Em 2025, precisamos desacelerar e aprender a se conectar com o agora

Em 2025, precisamos desacelerar e aprender a se conectar com o agoraMavi Faria

“Para nós, da geração Z, cuidar da saúde mental é como uma necessidade, e não um luxo como gerações anteriores costumam encarar”. A afirmação de Daniele Peixoto, 18 anos, integrante da Galera CAPRICHO 2024, é o exemplo de como a geração Z não esconde nem a existência dos sintomas da ansiedade ou o quanto é a mais afetada por questões que moldam sua relação com o mundo ao redor.

“É meio doido ter que relembrar que é essencial para a gente não estar em um meio tóxico, que nos cause crises, porque para mim, é óbvio que a gente tem que se priorizar. Mas se eu pergunto para o meu pai, um senhor de idade, ele não pensa assim”, ressalta.

 

 

E nós sabemos e você aí do outro lado também: a consciência de que é preciso falar sobre saúde mental foi adquirida há muito pouco tempo, com o volume de acesso à informação – disponibilizada em larga escala nas mídias sociais –, por experiências pessoais e, sobretudo, pela vivência da pandemia.

“Foi nesta época, quando entendemos a necessidade da saúde mental, que muitos jovens identificaram algumas divergências e desconfortos quanto aos seus ‘quadros mentais’ e quem pôde custear, procurou ajuda”, compartilha Pedro Ribeiro, 17 anos, também integrante da Galera CAPRICHO de 2024.

Aquela sensação comum de preocupação, nervoso e angústia ao extremo, já virou até dado de pesquisa. Segundo a Rede de Atenção Psicossocial (Raps), vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS), em 2023, pela primeira vez, o número de crianças e adolescentes afetados por transtornos nervosos foi maior do que o de adultos. É, o problema é bem, bem sério.

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Para se ter uma noção, conforme o estudo, 125,8 a cada 100 mil crianças de 10 a 14 anos foram atendidas com questões de ansiedade, e 157 a cada 100 mil de adolescentes. Já nos adultos, a proporção caiu para 112 a cada 100 mil. Uma diferença muito grande, né?

Amada e odiada?

Sintomas como sobrecarga emocional, distração, baixa autoestima, preocupação, nervosismo e dificuldade de interação social são característicos de um período de descoberta do mundo, como a adolescência e juventude. Mas, incentivados pelo uso desregulado das redes sociais, putz…

“Acho que a comparação constante nas redes sociais é um dos maiores vilões na nossa geração”, relata Emanuele Assereuy, 17 anos. Membro da Galera CH e adepta da tecnologia tanto para o lazer, quanto para o trabalho, ela reitera como a internet consegue “espalhar mais informações e evitar que a gente se sinta sozinho” pela capacidade de interação e aproximação com colegas, amigos e até desconhecidos.

Apesar disso, ela não deixa de mencionar como é desgastante “ver a vida perfeita dos outros”, o que gera nela “sentimentos de inferioridade e insegurança, além da pressão para ser sempre feliz e produtivo”.

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Uma pesquisa rápida no feed, inclusive, já traz até o diagnóstico: é possível apresentar os sintomas dos transtornos mais comuns, cuidados e técnicas das mais simples às mais inusitadas para driblá-los. A quantidade de informações (inclusive sem fonte confiável) é grande – e deve ser lida com cautela.

Essas plataformas, embora conectem as pessoas, também intensificam a comparação social, o medo de exclusão, a busca incessante por validação externa e a necessidade de se equiparar a expectativas irreais, que pode resultar em transtornos como ansiedade e depressão, além de dificuldade de se relacionar no mundo real”, explica a psicóloga e psicanalista Luciana Inocêncio, da Faculdade de Medicina da USP, à CAPRICHO.

Há poucos cliques de distância, as redes sociais hoje reúnem os amigos, as famílias, os relacionamentos, os sonhos, as perspectivas de emprego, o lazer e até a rotina da nossa galera de forma tão intensa que pode ser difícil distinguir o que faz parte da vida virtual e da real.

“Nosso cérebro fica muito centrado nas redes sociais e a nossa rede neural começa a achar que aquilo na tela é verdade, que eu preciso ser dessa forma, ter esse corpo, ter essa rotina para ser feliz. Por isso que o contato extremo com este mundo faz a autoestima despencar”, explica a neuropsicóloga que estuda o comportamento adolescente, Lilian Vendrame.

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Não é surpresa. Você aí do outro lado sabe quais são os sintomas clínicos da ansiedade, da depressão e até o método aplicado nos tratamentos – ou que a personagem mais famosa e que conquistou o público no filme “Divertida Mente 2”, lançado este ano, é a Ansiedade, uma caricatura que conseguiu transportar para as telas sentimentos comuns a tantos jovens e crianças.

Dentro da escola onde atende, Vendrame relata à CAPRICHO que o principal sintoma observado nos alunos é a distração. Recentemente, sua análise foi reforçada quando um aluno de 16 anos a alertou, após ser questionado do que havia aprendido com as aulas, que “a gente só decora coisas de 15 segundos”.

Ela explica que “são esses 15 segundos que resumem, ao mesmo tempo, os problemas e a relação mais positiva dessa geração com a saúde mental”. A dificuldade de concentração é um reflexo de “adolescentes impacientes, frustrados, distraídos, com dificuldades de se relacionar e de lidar com as emoções”. Mas ela diz que o ponto positivo é a consciência do problema, algo novo nesta galera.

Nomear é o primeiro passo

No seu consultório, Vendrame confessa que quem a procurou, em boa parte dos casos, foram os próprios pacientes, que perceberam a necessidade de ajuda especializada para lidar com suas questões. Esse é o movimento que ela espera se tornar ainda mais comum em 2025, mesmo se o jovem parte para o profissional com o diagnóstico “do TikTok” pronto.

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“Eles começam a achar que tem tudo, chegam com um diagnóstico do TikTok para mim e, nele, todo mundo tem Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), todo mundo tem Autismo”, brinca Vendrame, que não se incomoda com os autodiagnósticos, desde que a pessoa busque ajuda para lidar com ele e até descobrir se é verídico. “Será que é TDAH mesmo ou é abuso de internet?”, questiona.

Neste processo de conscientizar os jovens a entender o que sentem e a buscar ajuda, a neuropsicóloga acredita que as mídias sociais são importantes. “Com a internet, ele pode aprender os sintomas de um problema mental e como controlá-lo, onde buscar ajuda e pode até aprender a pensar ‘será que quando falam comigo, eu entendo o que eu quero por conta da ansiedade ou estou prestando atenção no outro?’”.

Entender o turbilhão de sentimentos que envolve a adolescência, em qualquer geração, não é fácil, por isso a expectativa da neuropsicóloga é que cada vez mais jovens consigam, em 2025, “perceber o que cada situação me causa e me conectar com o agora”.

As redes sociais não vão sumir e buscar pelo equilíbrio no tempo de tela é sempre benéfico, mas enquanto isso, prestar atenção quando a “bagunça emocional” começar a incomodar demais e procurar ajuda especializada já é um passo significativo.

*Estagiária da CAPRICHO. Texto supervisionado e editado por Juliana Morales e Andréa Martinelli.

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