Força silenciosa

O impacto da cadeia de suprimentos no desenvolvimento socialESG Insights

As caravelas, embarcações inovadoras do século XV, representaram um marco crucial na história da navegação e do comércio global, inaugurando a era das grandes descobertas. Com design ágil e capacidade para longas distâncias, esses navios permitiram aos exploradores europeus, como Vasco da Gama e Cristóvão Colombo, navegar além das costas conhecidas, alcançando as Américas, a Índia e além. 

Antes das caravelas, o comércio era limitado principalmente ao Mediterrâneo e aos trajetos terrestres da Ásia, como a famosa Rota da Seda. A capacidade de navegar oceano afora abriu novos caminhos comerciais para especiarias, ouro, prata e outros bens preciosos, transformando radicalmente as economias europeias, iniciando um período de acumulação de riquezas sem precedentes.

A introdução dessas rotas marítimas globais não apenas promoveu o comércio entre continentes distantes, mas também estabeleceu as bases para o sistema de mercado global moderno. Por exemplo, a chegada de Vasco da Gama à Índia em 1498 abriu o comércio direto de especiarias entre a Europa e a Ásia, reduzindo a dependência dos intermediários árabes e venezianos.

Essa nova era de comércio e exploração levou à acumulação de capital na Europa, financiando o Renascimento e, posteriormente, a Revolução Industrial. Comparativamente, antes dessa época, as economias europeias eram relativamente fechadas e localizadas, com riquezas baseadas principalmente na agricultura e no comércio regional limitado. A transição para uma economia baseada no comércio global alterou permanentemente as estruturas sociais, econômicas e políticas do mundo.

Fato é que a cadeia de suprimentos global é parte inerente de nossas vidas. Combustíveis, máquinas e equipamentos, materiais elétricos e eletrônicos, adubos e veículos são alguns dos muitos itens importados que de alguma forma impactam nossas vidas. 

O Brasil, por exemplo, abastece o mundo com alimentos e minérios. Produtos chegam do porto ou ao porto, principalmente através de uma frota de dois milhões de caminhões, mas também ferrovias, hidrovias e aerovias. Escondido no preço de cada bem material que você já comprou, está o custo desta cadeia toda, que em muitos casos chega até 20% ou mais. No entanto, foi só em 2020, após um turbulento período, que deixamos de ignorar o quão fundamental é a importância da cadeia de suprimentos em nossas vidas. 

A pandemia de Covid-19 desencadeou uma série de disrupções sem precedentes na cadeia de suprimentos global, expondo sua vulnerabilidade diante de choques sistêmicos. O impacto foi sentido em múltiplos setores, desde a escassez de produtos essenciais, como alimentos e medicamentos, até atrasos e aumento dos custos em eletrônicos e automóveis. 

Segundo um relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), a dependência de cadeias de suprimentos altamente concentradas em certas regiões, como os componentes eletrônicos na Ásia, agravou os efeitos da pandemia. As interrupções no transporte marítimo e aéreo, juntamente com o fechamento de fábricas, levaram a um aumento significativo nos tempos de entrega e nos preços dos fretes, impactando diretamente os consumidores finais com inflação nos preços derivados da disponibilidade reduzida de produtos.

As pessoas menos favorecidas, que já dedicam uma maior proporção de sua renda a necessidades básicas como alimentação e moradia, são os mais atingidos quando a cadeia é rompida. Exemplo disso foi observado durante a guerra da Ucrânia, onde a interrupção da exportação de grãos e a crise energética afetaram negativamente os preços desses itens, prejudicando principalmente aquelas faixas da população que não tem como se defender do aumento inflacionário. 

A pobreza em uma região muitas vezes revela também deficiências na cadeia de suprimentos. Regiões carentes muitas vezes carecem de água potável, saneamento adequado, acesso à educação e saúde devido à escassez de profissionais, além de enfrentarem insegurança alimentar e ausência de eletricidade e internet. Caso tivesse um fácil acesso de produtos e serviços por trem, avião, veículos ou até balsas, maiores seriam as possibilidades de reverter o cenário. 

Vejam que em geral, áreas como montanhas, onde é mais caro e complexo montar uma cadeia, são muitas vezes áreas mais pobres, como a região dos Apalaches nos EUA em contraste com os berços das civilizações próximos a importantes rios como o Nilo, Eufrates e o Tigre. Rios que permitem o transporte de pessoas ou bens como é o caso do rio Mississipi facilitam o desenvolvimento agrícola na região e o enriquecimento. 

Se queremos melhorar nossa sociedade, eliminar a miséria e proteger o meio ambiente através da economia circular, precisamos voltar aos livros de história para entender como depois de centenas de milhares de anos de pobreza extrema, conseguiu o ser humano quebrar este ciclo. Spoiler – foi a inovação na cadeia de suprimentos.   

Referências e fontes: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Banco Mundial; “História Geral das Navegações e Descobrimentos”  David Birmingham; Referências e fontes: Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO);  Relatório “O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo 2021”.
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