Vítimas de segregação do asilo-colônia que isolou pessoas com hanseníase ainda aguardam para serem indenizadas


Asilo ficava em Itu, no interior de SP, e chegou a abrigar quatro mil pessoas com hanseníase ao mesmo tempo; lei aprovada em novembro de 2023 determina indenização para vítimas, mas ainda não foi regulamentada. Asilo-colônia Pirapitingui, de Itu (SP), era local onde famílias eram segregadas por causa da hanseníase
Reprodução/TV TEM
As vítimas de segregação do asilo-colônia Pirapitingui, de Itu, no interior de São Paulo, ainda aguardam regulamentação de uma lei aprovada em novembro de 2023 para serem indenizados. São pais e filhos que foram separados devido à desinformação e preconceito gerado por décadas contra pacientes com hanseníase.
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No auge da transmissão da doença, no Brasil, o asilo-colônia chegou a abrigar quatro mil pessoas. Os pacientes eram internados de forma compulsória, por determinação da Justiça, após pedido médico.
Moradores de asilo-colônia Pirapitingui, de Itu (SP), passaram por processo de segregação em função da hanseníase
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Na luta pelos direitos humanos dos atingidos pela doença e familiares, foi criado em 1981, na antiga colônia de Bauru (SP), o Movimento de Reintegração dos Acometidos pela Hanseníase (Morhan).
“O Morhan teve esse grande diferencial de ser o movimento organizado e fundado pelos próprios pacientes, pelas pessoas que foram acometidas pela doença e em busca de uma emancipação, em busca de uma prática pedagógica de libertação”, comenta Inhana Olga, diretora nacional do Morhan.
Inhana Olga, diretora nacional do Morhan
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O movimento surgiu no final do isolamento compulsório da hanseníase, com a abertura oficial das colônias. “É um movimento que veio para ajudar, tanto esses pacientes que estavam segregados, isolados nas colônias, à integrar, a voltar a conviver em sociedade, mas também para preparar essa sociedade para receber essa pessoas novamente.”
Dados da Organização das Nações Unidas (ONU), revelam que, entre 1923 e 1986, aproximadamente 16 mil crianças brasileiras foram separadas à força porque os pais sofriam de hanseníase.
Em novembro do ano passado foi sancionada uma lei federal para que filhos de pessoas que tiveram hanseníase pudessem receber um auxílio. A medida foi uma espécie de reparação diante do sofrimento de pais e filhos que enfrentaram a política de segregação.
“A gente continua mobilizado, continua em luta, continua pressionando porque a gente não teve o decreto que regulamentasse a lei e os filhos poderem começar a fazer esses requerimentos para, possivelmente, serem indenizados”, garante Inhana.
Tristes histórias
A manicure Claudete Portela do Prado Pereira, de Sorocaba (SP), faz parte das vítimas de segregação da hanseníase
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A manicure Claudete Portela do Prado Pereira, que mora em Sorocaba (SP), faz parte desse triste episódio de segregação. Os pais dela se conheceram no asilo-colônia Pirapitingui, de onde ela foi retirada quando tinha poucos dias de vida.
“Quando eu nasci, eu já fui levada para o educandário, porque não podia ficar junto a eles. Eles estavam no Pirapitingui. Então, quando eu tinha dois anos o meu pai foi e me tirou de lá, e viemos para cá.”
“Quando a gente veio morar para cá, era a casa lá no fundo. Não tinha a frente. Meu pai, com muito suor, montou um bar no Pirapitingui ae cresceu montando um bar lá. O dinheiro do bar ele construiu aqui. Aqui foi indo aos poucos. Cada tijolinho tem uma história.”
Deusdete Portela, pai de Claudete, morou por seis anos no Pirapitingui. A colônia de Itu faz parte da história da família por vários motivos. Dona Leonilda, esposa dele, é uma delas. Foi aqui que o casal começou a relação que completou cinco décadas e deu vida a Claudete.
Deusdete Portela e a esposa Leonilda, foram obrigados a abrir mão da filha, em função do processo de segregação em Itu (SP)
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“Não podia morar na casa do estado porque não éramos casados. Aí comprei um ranchinho lá e moramos juntos. Aí nasceu ela, dia 9 de dezembro de 1973. Ela nasceu, batizamos ela e já botaram ela dentro de uma cestinha e levou para São Paulo. Foi a maior tristeza”, comenta Deusdete Portela, pai de Claudete.
“Lá, era para ninguém sair para fora. Tinha tudo, até a mulher arrumei lá. Tinha campo de futebol, tinha cinema, teatro, rádio”, lembra.
Deusdete Portela tem histórias sobre a segregação em Itu S(P), em função da hanseníase
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Toda luta trouxe amadurecimento e fortaleceu o vínculo entre a família. Uma força que teve o amor como principal motivação.
“A gente passou muita coisa, mas Deus é tão maravilhoso que hoje a gente tem o que tem por merecimento e muita força de vontade do meu pai e ele sempre não desistia. Isso que nos dava mais força. Nunca deixou faltar nada”, finaliza Claudete.
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