
*Artigo escrito por Thalyta Botelho Monteiro, doutora e mestre em Educação, professora do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), campus Ibatiba
Como falar de algo que você é? Mas, ao mesmo tempo, como falar de algo que a maior parte das pessoas não sabe o que é? Este preambulo, mostra o quanto é difícil ser albina em uma sociedade que pouco conhece nossas necessidades.
É deste lugar que falo: mulher albina, mãe, esposa… Doutora! Doutora em Educação, mas também em superações. Ser uma doutora em superações, neste caso, não é mérito! Não mesmo!
O albinismo é uma condição genética que altera ou inibe a produção de melanina. Para
que isso ocorra, é necessária a informação genética do pai e da mãe. Uma criança albina
pode ser filha de pais com produção normal de melanina ou de pais albinos.
Isso significa que:
- 1. No caso de pais com pigmentação normal, estes precisam ter em seus genes a informação do albinismo.
- 2. Em caso de pais albinos, ambos sendo genes recessivos, a criança nascerá com a condição genética caso o tipo de albinismo dos progenitores seja o mesmo.
Albinismo é condição rara e atinge 21 mil no Brasil
O albinismo é uma condição rara que acomete certa de 21 mil pessoas no Brasil. Este dado é algo ainda aberto, visto que ainda não temos políticas públicas fundamentais para este grupo e nem um senso que esteja vinculado aos setores oficiais da saúde.
Esta estimativa leva em consideração um percentual de albinos no mundo, a partir de fontes de países europeus. Ou seja, temos cerca de 1 albino para cada 20 mil habitantes,
considerando o número de pessoas no mundo.
Esta condição genética faz com que a pele e olhos não tenham melanina, o chamado
oculocultâneo.
A pele possui um branco rosado e os olhos podem ser cinzas com variações de azul e verde ou vermelhos. Outro tipo de albinismo é o ocular, o que só acomete os olhos.
Tal disfunção genética, que provoca a falta de melanina, seja na pele ou olhos, faz com que a pessoa com albinismo não tenha proteção contra os raios UV, não podendo ficar exposta ao sol.
A pele fica sem proteção, ou seja, quanto mais melanina tem a pessoa —mais cor tem a pele — mais proteção em contato com o sol. Neste sentido, sem melanina, o contato com o sol gera queimaduras na área exposta.
São queimaduras muito semelhantes às de fogo. A depender do grau, a pele fica avermelhada podendo gerar bolhas e feridas. Além de ser dolorido, a recorrência pode ocasionar câncer de pele.
Protetor solar não é mero cosmético, para o albino ele é “remédio”. Roupa com fatoração
solar é “armadura” e óculos de sol é “visão além do alcance” sem alcance.
Existem cerca de 19 tipos de genes de albinismo, no entanto, conhecemos com maior profundidade dois tipos como citamos acima.
O oculocultâneo ou ocular são afetados pela ausência de melanina que gera proteção na mácula, onde é formado os detalhes e cores.
É comum que albinos tenham baixa visão, o que os colocam como pessoas com deficiência, pois enxergam menos que 30% do potencial visual de uma pessoa sem albinismo.
O uso dos óculos não faz com que enxergue melhor, mas gera um conforto visual, seja por óculos de sol, que diminuem a luminosidade por causa da fotofobia, ou por deixar a imagem mais nítida — como se fosse um parabrisa de carro: não se tem uma ampliação da imagem, a nitidez apenas melhora, ao limpar o vidro.
Baixa visão requer acompanhamento adequado
Você deve estar se perguntando: como uma pessoa albina enxerga? Não sabemos! Ela nunca enxergou as coisas como uma pessoa com visual normal ou com correção. Pessoas albinas nascem com baixa visão e caso não tenham um acompanhamento adequado — não existe tratamento — pode levar a cegueira.
As idas ao oftalmologista e dermatologista são necessárias para toda sociedade, mas para albinos é uma questão de sobrevivência. Ambos precisam compor visitas periódicas, com intervalos de seis em seis meses.
Mas esta não é uma realidade e sim uma expectativa. A maioria não tem condições financeiras e os sistemas de saúde pública não abarcam essa necessidade.
Enquanto mulher albina, nascida em região periférica com meu doutorado em superações, espero que a novíssima Lei Federal nº 15.140/2025, que estabelece a Política Nacional de Proteção às Pessoas com Albinismo, traga maior dignidade aos meus pares.
Que a sala de aula tenha menos iluminação, que a disciplina de educação física seja realizada no início da manhã ou final da tarde, mesmo que o espaço seja coberto, que tenhamos materiais com fontes ampliadas, que tenhamos acesso aos protetores solares ou pelo menos desconto na compra destes produtos (os óculos de sol ou de correção, possuem lentes especiais e de alto custo, sem contar as roupas de fatoração UV).
Ser albino não é difícil! Difícil é o preconceito
Ser albino não é difícil! Difícil é o preconceito e a falta de condições que carregamos com nossa condição genética.
Difícil é estar em um país tropical e termos que nos isolar por vulnerabilidade financeira que não permite adquirir nossos “remédios e armaduras” para enfrentar o cotidiano que para muitos é comum, como ir à praça, praia, andar de bicicleta ou ir trabalhar.
Essa rotina comum à sociedade é uma luta diária para nós, albinos.
Por vezes, em filmes como “As Bem Armadas”, “Matrix”, “Powder”, “Código Da Vinci” fomos comparados a seres do mal, violentos, estereotipados, exotéricos, nos melhores casos, não vistos como albinos e sim como descendentes de alemães, pomeranos, italianos, irlandeses… Fomos invisibilizados!

Desde 2015, o 13 de junho foi instaurado pela ONU como o Dia Internacional de Conscientização sobre o Albinismo e queremos ser vistos como sujeitos de direito e como
cidadãos. Hoje, 10 anos depois, queremos dar voz às nossas conquistas.
Enfrentamos medo do julgamento e a falta de informação
Enfrentamos mais que nossa condição genética. Enfrentamos medo do julgamento e a falta de informação. Que a educação seja realmente inclusiva e que tenhamos saúde visual, dermatológica e também psicológica para prosseguir.
Que o doutorado não seja em superações, pois não é mérito ter que superar as adversidades sociais, econômicas e culturais, que o doutorado seja naquilo que a gente quiser ser, com dignidade e qualidade.