Estou escutando mal, mas tenho vergonha do aparelho auditivo

Perda auditiva
(Reprodução: Freepik)

A perda auditiva é uma condição mais comum do que se imagina. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 1,5 bilhão de pessoas em todo o mundo vivem com algum grau de deficiência auditiva.

No entanto, apesar da prevalência, muitas delas sofrem em silêncio. Escutar mal pode parecer um problema simples à primeira vista, mas seus impactos vão muito além da dificuldade de ouvir sons.

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Quando somamos a isso a vergonha de usar um aparelho auditivo, criamos uma barreira social, emocional e psicológica que impede milhares de pessoas de buscar ajuda e melhorar sua qualidade de vida.

Causas da perda auditiva

A perda auditiva pode ter diferentes causas:

  • O envelhecimento natural;
  • Exposição prolongada a ruídos altos;
  • Infecções;
  • Doenças genéticas;
  • Traumas;
  • Uso de certos medicamentos.

Seja qual for a origem, escutar mal interfere diretamente na comunicação, na convivência social e até na segurança do indivíduo.

Desafios de quem ouve mal

Pessoa excluída
(Foto: Freepik)

Quem ouve mal, muitas vezes, começa a evitar conversas em grupo, tem dificuldade para entender diálogos na televisão, sente-se inseguro ao atravessar a rua por não perceber sons do ambiente, e até perde oportunidades profissionais.

Além disso, essa limitação pode levar ao isolamento social, ao declínio cognitivo precoce e ao desenvolvimento de quadros de depressão e ansiedade.

Apesar disso, muitas pessoas preferem esconder sua condição auditiva a recorrer ao uso de um aparelho auditivo. A vergonha de usar esse dispositivo é uma barreira real e poderosa, alimentada por estigmas sociais, vaidade, desinformação e medo do julgamento.

Preconceito com o aparelho auditivo

O aparelho auditivo, para muitos, ainda é visto como um símbolo de envelhecimento ou incapacidade. Isso gera resistência, principalmente entre adultos mais jovens ou idosos ativos que não querem parecer “velhos” ou “doentes”. Em uma sociedade que valoriza a aparência e o desempenho, admitir uma limitação, mesmo que comum, pode ser vivido como sinal de fraqueza.

Esse preconceito, muitas vezes, é alimentado por falta de representatividade positiva. Diferente dos óculos, que se tornaram acessórios de moda e são aceitos socialmente, o aparelho auditivo ainda é pouco mostrado na mídia, raramente visto em personagens de filmes ou em campanhas publicitárias de forma natural ou atrativa. Isso reforça a ideia de que ele deve ser disfarçado ou escondido — um acessório “feio” ou “estranho”.

Além disso, muitos têm medo de chamar a atenção ou de parecerem diferentes. Em vez de verem o aparelho como um instrumento de autonomia, veem como um sinal de fragilidade. Isso leva muitos a preferirem conviver com a dificuldade auditiva a aceitar o tratamento disponível.

Consequências de não usar o aparelho auditivo

Negar o uso de aparelhos auditivos por vergonha tem consequências significativas. Em primeiro lugar, priva o indivíduo de uma vida mais plena e ativa. A audição é um dos principais canais de comunicação e percepção do mundo. Sem ela, é como viver com parte dos sentidos comprometidos.

Em segundo lugar, estudos mostram que a perda auditiva não tratada está associada ao declínio cognitivo mais rápido, ao aumento do risco de demência e à depressão. A falta de estímulo auditivo constante pode levar o cérebro a perder agilidade no processamento de informações, afetando a memória e outras funções cognitivas.

Socialmente, a pessoa com perda auditiva que não usa aparelho tende a se isolar. Conversas tornam-se cansativas, frustrantes e constrangedoras. Há quem finja entender para evitar parecer “burro” ou “distraído”, o que só aumenta o desconforto e a sensação de exclusão.

Como superar a vergonha

Superar a vergonha de usar aparelho auditivo começa com a conscientização. Assim como utilizamos óculos para corrigir a visão, o aparelho auditivo é uma ferramenta para restaurar a audição — e não há nada de errado ou vergonhoso nisso. O verdadeiro problema não é usar o aparelho, mas negar-se a ouvir bem.

Nos últimos anos, os aparelhos auditivos evoluíram significativamente. Eles estão cada vez mais discretos, modernos, com melhor qualidade de som, conectividade, controle via aplicativo e design mais elegante. Muitos modelos são praticamente invisíveis quando usados, o que ajuda a reduzir o estigma visual. Mas, mais importante que a estética é o ganho em liberdade, autonomia e bem-estar que eles proporcionam.

A importância do apoio de profissionais

É fundamental também contar com o apoio de profissionais da saúde auditiva, como otorrinolaringologistas e fonoaudiólogos, que podem orientar a escolha do aparelho ideal e acompanhar a programação e adaptação. O processo exige paciência, pois o cérebro precisa reaprender a processar sons. No entanto, com orientação adequada e perseverança, os benefícios superam qualquer desconforto inicial.

A aceitação do aparelho auditivo também depende do ambiente ao redor. Familiares, amigos e colegas de trabalho devem ser agentes de apoio e não de julgamento. Comentários maldosos, risadas ou críticas podem reforçar o sentimento de vergonha e afastar ainda mais a pessoa do tratamento.

Promover conversas abertas sobre saúde auditiva, mostrar exemplos positivos e normalizar o uso de aparelhos são atitudes simples, mas poderosas. Assim como lutamos para acabar com preconceitos sobre deficiências visuais, físicas e mentais, precisamos ampliar nossa visão sobre a surdez e o uso de dispositivos auditivos.

Escutar mal é um desafio real, que afeta a qualidade de vida, a saúde emocional e a conexão com o mundo. Ter vergonha de usar aparelho auditivo é compreensível diante de um contexto social que ainda carrega estigmas.

No entanto, é necessário transformar essa visão. Usar um aparelho auditivo é um ato de coragem, de autocuidado e de valorização da vida. Superar a vergonha é abrir os ouvidos novamente para as conversas, os sons, as risadas — e para tudo aquilo que nos faz humanos.

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