Acre tem oitava maior taxa de casos de hanseníase a cada 100 mil habitantes no país, diz Ministério da Saúde


Com 16,26 casos a cada 100 mil habitantes, índice coloca o Acre na quarta posição na região Norte, e acima da média nacional que foi de 9,67. Em 2023, o estado apresentou redução nos casos, mas número seguiu acima de 100. O Acre tem a oitava maior taxa de casos de hanseníase a cada 100 mil habitantes no país, segundo boletim epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, do Ministério da Saúde.
Janeiro roxo dedicado à conscientização sobre a hanseníase
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O Acre tem a oitava maior taxa de casos de hanseníase a cada 100 mil habitantes no país, segundo boletim epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, do Ministério da Saúde.
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Com 16,26 casos a cada 100 mil habitantes, o índice coloca o Acre na quarta posição na região Norte, e acima da média nacional que foi de 9,67. O estado com maior taxa foi Mato Grosso, com 66,20 casos.
Taxa de detecção geral de casos novos de hanseníase, a cada 100 mil habitantes
Reprodução
Em 2023, o estado apresentou redução nos casos, mas número seguiu acima de 100, chegando a 111, segundo dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação divulgados pela Vigilância Epidemiológica da Hanseníase do estado.
Ainda de acordo com o boletim, o Acre também teve redução nos casos novos considerando os últimos 10 anos. Em 2013, foram 137 novas confirmações, contra 135 em 2022, o que dá uma queda de 1,4%. Nesse período, o pico de confirmações foi registrado em 2014, com 141 novos casos.
Redução de casos e ‘Janeiro Roxo’
Entre 2023 e 2022, o Acre teve uma redução de 22% nos casos de hanseníase, de acordo com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação divulgados pela Vigilância Epidemiológica da Hanseníase do estado.
No ano passado, o total de pacientes confirmados ficou em 111, e chegou ao terceiro ano seguido acima de 100 com a doença. Em 2020, primeiro ano da pandemia de Covid-19, o número de casos ficou em 86. Em 2021, o número subiu para 109 casos, e voltou a crescer, chegando a 143 em 2022.
A Secretaria de Saúde do Acre (Sesacre) ressalta que a falta de informação ainda é um dos obstáculos no combate à infecção. Essa é uma das questões abordadas pela campanha “Janeiro Roxo”, que busca conscientizar sobre a hanseníase.
No Acre, a campanha contará com rodas de conversa, orientação nas URAPS da capital, além da Policlínica Barral Y Barral, Em Xapuri, a partir desta segunda-feira (15) e o sábado (20), também ocorrerá uma ação de testagem rápida para a doença.
A responsável pela vigilância da hanseníase, Suilany Souza, destaca que diagnóstico precoce e o acesso oportuno ao tratamento interrompe a transmissão e evita sobretudo possíveis casos de incapacitação física
“Todas as ações são voltadas para a conscientização da população acerca da importância de se manter atento para os sinais e sintomas da hanseníase. Em caso de suspeita, procurar o serviço de saúde mais próximo para passar por uma avaliação clínica e laboratorial. O tratamento está disponível na rede pública de saúde”, disse.
‘Caçados que nem bicho’
Pacientes contam que polícia invadia mata para obrigá-los a internação
Tácita Muniz/G1
Assinada pelo general Eurico Gaspar Dutra, a lei nº 610, de 13 de Janeiro de 1949, era clara: isolar e separar da família todos os portadores de hanseníase. O decreto é composto por 34 artigos, que revelam uma verdadeira caçada aos doentes.
A doença, na época ainda conhecida como lepra, fazia com que os pacientes fossem perseguidos e isolados. Toda essa perseguição só terminou após 30 anos, na década de 80. “É obrigatório o isolamento dos casos contagiantes de lepra”, enfatiza o artigo 7 da lei.
Ao decorrer do decreto é possível ainda ver medidas ainda mais radicais, como a determinação de separar filhos dos pais acometidos pela doença.
O Estado conseguia chegar até os doentes através de denúncias da própria comunidade. Com medo, muitos doentes fugiam para o mato e começava uma verdadeira caçada a esses pacientes, segundo o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan).
“Na verdade, a comunidade era pequena e a época era de seringueiros e tinha o chefe de barracão, que também era chamado como patrão. Então, quando tinha essas pessoas, o próprio patrão denunciava e a pessoa tinha que sair daquela comunidade, quando a pessoa resistia, era caçado com cachorros. Os pacientes ficavam com medo, porque sabiam que seriam isolados”, conta Elson Dias, diretor do Morhan.
Foi o que aconteceu com Raimundo Lima. Aos 62 anos, ele contou ao g1 que foi acometido pela hanseníase quando tinha 12 anos e morava com a família em um seringal. Quando soube que estava doente, tentou esconder-se da guarda sanitária, mas foi encontrado e levado até ao hospital Souza Araújo.
O que ele mais lembra do dia? A forma como foi carregado em uma embarcação. O medo do contágio era tão grande que os pacientes eram levados em uma canoa puxada por uma corda ligada à embarcação que seguia até o isolamento.
“Com 13 anos vim a primeira vez para o leprosário pela polícia. Amarravam uma canoa no barco e a gente vinha separado, que nem bicho. Quando a pessoa disse ao meu pai que eu tinha a doença, eu nem sabia o que era. Nem conhecia lepra”, relembra.
Sonhos mutilados
Sátiro Lima sonhava em poder estudar e fazer faculdade: ‘queria ser alguém na vida’
Tácita Muniz/G1
Aos 74 anos, Sátiro Lima contou que quase não se lembra mais dos seus 12, quando foi acometido pela doença e foi internado pela primeira vez. Algo que o marca até hoje é que ele não conhecia as pessoas que o levaram até o hospital. “Meu pai era pobre, fui levado por pessoas estranhas”, recorda.
Voz mansa e quase inaudível, ele conta que a doença já estava bastante avançada e aos poucos precisou amputar mãos e pés. Como eram isolados, tirados do convívio da sociedade, esses pacientes têm pouco ou nada de estudos. Ao ser questionado se voltou a ver o pai depois de ser internado, ele conta que o pai morreu três anos depois.
Lima nunca casou, nunca teve filhos. As marcas da hanseníase não ficam apenas nos membros amputados, mas na alma de cada um desses pacientes, que por três décadas foram esquecidos e maltratados pelo Estado. Além de membros, a doença também mutilava sonhos.
“O que marcou mais foi o preconceito. Da gente não conseguir ser alguém por conta da doença. Todos os dias penso como seria minha vida sem a doença. Penso que poderia ter sido, por exemplo, um psicólogo, uma pessoa da polícia. Um agente secreto”, diz entre risos e um olhar emocionado.
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