
O Boao Fórum para a Ásia (BFA) é uma das principais plataformas de diálogo econômico e político da Ásia, frequentemente comparado ao Fórum Econômico Mundial de Davos, mas com foco regional. Criado em 2001 na cidade de Boao, na província chinesa de Hainan, o BFA, que se reúne neste ano entre 25 e 28 de março para discutir o tema “A Ásia em um mundo em transição: Na direção de um futuro compartilhado”, congrega líderes governamentais, empresários e especialistas para discutir temas como comércio internacional, desenvolvimento sustentável, inovação tecnológica e cooperação regional. Seu objetivo é promover a integração econômica da Ásia e enfrentar desafios globais, servindo como um espaço estratégico para negociações e parcerias. Atualmente, o BFA é um dos mais importantes espaços de debate sobre os rumos da economia asiática e sua articulação com o sistema internacional. Boao é o espelho do novo protagonismo do Oriente, que se consolida como o epicentro da economia, da inovação e da geopolítica do século XXI.
Enquanto o mundo enfrenta um cenário marcado por desafios econômicos, tensões geopolíticas e redefinições estratégicas, a Ásia reafirma-se como o motor do crescimento global. Diante disso, é preocupante que a atual viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Ásia — marcada por importantes encontros bilaterais — não tenha incluído uma participação institucional no Boao Fórum, especialmente diante da reorganização das forças econômicas globais. O gesto teria sinalizado o reconhecimento de que o século XXI é asiático — não europeu, tampouco norte-americano — e que o Brasil precisa estar onde o futuro está sendo moldado.
Segundo dados do relatório mais recente do Fórum, a Ásia deverá registrar um crescimento médio de 4,5% em 2025, consolidando-se como o maior contribuinte individual ao crescimento global. Em paridade de poder de compra, o continente representará 48,6% da economia mundial, evidência do seu peso cada vez mais determinante. Enquanto o Ocidente desacelera, a Ásia acelera com consistência, impulsionada por cadeias de valor sofisticadas, investimentos robustos em infraestrutura e uma integração regional cada vez mais eficaz.
A integração econômica asiática não é retórica, é prática. O avanço do Parceria Econômica Regional Abrangente (RCEP), maior acordo de livre comércio do mundo, demonstra a disposição dos países da região em cooperar, reduzir barreiras e construir um bloco econômico autossustentável. Esse movimento tem fortalecido o comércio intra-asiático — que representa hoje mais de 56% das trocas da região — e fomentado novas dinâmicas de investimento e inovação. A China, por exemplo, segue como o principal centro de gravidade das cadeias produtivas globais, mesmo diante de esforços ocidentais para “desacoplamento”.
Paralelamente, a Ásia avança com vigor no comércio digital e nos serviços de alto valor agregado. Em 2024, o comércio eletrônico na Ásia-Pacífico cresceu 8,4%, e os serviços digitais — como telecomunicações e tecnologia da informação — se consolidaram como nova fronteira de crescimento. A interdependência tecnológica entre as economias asiáticas cresce, ao passo que a dependência global da região para fornecimento de bens intermediários e serviços especializados torna-se incontornável.
A viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Japão e ao Vietnã representa, sem dúvida, um passo significativo na estratégia brasileira de reaproximação com a Ásia. Contudo, ao mesmo tempo em que o Brasil demonstra esforço bilateral com países asiáticos, chama atenção sua ausência institucional em fóruns multilaterais de alta relevância. Ambos os gestos — a visita a Tóquio e Hanói, e a ausência em Boao — revelam as nuances da política externa brasileira. Há uma aproximação com a Ásia, sim. Mas ela precisa ser mais abrangente, combinando o esforço bilateral com uma atuação robusta em espaços de diálogo regional, onde são definidas diretrizes de integração econômica, tecnológica e política.
É fundamental compreender que o protagonismo asiático no século XXI não é apenas econômico, mas também institucional. Estar presente fisicamente na Ásia não substitui a necessidade de estar presente nas mesas em que a Ásia pensa, projeta e organiza o seu papel no mundo. O século é asiático — e o Brasil precisa estar, ao mesmo tempo, nos palácios de Tóquio, nas salas de negociação de Hanói e nas plenárias de Boao.
É hora de atualizar o mapa mental da nossa política externa. Participar ativamente dos fóruns asiáticos, compreender as tendências da região e construir pontes comerciais, tecnológicas e diplomáticas com o Oriente deve ser uma prioridade estratégica. A nova rota do futuro passa por Hainan, não mais por Davos.
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