Líder do Partido Liberal (PL), sigla que tem demonstrado posição favorável à cassação de Glauber Braga (Psol-RJ) na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcante (RJ) é autor de uma proposta que dificulta perda de mandato parlamentar. Apresentado em abril de 2022, o texto veio à tona cinco dias após o Supremo Tribunal Federal (STF) condenar o então deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) à perda do cargo por estimular atos antidemocráticos e promover ataques a ministros da Corte.
A medida apresentada por Sóstenes, chamada de Projeto de Resolução (PRC) 12/2022, altera o Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD) para ampliar de 257 para 340 o quórum de apoio necessário à aprovação de cassação.
No texto, o líder do PL propõe que seja alterado o rito de apreciação de processos do tipo em alguns casos específicos. O artigo 240 do RICD prevê seis circunstâncias para perda de mandato. São elas: I) infração às proibições fixadas no artigo 54 da Constituição Federal; II) procedimento declarado como incompatível com o decoro parlamentar; III) falta de comparecimento à terça parte das sessões ordinárias da Câmara ao longo de um mesmo ano legislativo, salvo em casos de licença ou missão autorizada pela Casa; IV) perda ou suspensão dos direitos políticos; V) decisão da Justiça Eleitoral relativa aos casos previstos na Constituição; VI) e condenação criminal transitada em julgado.
É dentro do item II que se insere o caso do psolista Glauber Braga, alvo de um pedido de cassação apresentado pelo partido Novo por quebra de decoro. Os opositores do deputado de esquerda e o relator do caso no Conselho de Ética, Paulo Magalhães (PSD-BA), sustentam que Braga teria extrapolado os limites das prerrogativas parlamentares ao se envolver em uma discussão que evoluiu para as vias de fato com um militante de extrema direita. O caso ocorreu em abril de 2024 e resultou na expulsão do rapaz da Câmara a chutes.

O regimento determina que, nos casos três a cinco, a perda do mandato deve ser declarada pela mesa diretora, “de ofício ou mediante provocação de qualquer deputado ou de partido com representação no Congresso Nacional”, sendo assegurado ao representado o direito à ampla defesa. Já para os casos I, II e VI, é obrigatória a consulta ao plenário da Casa, que, para aprovar perda de mandato, exige ao menos o apoio da maioria absoluta dos membros, equivalente a 257 votos, e “votação ostensiva”, que significa voto nominal, ou seja, com a identificação pública da posição de cada membro da Casa.
Já a proposta de Sóstenes Cavalcante fixa que, para esses três casos, deve-se exigir “votação ostensiva e presencial”, com uma margem obrigatória de 340 votos, ou dois terços do total de integrantes da Câmara. Na argumentação do projeto, o líder do PL afirma que seria preciso dar “maior clareza” ao trecho do RICD que trata do assunto para garantir “segurança jurídica à decisão que venha ser proferida em plenário”.
Sóstenes argumenta ainda, em um recado ao STF, que não cabe à Câmara “se ater a um mero papel homologatório da decisão emanada de outro Poder, mas apreciá-la, dentro da função fiscalizatória que lhe é inerente, prevenindo e impedindo abusos e extravagâncias legais e constitucionais, à luz da lei, da Constituição, dos princípios gerais do direito e do Estado democrático”. É à Corte que a bancada do Psol tem dito que pretende recorrer, caso o plenário da Câmara se decida pela cassação de Braga. O partido considera a medida “desproporcional” ao ato praticado pelo parlamentar fluminense.
No PRC 12/2022, Sóstenes frisa ainda que, em casos de pedido de cassação, deve-se levar em conta “a gravidade, a relevância e a excepcionalidade de que se reveste a perda de um mandato parlamentar, e o significado do mesmo ante a parcela de cidadãos que o delegou ao seu titular, evitando a banalização do procedimento, e também em analogia com o quórum necessário para a admissibilidade de outro evento de elevada importância, como o processo de impeachment de presidentes da República”.
O atual quórum para apreciação de propostas de cassação é definido pela Constituição, motivo pelo qual o PRC de Sóstenes foi apontado, na época de sua apresentação, como tendo vício formal, já que o parlamentar propõe a mudança por meio de projeto de lei, e não por emenda constitucional, como preveem as regras. O texto atualmente está parado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde aguarda a apresentação de parecer do relator, Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP).
Nos últimos dias, o deputado do PL disse à imprensa ser pessoalmente contrário à cassação de Braga, mas antecipou que pretende votar favoravelmente ao relatório de Magalhães por conta da posição do partido, o mesmo do ex-presidente Jair Bolsonaro e adversário do campo da esquerda. Procurado pelo Brasil de Fato para comentar o assunto à luz dos argumentos apresentados no PRC 12/2022, Sóstenes criticou o Psol e correligionários, além de ter reforçado o posicionamento do partido.
“Se a esquerda e o próprio Glauber tivessem poupado Daniel Silveira, hoje eles teriam moral para evitar a cassação do Glauber. Mas a esquerda é hipócrita. ‘Quando são meus adversários eu caço; quando são meus aliados tenho que salvar’, isso é, dois pesos, duas medidas. Eles não têm moral para salvar o Glauber. Pessoalmente, acho um exagero e um erro a cassação nos dois casos, entretanto, hoje sou líder de uma bancada de 92 parlamentares e a ampla maioria da bancada é contrária [ao freio na cassação]. O Glauber já pediu a cassação de, no mínimo, 11 deputados da Casa, e isso pesa muito contra ele”, disse Sóstenes à reportagem.
Trâmite
O processo relativo a Braga ainda não tem data para ser apreciado no plenário da Casa e está em fase de apresentação de recurso à CCJ, à qual a defesa tem dito que irá recorrer na próxima terça (22). A atuação do colegiado, no entanto, não inclui apreciação de mérito, resumindo-se apenas à avaliação de questionamentos jurídicos. Caso a CCJ acolha o recurso do psolista, o caso retorna ao Conselho de Ética. Se houver negativa, vai direto a plenário.