UFSC realiza procedimento inédito para restauração de documentos atingidos por enchente no RS

Pesquisadores do Labcon (Laboratório de Conservação e Restauração de Documentos), da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), começam neste sábado (5) um importante trabalho de restauração de documentos, históricos e culturais em prol do Rio Grande do Sul.

A instituição recebeu, no início da semana, uma remessa de quase 250 itens em papel danificados durante as enchentes que atingiram o estado vizinho em maio deste ano. Os materiais foram congelados para reduzir os estragos causados pela tragédia natural.

Procedimento, inédito em Santa Catarina, vai proporcionar a restauração de documentos atingidos por enchente no Rio Grande do Sul

Procedimento inédito em Santa Catarina vai proporcionar a restauração de documentos atingidos por enchente no Rio Grande do Sul – Foto: Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

À época, especialistas em conservação, de todo o Brasil, se uniram ao Sistema Estadual de Museus do Rio Grande do Sul e à direção do Arquivo Público e Bibliotecas gaúcho, em uma rede voluntária de apoio para evitar perdas, ainda maiores, do patrimônio histórico e cultural.

Papéis danificados por água precisam de secagem entre 48 e 72 horas após o sinistro, ou os estragos podem ser permanentes. Como muitas instituições não tinham essa condição, os especialistas sugeriram que os materiais fossem congelados.

“O congelamento é uma sobrevida aos documentos que não foram enxugados no tempo adequado e permite o tratamento posterior ao sinistro”, explica o coordenador do Labcon, professor Cezar Karpinski.

Processo de congelamento busca preservar as características do documento até que possa ser restaurado

Processo de congelamento busca preservar as características do documento até que possa ser restaurado – Foto: Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

Trabalho de congelamento é inédito em Santa Catarina

Segundo o Karpinski, o processo de congelamento de documentos é muito comum em países da Europa e Estados Unidos, mas inédito em Santa Catarina, com poucas experiências no país.

“Existem, no Brasil, pouquíssimos tratamentos efetivos assim. Quer dizer, poucos acervos no Brasil foram congelados. Por isso, esse projeto é muito representativo para a ciência da conservação”, explica.

Para congelar materiais em papel, há um protocolo específico que precisa ser seguido para garantir a eficácia da restauração de documentos, como embalagens a vácuo e freezers, ou câmaras frias, de alta potência, que possam chegar a uma temperatura entre -20° e -40°C. Como as instituições não tinham esses recursos, foram usados freezers de cozinha e sacos de lixo para embalar.

Os arquivos resgatados pertencem à Biblioteca Pública de Camaquã e ao Museu de Igrejinha, que ficam em cidades do interior do Rio Grande do Sul. “As instituições foram selecionadas por serem públicas e do interior, que dificilmente contam com recursos humanos qualificados e financeiros para esse trabalho. Por isso, de forma solidária, coloquei o Laboratório à disposição”, conta o pesquisador.

A remessa que veio de Igrejinha possui 150 partituras em alemão, trazidas por imigrantes no início do século XX, e cerca de 50 livros. Já o acervo de Camaquã possui 50 livros publicados sobre a história do município, que são edições esgotadas, ou obras de referência sobre o surgimento da cidade.

Labcon adquiriu freezers de cozinha para adaptar processo de preservação em baixas temperaturas - Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

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Labcon adquiriu freezers de cozinha para adaptar processo de preservação em baixas temperaturas – Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

Coordenador do Labcon, Cezar Karpinski, estima que processo de restauração dos documentos deve durar, pelo menos, dois anos - Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

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Coordenador do Labcon, Cezar Karpinski, estima que processo de restauração dos documentos deve durar, pelo menos, dois anos – Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

Documentos foram entregues no Laboratório de Conservação da UFSC na segunda-feira (30) - Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

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Documentos foram entregues no Laboratório de Conservação da UFSC na segunda-feira (30) – Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

Documentos resgatados em Camaquã contam a história do surgimento do município gaúcho - Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

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Documentos resgatados em Camaquã contam a história do surgimento do município gaúcho – Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

Partituras, trazidas por imigrantes alemães, foram resgatadas no Museu de Igrejinha - Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

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Partituras, trazidas por imigrantes alemães, foram resgatadas no Museu de Igrejinha – Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

Volumes podem demorar dois anos para serem devolvidos

As embalagens foram abertas para dar início ao processo de diagnóstico e, a partir de então, realizar a restauração de documentos. Para começar o trabalho, é necessário entender em que circunstâncias se encontra cada unidade enviada à universidade.

“Temos três doutores da biologia, um da química, um da engenharia técnica, um da conservação e restauração, que é especialista em papel, e um bolsista, fora toda a rede que se mobilizou nesse trabalho”, detalha Karpinski.

O passo a passo para restaurar e devolver os acervos para as instituições deve demorar, pelo menos, dois anos. Segundo Karpinski, apenas as etapas de descongelamento e secagem demoram cerca de seis meses.  Os materiais também passarão por uma análise biológica para garantir a segurança dos pesquisadores.

Como é o processo para restauração de documentos

Cezar Karpinski é historiador, com mais de 20 anos de atuação na área de com arquivos e bibliotecas

Cezar Karpinski é historiador, com mais de 20 anos de atuação na área de arquivos e bibliotecas – Foto: Maria Isabel Miranda/ Agecom/ UFSC/ ND

O professor, que atua há mais de 20 anos com arquivos e bibliotecas, explica que há um protocolo que precisa ser seguido para garantir a eficácia da recuperação dos documentos.

“Enquanto estão congelados, os conservadores realizam um trabalho de coleta de amostras para análise”, comenta Cezar Karpinski.

Essa é a primeira fase, chamada de diagnóstico, que busca entender o contexto de cada unidade, como o tempo que passou embaixo d’água, o quanto permaneceu molhada e o quanto demorou até ser congelada. Após o diagnóstico são feitas as seguintes etapas:

  • Secagem: o documento é aberto e permanece em temperatura ambiente por 24 horas. Depois, disposto em um ambiente com temperatura controlada (entre 20°C e 22°C), a depender da condição do documento;
  • Restauração: reintegração da estrutura em papel, análise cromática, reintegração de tintas e outras características originais;
  • Acondicionamento: última etapa do processo na qual as peças são finalizadas para serem devolvidas ao órgão de origem.

Coletividade define o projeto

Todo o processo de restauração dos materiais, desde o traslado para a sede do Labcon, em Florianópolis, até a devolução dos documentos às cidades gaúchas, é feito de maneira voluntária. Uma equipe de aproximadamente 20 pessoas, entre professores, bolsistas e voluntários, trabalha no projeto da universidade.

“O Labcon está ganhando muita visibilidade, mas esse é um trabalho coletivo. É o Sistema de Museus, a rede de apoio criada lá em maio, tudo é fruto desse trabalho coletivo da área de conservação e restauração do Brasil”, completa o pesquisador.

Uma campanha, similar a um financiamento coletivo, será realizada para arrecadar recursos financeiros para a manutenção e conclusão do projeto. Toda a sociedade será convidada a colaborar com doações via pix, com valores a partir de R$ 1.

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