedro Stédile, da coordenação nacional do MST, e Maria Zelzuita, sobrevivente do massacre e assentada na comunidade 17 de Abril, no Pará.

“Acabou com o sonho de várias pessoas, dos que eles mataram e dos que não morreram ali, porque foram embora e ficaram com medo”, disse Zelzuita. “Eu quase desisti do acampamento, estava só eu e meu filho. Mas com o tempo fui entendendo que eu não posso desistir, tenho que dar valor a cada gota de sangue dos companheiros que foram derramados em cima da pista.”

Stédile reforçou o papel simbólico das esculturas. “Esses registros ficam na memória coletiva para impedir novos massacres e para lutarmos por uma sociedade mais justa, onde todos tenham os mesmos direitos e oportunidades.”

Cada escultura, feita em metal, madeira e cimento, traz o rosto e o nome de um dos trabalhadores mortos. Segundo Lemes, as obras foram inspiradas em totens indígenas. “Os totens sempre trazem uma figura humana. Pensamos: como seria esse cemitério de insepultos? Por isso os rostos dramáticos, queremos que esse trabalho se mostre como um lembrete da história.”

Durante o evento, o reitor da UEM, Leandro Vanalli, destacou o novo posicionamento das peças. “Essa obra, que traz a memória do massacre, estava num cantinho da universidade, deteriorada pelo tempo. Agora, com estrutura redimensionada, certamente trará essa memória durante décadas.”

A reinauguração também reuniu jovens militantes. Nieves Rodrigues, da coordenação pedagógica do acampamento da Juventude na Curva do S, destacou a importância de manter viva a luta. “A Curva do S tem esse ‘S’ de sangue, mas também de sonhos. É preciso comprometer e inspirar a juventude não só na luta de Oziel, mas de todos os que lutam pela terra.”

A programação incluiu apresentações culturais e momentos de mística. A cantora Mari Tenório abriu o evento com “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, seguida de uma encenação sobre a marcha de 1996. Ao final, crianças da Orquestra Popular Camponesa interpretaram o hino do MST, a canção antifascista “Bella Ciao” e “Asa Branca”, de Luiz Gonzaga, com coral, violinos, violões, violas e cello.

O padre Genivaldo Ubingi, representante da Arquidiocese de Maringá, emocionou os presentes com sua fala. “Compartilhamos a dor e o luto, porque vidas foram massacradas e esse massacre continua. Mas também compartilhamos a esperança que move a luta e gera indignação. Estamos aqui juntos.”

A deputada federal Lenir de Assis (PT-PR) destacou a relevância de a obra ocupar espaço dentro de uma universidade pública. “Estar numa universidade que nós defendemos é um marco político, um ato de resistência e coragem.”

Ao final da cerimônia, artistas, autoridades e militantes realizaram o plantio de duas árvores, símbolo da continuidade e do cuidado com as futuras gerações. “Estamos aqui porque reconhecemos a importância da memória histórica. Não podemos apagar o que aconteceu. Um país sem história é também um país sem memória”, afirmou Gisele Mendes de Carvalho, vice-reitora da UEM.

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