
*Artigo escrito por Priscila Ceolin, arquiteta, urbanista e presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Espírito Santo.
Vivemos um tempo em que as máquinas desenham, calculam, sugerem e até encantam. A inteligência artificial chegou ao dia a dia e, com ela, uma pergunta se espalha: será que ainda precisamos do arquiteto?
Recentemente, fiz um teste. Compartilhei a planta de um apartamento, expliquei os desejos, os conflitos do espaço, o que precisava mudar para que a vida ali fluísse melhor.
A resposta da IA veio rápida, porém completamente genérica. Era como um print bonito do Pinterest: sem relação com o lugar, com a luz real, com as pessoas. Não era projeto de reforma. Era o mesmo que pesquisar no Google por uma planta qualquer.
Mas em outro momento, trabalhando no conceito de uma loja, compartilhei ideias, sentimentos, referências culturais.
A IA respondeu como aliada: ajudou a visualizar sensações, aprimorou textos, sugeriu formas. A diferença? Eu sou arquiteta. Sei onde quero chegar. E a IA, sozinha, ainda não sabe.
Onde mora o risco da inteligência artificial?
É aqui que mora o risco. Num vídeo recente, uma influenciadora dizia que faculdade virou coisa do passado — que, com IA, qualquer um pode fazer o trabalho de um arquiteto, nutricionista ou educador físico.
Ouvi também o áudio de um cliente dizendo que prefere pedir uma planta pronta para a IA, “mais barato e sai perfeito”.
Imagem bonita não resolve uma obra
Essa ideia é perigosa. Porque uma imagem bonita não resolve uma obra. E um algoritmo não entende o que um corpo precisa, o que uma família vive, o que um bairro suporta.
Sim, é verdade que nossa profissão está desvalorizada. Muitos colegas, pressionados por prazos e orçamentos baixos, entregam projetos apressados, genéricos, parecidos com os da internet. E assim, a comparação com a IA começa a fazer sentido.
Mas quando somos respeitados e bem remunerados, a diferença salta aos olhos: projetamos com escuta, com técnica, com cuidado, com empatia. Nenhum botão “gerar imagem” faz isso.
A IA pode ser uma aliada poderosa. Mas não substitui a formação, a leitura de contexto, a experiência de obra, o tato para imprevistos, a ética de um profissional.
Inteligência artificial precisa de curadores
A IA precisa de curadores, e curador não é qualquer um. É quem estudou, vivenciou, errou, aprendeu.
Portanto, que a inteligência artificial seja bem-vinda. Mas que não nos esqueçamos: sem inteligência humana, não há arquitetura. Só aparência frívola.
