Fim de contrato com empresa de ortopedia investigada por superfaturamento começa a ser planejado, diz Saúde do AC


Sesacre divulgou nesta sexta-feira (23) que iniciou o planejamento para encerrar o contrato com a Empresa MedTrauma sem prejudicar o atendimento no Pronto-Socorro de Rio Branco. MP-AC recomendou suspensão dos pagamentos. MP-AC recomenda fim de contrato em governo do AC e empresa acusada de superfaturamento
A Secretaria de Saúde do Acre (Sesacre) divulgou, nesta sexta-feira (23), que já iniciou o planejamento para encerrar o contrato com a Empresa MedTrauma Serviços Médicos Especializados Ltda., responsável pela ala ortopédica do Pronto-Socorro de Rio Branco e investigada em um suposto esquema de superfaturamentos e cirurgias desnecessárias.
Sesacre deve encerrar contrato com empresa investigada por superfaturamento
Odair Leal/Sesacre
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Um relatório emitido pela CGU apontou, em agosto de 2023, um superfaturamento com estimativa de R$ 9 milhões.
“Uma nova licitação será feita pelo governo do Acre para suprir as necessidades e demandas na área de ortopedia e trauma no Pronto-Socorro de Rio Branco, para que não haja qualquer tipo de prejuízo para a população”, diz parte do comunicado.
A nota, assinada pelo secretário Pedro Pascoal, destaca que a ‘suspensão imediata dos serviços por parte da contratada acarretará danos irreversíveis à população. Todas as medidas estão sendo adotadas com planejamento e cautela pela gestão’.
Na última terça (20), Pedro Pascoal, defendeu a manutenção do contrato entre o governo do estado e a empresa. O suposto esquema foi criticado por diversos deputados da oposição durante o pequeno expediente na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac).
Recomendação
Também nesta sexta, a 1ª Promotoria de Justiça Especializada na Defesa do Patrimônio Público, Fiscalização das Fundações e Entidade de Interesse SociaL do Ministério Público do Acre (MP-AC) recomendou que a Sesacre suspenda os pagamentos à empresa até que a fiscalização em andamento pelos órgãos de controle seja concluída.
“A suspensão dos pagamentos é vista como medida necessária para resguardar o erário durante o desenrolar das investigações em curso”, argumenta a promotora de Justiça Myrna Teixeira Mendoza no documento.
A Sesacre tem 10 dias para apresentar informações sobre a suspensão dos pagamentos.
Denúncia no Fantástico
O caso é apurado pela Controladoria-Geral da União (CGU) e que resultou em um relatório que destaca tais informações referentes aos anos de 2021 a 2022, na época da primeira gestão do governador Gladson Cameli (PP). A terceirização dos serviços se deu desde agosto de 2021, segundo o documento que conta com 39 páginas detalhando a análise.
A situação foi exposta em uma reportagem do Fantástico (veja a reportagem na íntegra abaixo) veiculada na TV Globo no último domingo (18). A empresa é responsável por administrar a ala ortopédica em hospitais públicos de três estados brasileiros, incluindo o Acre, onde ainda permanece.
Além do estado acreano, a MedTrauma está em hospitais de Roraima e do Mato Grosso, sendo que este último tem contratos com a prefeitura da cidade e também com o governo de Mato Grosso para administrar toda a área ortopédica dos hospitais públicos do estado, tanto da capital, quanto do interior. Os demais estados reincidiram o contrato com a empresa.
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A equipe teve acesso a documentos que comprovavam superfaturamentos e cirurgias desnecessárias. Há também pacientes que até hoje, não receberam informações sobre as próteses implantadas neles.
Autoridades apuram práticas de irregularidades pela MedTrauma foram exportados do Acre para o Mato Grosso e Roraima, que aderiram a ata de preços da empresa.
“Uma ata de registro de preço não é ilegal. Agora, se essa ata ela, digamos assim, ela tem um vício, ela foi utilizada para superfaturar serviços e coisas desse tipo, ela acaba se disseminando para outros estados na medida que outros estados aderem a essa ata. Você no fundo, pode estar, e aí coloco ênfase, no pode, exportando um esquema ilegal de superfaturamento, eventualmente de corrupção para outros lugares”, diz Vinícius Marques de Carvalho, Ministro da Controladoria Geral da União.
A Sesacre afirmou ao Fantástico que a licitação para contratar a MedTrauma seguiu a legislação e que depois que a CGU apontou prática de superfaturamento, intensificou a fiscalização e não encontrou nada que desabone a empresa.
Investigações
O trabalho de investigação com relação aos serviços fornecidos pela MedTrauma tiveram o estopim no Acre, com o relatório emitido pela CGU que apontou, em agosto de 2023, um superfaturamento com estimativa de R$ 9 milhões. O parecer saiu em uma auditoria feita pela Controladoria.
“No Acre, que foi onde nosso trabalho se completou, execução de uma série de serviços sem previsão no contrato, superfaturamento na cobrança indevida de procedimentos e também superfaturamento na aquisição de materiais especiais, especialmente órteses e próteses”, disse o ministro da CGU.
A reportagem destacou ainda que o contrato com a MedTrauma foi assinado com a Sesacre em 1º de agosto de 2022. Agora, as autoridades apuram se essas práticas de irregularidades foram exportadas para Mato Grosso e Roraima, outros dois estados investigados.
Ao ser questionada pela CGU, a Sesacre disse que não estava usando verba federal para pagar o contrato da Medtrauma, mas o ministro discorda. “Há recursos federais, estaduais e municipais. Neste caso, não há sombra de dúvidas de que há recursos federais envolvidos”, complementa Carvalho.
Sebastião de Souza Sena fez uma cirurgia ortopédica mas relatório aponta que ele havia feito quatro procedimentos
Reprodução/Fantástico
No relatório da CGU, a história de Sebastião de Souza Sena, encarregado de obra, é exemplificada. Ele operou a coluna depois de um acidente de carro e realizou só uma cirurgia. Mas, a Medtrauma cobrou cinco procedimentos. A cirurgia foi apontada no relatório como exemplo de superfaturamento. Ele não sabe ainda o que foi implantado dentro dele. “Eles botaram duas hastes com 4 parafusos”, resumiu.
Como é a MedTrauma que fornece tudo, de funcionários a peças, o Tribunal de Contas da União (TCU) também emitiu um parecer ao relatório da CGU. Nisto, concluiu-se que a empresa teria interesse em fornecer a prótese que obtivesse o maior lucro, o que configuraria um “exercício mercantilista da medicina”.
“Em outras palavras, em vez de cobrarem somente o procedimento mais abrangente/principal, as empresas contratadas passaram a cobrar cada fase da cirurgia – fases integrantes do procedimento mais abrangente/principal – necessário à consecução da intervenção cirúrgica definitiva. Esse proceder resultou em nítido superdimensionamento dos serviços executados, uma vez que o faturamento de cada fase/passo cirúrgico deu a aparência de que mais cirurgias tenham sido realizadas, quando, na verdade, ocorreu o aumento devido à cobrança indevida de procedimentos embutidos em uma mesma cirurgia”, diz um trecho do relatório analisado, que destaca ainda que a terceirização de ortopedia se demonstrou ineficiente.
O que diz a defesa da MedTrauma
O Fantástico procurou o advogado da MedTrauma. Marcello Dias de Paula apresentou um argumento para justificar os valores de materiais considerados pela CGU muito acima até do preço de mercado. “A empresa não tem absolutamente nada a esconder e, pelo contrário, ela tem orgulho do serviço que presta”, afirma.
A equipe teve acesso a documentos que comprovavam superfaturamentos e cirurgias desnecessárias. Há também pacientes que até hoje, não receberam informações sobre as próteses implantadas neles.
Reprodução/TV Globo
O advogado defendeu o modelo de contrato que dá à MedTrauma poderes pra cuidar de todo o processo – da contratação de médicos ao fornecimento de próteses e órteses, as chamadas OPMES. Paula garantiu que qualquer paciente pode procurar a empresa com pedido de informações de sua prótese.
“A MedTrauma tem absoluta condição, caso o paciente entre em contato, de identificar a prótese ou a órtese que foi utilizada”.
O advogado não quis comentar sobre as denúncias feitas pelos pacientes ao Fantástico. Ele disse que precisaria de informações específicas sobre cada caso.
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