Caso Genivaldo: julgamento de ex-policiais chega à fase final


Genivaldo morreu em maio de 2022, durante uma abordagem policial em que foi trancado no porta-malas de uma viatura da PRF e submetido à inalação de gás lacrimogêneo na BR-101, no município de Umbaúba. Perícia afirma que gases tóxicos causaram colapso no pulmão de Genivaldo
Nesta sexta-feira (6), após 11 dias, entra na fase final o julgamento dos ex-policiais rodoviários federais Paulo Rodolpho Lima Nascimento, Kleber Nascimento Freitas e William de Barros Noia, acusados pela morte de Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, durante uma abordagem. Genivaldo morreu em maio de 2022, após ser trancado no porta-malas de uma viatura da PRF e submetido à inalação de gás lacrimogêneo na BR-101, no município de Umbaúba.

✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 SE no WhatsApp
Os réus são acusados pelos crimes de tortura e homicídio triplamente qualificado. Eles estão presos desde 14 de outubro de 2022, e foram demitidos da PRF após determinação do Ministro da Justiça, em agosto de 2023.
Segundo a Justiça Federal, a fase final do júri popular deve durar cerca de nove horas, da seguinte forma:
O debate será aberto pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela assistência de acusação. Os debates terão 2h30 (tempo total) para apresentar suas teses acusatórias.
Em seguida, a defesa de cada réu terá 50 minutos para apresentar suas teses defensivas, totalizando 2h30.
O MPF e a assistência de acusação poderão solicitar réplica, com duração total de 2 horas.
Havendo réplica, a defesa tem direito à tréplica, também de 2h, sendo 40 minutos para cada réu.
Na sequência, os jurados se reunirão para responder a quesitos propostos pelo presidente do júri, o juiz federal Rafael Soares. São as respostas a esses quesitos que definirão se os réus serão absolvidos ou condenados.
Caberá ao juiz informar o veredito. Em caso de condenação, ele que aplicará a pena respectiva.
O que disseram os réus
Caso Genivaldo: réus chegam ao fórum para a fase final do julgamento
William de Barros Noia
William de Barros Noia depondo
Juliana Galvão/Ascom TRF5
William Noia, de 38 anos, foi o primeiro a depor. O interrogatório durou quase quatro horas. Ele contou que no dia da abordagem, a orientação era atuar na fiscalização de trânsito e combate a criminalidade com o foco em motocicletas. O ex-agente afirmou que iniciou a abordagem a Genivaldo sozinho, e que ele não obedeceu aos comandos, sendo necessário o reforço da equipe.
Noia disse, ainda, que nenhuma de suas intervenções teve a intenção de provocar a morte de Genivaldo. Sobre a utilização da bomba de gás lacrimogênio durante a ação policial, ele contou que só percebeu o uso após ela ter sido acionada por Paulo Rodolpho.
O ex-prf não respondeu aos questionamentos do Ministério Público Federal, o que é um direito do réu.
Paulo Rodolpho
Paulo Rodolpho
Juliana Galvão/Ascom TRF5
No dia seguinte, por cerca de sete horas, com intervalos, aconteceu o depoimento de Paulo Rodolpho, 44 anos. Ele disse que no grupo de motociclismo tático em que atuava, havia uma rotina diferenciada, com turnos de doze horas, três plantões por semana. A abordagem que resultou na morte de Genivaldo, ocorreu em uma quarta-feira. Na segunda-feira, dois dias antes, eles também atuaram em Umbaúba. Nesse dia, dois rapazes vinham numa moto entrando na BR e, quando viram a viatura, voltaram no sentido contrário. Houve perseguição e a viatura bateu na moto. Segundo Paulo, eles se machucaram e esses machucados foram atribuídos como tortura. Ele ainda ressaltou que não tem qualquer tipo de animosidade com o povo de Umbaúba, já que o pai morava lá.
No momento em que viram Genivaldo sem capacete, William foi abordá-lo, e ele foi para outra abordagem a motociclista. Durante essa abordagem, recebeu o chamado de William. Quando se aproximou, William já estava no chão, em contato corporal com tentativa de contenção em uma situação considerada crítica, segundo ele. E que ele tinha o dever funcional e ⁠moral de agir. Diante da impossibilidade de contenção de Genivaldo, utilizou a granada de gás lacrimogênio. Confirmou a versão de William de que não avisou verbalmente aos colegas sobre a utilização do artefato. Ainda ressaltou que não tinha o propósito de causar morte e sim de conter Genivaldo. Ele disse também que só lançou a bomba porque confiava no equipamento e que entraria no porta-malas de uma viatura com gás lacrimogênio porque confia em tudo o que lhe foi ensinado.
Paulo Rodolpho respondeu a perguntas pelo Ministério Público Federal.
Kleber Nascimento
Kleber Nascimento Freitas
Juliana Galvão/Ascom TRF5
O interrogatório de Kleber Nascimento durou pouco mais de três horas. Último a depôr, o ex-prf começou afirmando que nenhum policial sai de casa para matar e que no dia da abordagem estava doente, mas mesmo com atestado médico foi trabalhar a pedido de um colega. O objetivo era ajudar na operação de um programa nacional de combate à criminalidade.
Afirmou, ainda, que durante toda a carreira como PRF nunca atendeu uma situação com tanta resistência como a de Genivaldo. Kleber confirmou que fez o uso de spray de pimenta por, pelo menos, cinco vezes durante a tentativa de conter Genivaldo. E informou também que tentou reanimar Genivaldo.
O ex-prf não respondeu aos questionamentos do Ministério Público Federal, o que é um direito do réu.
Julgamento
Sala em que acontece júri popular do caso Genivaldo dos Santos, em Estância (SE)
Ascom TRF5
Foram convocadas 30 testemunhas e seis peritos, sendo que sete testemunhas e uma perita foram dispensadas. A fase de depoimentos de testemunhas e peritos foi encerrada nesta quarta. Segundo a Justiça Federal, a dispensa de testemunhas é um processo comum dentro do Tribunal do Júri e pode ser feito por todas as partes.
Wallysson de Jesus Santos, sobrinho da vítima;
uma pessoa que presenciou a ação;
a mãe de Genivaldo, Maria Vicente;
a ex-esposa de Wallysson (com quem era casado à época);
um químico especialista em gás, ex-funcionário da empresa fabricante da granada de gás lacrimogêneo acionada dentro da viatura da PRF;
o corregedor regional da PRF, que atuou na apuração das denúncias e no procedimento administrativo disciplinar instaurado contra os réus;
uma irmã de Genivaldo;
a viúva, Maria Fabiana;
a médica que fez o atendimento de Genivaldo quando ele foi levado ao hospital;
mais uma pessoa que presenciou a ação;
agricultor que passava pelo local;
um mecânico que presenciou o começo do procedimento policial
um amigo de infância de Genivaldo, que viu a situação a partir do momento em que ele estava imobilizado;
um policial rodoviário federal (defesa – William Noia);
outro policial rodoviário federal (defesa – William Noia);
mais um policial rodoviário federal (defesa – Paulo Rodolpho);
médico cardiologista (defesa – Paulo Rodolpho);
PRF aposentado (defesa – Paulo Rodolpho);
testemunha de defesa de Kleber Nascimento;
tabelião de cartório e amigo que trabalhou na PRF (defesa – Kleber Nascimento);
ex-diretor do IML à época;
perito que fez o exame toxicológico em Genivaldo;
médico legista que fez a necropsia no corpo de Genivaldo;
um perito da Polícia Federal;
uma perita da Polícia Federal;
farmacêutico toxicologista que falou sobre a parte técnico-científica do processo (defesa – Paulo Rodolpho);
um assistente técnico, perito criminal aposentado da PF (defesa – Kleber Nascimento);
psiquiatra forense (defesa de Paulo Rodolpho).
“É uma questão muito delicada, o tipo de abordagem que foi feita e principalmente as consequências. O falecimento de uma pessoa, que apesar de ter alguns problemas, estava plenamente comportada no dia, estava calma e foi abordada de forma agressiva pelos policiais, o que resultou nesse homicídio e aqui nós estamos hoje, começando o Tribunal de Júri para que os jurados decidam se eles são culpados ou inocentes”, disse a procuradora-chefe do MPF em Sergipe, Eunice Dantas
A defesa de Paulo Rodolpho alega que ele é inocente e afirmou que ex-policial seguiu os protocolos da PRF. Já o advogado de Kleber Nascimento alega que a tipificação dos crimes é equivocada e que ele não teve participação em nenhuma. A defesa de William de Barros está convencida de que não houve dolo do cliente na morte na vítima, ou a prática de qualquer espécie de tortura.
Abordagem foi gravada
Nas imagens da abordagem, gravadas por testemunhas, a perícia observou que o policial William de Barros Noia aparece pedindo para que Genivaldo colocasse as mãos na cabeça. Genivaldo obedece, mas mesmo assim, recebe, de Kleber, um jato de spray de pimenta no rosto. Foram, pelo menos, cinco jatos. A ação continuou no chão, quando os policiais pressionaram o pescoço e o peito de Genivaldo com os joelhos.
Após Genivaldo ser colocado no porta-malas da viatura, o policial Paulo Rodolpho jogou uma granada de gás lacrimogêneo no compartimento. Paulo Rodolpho e William seguraram a porta, impedindo que a fumaça se dissipasse mais rapidamente. A perícia feita pela Polícia Federal durante as investigações concluiu que a vítima passou 11 minutos e 27 segundos em meio a gases tóxicos dentro da viatura. Com a detonação do gás lacrimogêneo, houve a liberação de gases tóxicos, como monóxido de carbono e ácido sulfídrico. A perícia constatou que os gases causaram um colapso nos pulmões e ele morreu por asfixia mecânica e insuficiência respiratória.
Indenizações
Em setembro de 2023, a Justiça Federal em Sergipe determinou que a União pague uma indenização por danos morais no valor de R$ 1 milhão para o filho de Genivaldo. Além de pagamento de indenização de R$ 405 mil para a mãe da vítima.
LEIA TAMBÉM
REPERCUSSÃO: ONU cobra das autoridades brasileiras investigação da morte de Genivaldo
PERÍCIA: Gases tóxicos causaram colapso no pulmão de homem que morreu em abordagem
MORTE: Viúva diz que filho ainda não sabe que pai foi torturado

Adicionar aos favoritos o Link permanente.