Livro reconta a história da arte sem os homens

Livro reconta a história da arte sem os homensBeatriz Lourenço

Já parou para pensar que a maioria daspinturasque conhecemos são feitas por homens? Por mais que tenham criado correntes artísticas e enfrentado barreiras sociais para entrar no mundo criativo, as figuras femininas sempre foram colocadas à margem do prestígio. Até o século XIX, elas eram impedidas de estudar o ofício e muitas, quando conseguiam, precisavam se esconder por trás de nomes masculinos – por vezes do pai ou do marido.

Com isso em mente, a historiadora e curadora inglesaKaty Hesselcriou o livro“A história da arte sem os homens”, publicado no Brasil pelaEditora Rosa dos Tempos(R$ 219,90). A narrativa acessível e simples guia o leitor por movimentos e obras relevantes ao longo de mais de 500 anos, apresentando a contribuição deartistas mulheres. Podemos ver, por exemplo, os quadros da pintora renascentistaSofonisba Anguissolae a trajetória fascinante da baronesaVon Freytag-Loringhoven, que inventou o conceito doready-made, muito antes deMarcel Duchamp.

A edição brasileira destaca a história das latino-americanas, comoTarsila do Amaral,Lygia Clark,Anita Malfatti,Lygia PapeeAdriana Varejão. Há também um texto inédito da autora sobreMaria Martins, uma das artistas mais influentes do surrealismo, e um posfácio sobre os desafios de quebrar as barreiras construídas pela visão masculina e ocidental da arte.

Além de escritora, Katy também é fundadora da página @thegreatwomenartists, no Instagram, e do podcast do mesmo nome.The Great Women Artists(As grandes mulheres artistas, em tradução livre), é uma homenagem ao texto homônimo da historiadoraLinda Nochlin, que explica que, na verdade, sempre existiram muitas mulheres talentosas. Porém, elas sofreram pressões da sociedade patriarcal para se dedicarem exclusivamente às tarefas domésticas e a criação dos filhos. Abaixo, confira a entrevista completa com Katy Hessel:

Como você se apaixonou pela arte?

Sou apaixonada por arte desde criança. Sou a caçula de quatro irmãos e minha irmã, nove anos mais velha, é obcecada pela história da arte. Ela costumava me levar a museus aos sábados e isso foi abrindo meu olhar para o tema. Como crescemos em Londres e as visitas eram gratuitas, foi uma forma incrível de conhecer artistas. A primeira obra da qual me lembro de ter ficado maravilhada foram as pinturas de Bridget Riley. Ela trabalha em um estilo chamado Op Art, que basicamente são ilusões óticas – eram imagens de espirais, tabuleiros de xadrez ou ondas. Ela cria uma imagem sem realmente mostrar o que é e isso deixava minha visão completamente tonta. Fiquei viciada desde então.

Continua após a publicidade

Quando você percebeu que as artistas mulheres eram menos valorizadas?

Na universidade, quando estudava uma artista chamada Alice Neel. Ela pintava pessoas em Nova York, de 1930 a 1980, mas foi reconhecida somente no final da vida. Então, percebi que isso acontecia com muitas outras. Em outubro de 2015, senti que precisava fazer algo a respeito e abri uma conta no Instagram para divulgar o trabalho de mulheres.

Você acredita que a internet se tornou um meio de ampliar o acesso às artistas?

Sim, a internet é uma ferramenta incrível. Acho que há uma correlação entre o crescimento da internet e a democratização da arte. O Instagram, por exemplo, cria um espaço não hierárquico. Ele me permitiu acessar pessoas e artistas que nunca imaginaria acessar. Quando era mais jovem, estava em um aeroporto em Nova York e conheci a diretora da Tate Modern, Frances Morris, e não acreditei! Fiquei deslumbrada e disse a ela para seguir meu perfil. Essa foi uma maneira de me conectar com essas pessoas. Em termos de compartilhar arte, isso tem sido realmente extraordinário. Acho que há muitos aspectos negativos, mas muitos positivos também.

Você escreve com uma linguagem simples. Há outras maneiras de reduzir o elitismo nesse campo?

Muitas pessoas me mandam mensagens dizendo que não se sentem à vontade em uma galeria ou museu. E, na verdade, isso é completamente errado – precisamos dizer que elas são bem-vindas. A história da arte é a história do mundo em forma visual e todos devem ter acesso. O que tento fazer em todos os meios é deixar o maior número de pessoas entusiasmadas.

Continua após a publicidade

Desde o início da história para cá, as artistas conquistaram algum espaço para si. Isso é suficiente?

Conseguiram. Acho, inclusive, que elas sempre tiveram espaço até certo ponto – mas ele foi, muitas vezes, tirado delas. Obordado,por exemplo, é uma tarefa tradicional feita em grupos. Apesar de complexo e técnico, o ofício nunca foi visto como uma arte de alto nível. Por isso, o melhor que podemos fazer é apoiar umas às outras e mostrá-las ao mundo, mantendo seus espíritos e memórias sempre vivos.

Como podemos valorizar ainda mais o trabalho das mulheres?

Escrevendo sobre elas, divulgando e torcendo. E, se você é um curador ou está em uma posição de poder onde pode montar uma exposição, faça isso. Mostre as artistas para o mundo.

Continua após a publicidade

Temos artistas incríveis no Brasil. Há algum nome que chama sua atenção?

Meu livro obviamente inclui Maria Martins, Adriana Varejão, Lygia Clark, Lygia Pape, Tarsila do Amaral e muitas outras. Adoro a Maria Nepomuceno. Só visitei o Brasil uma vez, quando era adolescente. Mas gostaria de voltar porque acho que ainda tenho muito a descobrir. E, claro, uma das minhas heroínas é Lina Bo Bardi, que fez o incrível MASP, museu em São Paulo. É meu sonho fazer um tour de Lina Bo Bardi pelo país.

A historiadora Katy Hessel destaca o protagonismo feminino no meio criativo e relata os desafios de quebrar barreiras machistas
<span class=”hidden”>–</span>Lily Bertrand-Webb/Divulgação

Assine a newsletter de CLAUDIA

Continua após a publicidade

Receba seleções especiais de receitas, além das melhores dicas de amor & sexo. E o melhor: sem pagar nada. Inscreva-se abaixo para receber as nossas newsletters:

Acompanhe o nosso Whatsapp

Quer receber as últimas notícias, receitas e matérias incríveis de CLAUDIA direto no seu celular? É só se inscrever aqui,no nosso canal no WhatsApp.

Acesse as notícias através de nosso app

Continua após a publicidade

Com o aplicativo de CLAUDIA, disponível paraiOSeAndroid, você confere as edições impressas na íntegra, e ainda ganha acesso ilimitado ao conteúdo dos apps de todos os títulos Abril, como Veja e Superinteressante.

Publicidade

Adicionar aos favoritos o Link permanente.