Quase 500 crianças morreram em hospitais do DF de janeiro a agosto de 2024; rede pública teve 73% dos casos


Em média, foi uma morte por dia na rede pública. Pediatra diz que maior parte da população é atendida pelo SUS, por isso número é expressivo. Profissionais de saúde em corredor de hospital público no DF, em imagem de arquivo
Breno Esaki/Agência Saúde
Entre janeiro e agosto deste ano, 468 crianças de 0 a 14 anos morreram na rede pública e privada de saúde do Distrito Federal. Foram 345 mortes em 19 UPAs e hospitais públicos e 123 em unidades da rede privada.
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👉Em média, uma criança morreu por dia na rede pública de saúde do DF, que concentra 73% das mortes.
“Não me surpreende se 70% a 80% [das mortes] são nos hospitais públicos, porque hospitais privados atendem 20% das crianças. O dado de 73% das mortes nos hospitais públicos não significa acúmulo ou má qualidade”, diz a pediatra do Hospital Regional de Ceilândia (HRC) Andrea Nogueira.
📌Os dados foram obtidos pelo g1 por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Eles revelam ainda que a maioria das mortes foi de recém-nascidos.
Nesta segunda-feira (11), o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) disse ao g1 que “a Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-vida) investiga falecimentos de pacientes, adultos, idosos, crianças e adolescentes em hospitais da rede privada e pública de saúde em razão de suspeita de falha na prestação de serviços hospitalares ou negligência dos profissionais de saúde”.
Segundo o MP, até 31 de outubro, foram registrados 38 pedidos de investigação criminal, sendo 12 relacionados a neonatos e pacientes com até 12 anos.
👉 Neste ano, o g1 acompanhou 7 casos de crianças que morreram na rede pública e privada do DF e que as famílias denunciaram negligência médica. Apresentada em maio, a CPI da Saúde da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) não foi instalada (saiba mais abaixo).
Causa das mortes
Os números mostram que 188 mortes foram por doenças no período perinatal – que inclui a gestação, o parto e logo após o nascimento do bebê – começa na 22ª semana completa de gestação e termina sete dias após o nascimento.
A pediatra Andrea Nogueira destaca que a morte de recém-nascidos ocorre, muitas vezes, pela falta de acompanhamento da mãe durante a gestação.
“Isso reflete desafios do pré-natal, porque falta pré-natal adequado. A falta de detecção de problemas e cuidados na barriga vão se refletir na mortalidade logo depois que o bebê nasce, entre zero e 28 dias”, diz a médica.
A pediatra diz ainda que a falta de pré-natal pode ter ligação com a pré-maturidade extrema que impacta a morte de crianças. As outras duas causas de óbito mais recorrentes são malformação congênita, deformação, anomalia cromossômicas (99) e doenças do aparelho respiratório (39).
Mortes mês a mês e falta de pediatras
O levantamento também aponta o número de mortes mês a mês (veja acima). Até a publicação desta reportagem a Secretaria de Saúde não havia se manifestado.
Já a pediatra do HRC Andrea Nogueira diz que o atendimento para crianças nos hospitais públicos é prejudicado pela falta de profissionais.
“Infelizmente, existe um déficit grande de pediatras na rede pública. As escalas estão incompletas, de modo que o atendimento pleno não está assegurado”, diz a médica.
Casos de negligência no DF em 2024
Neste ano, o g1 acompanhou 7 casos de crianças que morreram na rede pública e privada no DF e em que as famílias denunciaram negligência por parte das equipes de saúde.
Relembre as mortes de crianças na rede pública:
ENZO GABRIEL: menino de 1 ano morreu em 14 de maio, na Upa do Recanto das Emas, após esperar mais de 12 horas por uma ambulância;
JASMINY: bebê de 1 mês morreu por falta de atendimento apropriado na UPA do Recanto das Emas, em 14 de abril;
ANNA JÚLIA: menina de 8 anos morreu no dia 17 de maio após peregrinar por quatro unidades de Saúde;
AURORA: recém-nascida morreu por complicações causadas durante o trabalho de parto;
INGRID: bebê morreu antes mesmo do parto, após mãe ser liberada de hospital;
AYLA: bebê de 11 dias morreu após o parto no Hospital de Ceilândia, no dia 7 de julho. A menina nasceu prematura de 35 semanas e precisou receber oxigênio. Com dois dias de vida ela recebeu alta da equipe médica.
📌 Em maio, o chefe da Casa Civil Gustavo Rocha negou crise no sistema de atendimento médico.
Relembre morte na rede privada:
JOÃO LUCAS: nasceu morto em hospital particular de Brasília, no Sudoeste, em 3 de setembro. Os pais denunciaram a instituição por negligência médica e alegaram que houve demora na realização do parto.
Pedido de CPI
Famílias de crianças que morreram na rede pública de Saúde fazem ato em Brasília.
Marcella Rodrigues/g1
Devido a morte de crianças na rede pública de saúde, deputados distritais apresentaram na Câmara Legislativa (CLDF), em 27 de maio, um pedido de instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigação das “falhas de atendimento e de gestão da saúde pública no DF desde a criação do IGES”.
O que é uma CPI? As Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) são grupos constituídos por parlamentares, para investigar um fato relevante e de interesse público.
O que é o IGES? O Instituto de Gestão Estratégica em Saúde (IGES-DF) é responsável pela administração das Upas, do Hospital de Base, do Hospital Regional de Santa Maria e do contrato com ambulâncias terceirizadas.
No entanto, mesmo com as oito assinaturas necessárias para abrir a investigação, a instalação da CPI não aconteceu. O motivo, seriam as comissões que chegaram antes na “fila de espera” – há três pedidos anteriores (veja mais abaixo).
Para que a CPI da Saúde fosse instalada, seria necessário retirar essas investigações “da frente”.
Em junho, o presidente da CLDF, deputado Wellington Luiz (MDB), que é o responsável por instalar os colegiados, disse ao g1 que a CPI da Saúde dependia da conclusão ou retirada dessas outras comissões. No entanto, nenhuma das três comissões chegou a ser instalada ou retirada.
Em junho, famílias de crianças que morreram na rede pública e profissionais da área da saúde protestaram em frente ao Palácio do Buriti, em defesa da CPI da Saúde.
Confira a data de apresentação e o tema das CPIs requisitadas antes da CPI da Saúde:
28/02/2023: requer criação de CPI para investigar fraudes na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no DF;
29/08/2023: requer criação de CPI para investigar a poluição do Rio Melchior, que faz a divisão geográfica entre Ceilândia e Samambaia;
12/12/2023: requer criação de CPI para investigar a prática de crimes de violência contra as mulheres e os casos de assédio sexual no DF.
27/05/2024: requer criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigação das “falhas de atendimento e de gestão da saúde pública no DF desde a criação do IGES”.
Na segunda-feira (11), o gabinete do deputado Wellington Luiz disse ao g1 que a presidência da CLDF irá formalizar uma consulta ao deputado Robério Negreiros (PSD), autor da primeira CPI da lista – sobre o ICMS – “para saber se ele irá exercer a preferência na instalação ou irá abrir mão para a deputada Paula Belmonte (segunda da lista) instalar a CPI do Rio Melchior”.
“Após essa manifestação do parlamentar o presidente dará início ao rito de instalação”, disse o gabinete.
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