Meditação e silêncio: saiba como é o retiro no maior mosteiro zen budista da América Latina


Retiros duram 5 dias com programação intensa e reúnem pessoas até de outros países. Eles existem há 50 anos, desde a criação do mosteiro em Ibiraçu, no Norte do Espírito Santo. Danças meditacionais também fazem parte da rotina do retiro no Mosteiro Zen Budista no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
“Um momento de encontro consigo mesmo e com a natureza”, é assim que muitas pessoas definem a experiência de vivenciar um retiro no mosteiro zen budista em Ibiraçu, no Norte do Espírito Santo. O g1 passou um dia no retiro para acompanhar a rotina dos monges, orações, meditações e a programação que atrai pessoas até de fora do país. O local é o primeiro e maior mosteiro da América Latina e está completando 50 anos em agosto de 2024.
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A equipe de reportagem teve autorização para participar desse encontro espiritual e fez a imersão de um dia no retiro para produzir a segunda reportagem da série especial “Caminhos da Paz: 50 anos do Mosteiro Zen Budista”.
Normalmente, os retiros espirituais são de cinco dias, com meditação e atividades diversas realizadas pelos participantes. O retiro já chegou a contar com a participação de 110 pessoas ao mesmo tempo. Em sua última edição, realizada em julho deste ano, foram 83 pessoas reunidas no local.
Prática de meditação durante retiro em Mosteiro Zen Budista no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
Basicamente, a programação diária no mosteiro, durante os retiros, se resume a:
🌄Despertar;
🧘🏽‍♀️Meditações;
🙏🏻Cerimônias;
🧹Trabalho;
🍽️ Refeições;
📚 Atividades múltiplas como oficinas e danças meditacionais.
“No início do retiro, logo no primeiro dia, na chegada, após todos os participantes já estarem presentes, a gente faz algumas oficinas de alinhamento, de como utilizar o templo da oração, meditação, como é feita a meditação. É uma palestra explicativa, introdutória para as pessoas se conectarem com essa atmosfera”, explicou o vice abade do mosteiro, monge Kendo.
O que chama a atenção é o horário e a frequência com que algumas atividades são realizadas. A meditação, por exemplo, é a ação mais realizada durante o retiro. Em apenas um dia, são sete pausas para meditar, que duram 40 minutos, totalizando 280 minutos de meditação em apenas um dia. Tudo é feito com muitos detalhes e critérios estabelecidos e passados logo no início do retiro.
Começando o dia
Homem passa com sino para anunciar o despertar durante retiro no Mosteiro Zen Budista, no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
O dia começa cedo, às 4h20. Para que todos os participantes acordem, um homem passa correndo por todos os dormitórios tocando um sino. É o “Shinrei”, conhecido como despertar.
Antes mesmo do despertar, tambores e o maior sino do mosteiro já começam a ser tocados. Tudo para anunciar o início de mais um dia.
Depois, o silêncio do mosteiro dá lugar a sons de passos para a meditação e cerimônia da manhã. São duas horas sem conversa, apenas concentração. Depois de duas meditações de 40 minutos, o grupo segue para a “Idaten Fugin”, cerimônia realizada antes do café da manhã.
Participantes em oração da manhã durante retiro em Mosteiro Zen Budista no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
Após agradecerem, o silêncio é quebrado pelo bom dia apenas minutos antes da refeição.
Refeições
O momento das refeições é um dos mais importantes durante o retiro. O cardápio é ovolactovegetariano, ou seja, sem carne animal, mas que permite o consumo de produtos de origem animal, como laticínios e ovos.
Refeições só podem ser iniciadas depois de orações durante retiro no Mosteiro Zen Budista em Ibiraçu, Espírito Santo
Bernardo Bracony/TV Gazeta
Os participantes vão até a cozinha, se servem, e sentam em lugares pré-estabelecidos nas mesas. Após todos se servirem, uma oração é feita e uma pequena porção de arroz é tirada do prato e colocada em uma vasilha com água, passada para todos os integrantes da mesa.
Depois disso, é hora de comer, mas sem conversas. Quase sincronizados, os participantes terminam a refeição. E para não desperdiçar nada, todo o prato precisa ser limpo.
O processo é feito da seguinte forma: um repolho em conserva na mesa é colocado no prato. A pessoa sentada à sua frente serve chá e você utiliza o líquido para limpar o prato com o repolho. Depois de limpo, o líquido e o repolho são consumidos. Essa ação é feita em todas as refeições.
Aprendendo a meditar
Participantes fazem 7 momentos de meditação durante retiro no Mosteiro Zen Budista no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
A meditação, ou “Zazen” faz parte do dia a dia do mosteiro e é a principal atividade do retiro. Durante 5 dias, são aproximadamente 1.400 minutos de meditação.
“Nos sentamos em silêncio de frente para uma parede branca, trabalhando a postura corporal. Temos também o compromisso com essas métricas que a gente estabelece, utilizando o corpo como equipamento, como uma ferramenta e também com a imobilidade. Nós chamamos a meditação do termo não ação. A gente leva o corpo para um estado de quietude, de silêncio e esse corpo se encarrega de levar a mente para essa mesma condição. Sempre partindo da premissa de que corpo e mente são como duas engrenagens que trabalham em conjunto”, pontuou o monge Kendo.
Mas a atividade que, de início, pode parecer simples, tem várias técnicas.
Antes de entrar no templo da oração, e em qualquer outro, os sapatos, de preferência chinelos, são deixados do lado de fora, enfileirados;
Cada participante segue para um lugar pré-determinado no templo, onde fica uma almofada, que é afofada;
É necessário sentar na posição de lótus, com as pernas cruzadas, em cima da almofada, com a mão esquerda sobre a mão direita, repousando no colo, e polegares unidos;
Olhos semicerrados (nem abertos, nem fechados), de frente para uma parede branca;
Postura ereta, com o pescoço encaixado, e inspiração e expiração feitas com o abdômen;
Silêncio absoluto.
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Durante todo o período de meditação, um integrante anda pelo templo com um pedaço de madeira, ou “Kyosaku”. Um “golpe” é dado naqueles que pedem, para quem estiver sonolento, com dificuldade de se concentrar na meditação, ou sentido dores.
Não é só a meditação que é feita em silêncio. Das 21h até as 6h20 do dia seguinte, os participantes não podem conversar. E justamente essa parte foi o maior desafio para Flora Cal Cortes, terapeuta do Rio de Janeiro que foi participar pela primeira vez.
“O silêncio está sendo a maior dificuldade. Eu entendi que tá todo mundo muito excitado por conhecer pessoas de diferentes lugares do mundo, saber como está sendo para ela meditar de frente para uma parede branca. Às vezes, a gente quer trocar isso, mas também é compreensível de certa forma”, comentou Flora.
Mulher utiliza o “kyosaku” durante meditação em Mosteiro Zen Budista no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
Saúde mental
O retiro reúne pessoas de todo o Brasil e do mundo. Sandra Mattos é médica e ficou sabendo do retiro através de um grupo de yoga. Ela gostou tanto da experiência que veio do Recife pela terceira vez.
“Vim pela primeira vez em 2020 por curiosidade mesmo. É uma imersão muito especial, onde você realmente se afasta de tudo e tem um contato com pessoas diferentes, cultura diferente. Você se afasta de toda aquela rotina, aquele corre-corre. É um momento de muito aprendizado e cada vez é única, especial e melhor”, relatou a médica.
Maria Gonzalez veio do México para conhecer o Brasil pela primeira vez, a partir do retiro. Segundo ela, a meditação a ajudou a enfrentar a depressão.
“Me senti, uau, sem palavras, um mar de tranquilidade. É possível ter um entendimento do coração. Na meditação, senti uma liberação tremenda, cheguei ao meu lugar. Estou muito contente de ter vindo pela primeira vez, é longe, mas é um paraíso. Depois de cada retiro você sai como nova, como se não tivesse vivido nada e tem tudo ainda para descobrir. Se sente muito livre, uma alegria que não se compara com nada”, disse.
Os monges notaram que com o passar dos anos, o interesse pelos retiros aumentou. Para eles, essa procura pode representar uma vontade maior para cuidar da saúde mental.
“A gente sabe que depois da pandemia os casos de saúde mental aumentaram absurdamente e, por consequência, esse assunto acabou ganhando uma pauta mais relevante. Antigamente, meditação era considerada uma prática holística e não despertava tanto interesse para a ciência. Aos poucos, o tema ganhou importância e uma série de outros profissionais começaram a se importar com essa prática. Recebemos pessoas de diversos credos, diversas fés, que vêm para buscar alguma ferramenta, que possa ser introduzido dentro da sua própria prática espiritual”, afirmou o monge Kendo. ”
Oitenta e três pessoas participaram de retiro em julho no Mosteiro Zen Budista no Espírito Santo
Reprodução/TV Gazeta
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