30ª Marcha do Silêncio mobiliza milhares no Uruguai: onde estão os desaparecidos da ditadura?

Como acontece todo dia 20 de maio, milhares de uruguaios voltaram às ruas de Montevidéu nesta quarta-feira para participar da 30ª Marcha do Silêncio, uma manifestação que homenageia os desaparecidos durante a ditadura civil-militar no Uruguai (1973–1985).

Sem cantos nem bandeiras partidárias, a mobilização ocorreu em absoluto silêncio, em memória das vítimas do terrorismo de Estado e em defesa da verdade e da justiça para os 197 uruguaios desaparecidos durante o regime autoritário. O único momento em que o silêncio foi quebrado foi quando os nomes dos desaparecidos foram anunciados, um a um, por um alto-falante, seguidos pelo grito coletivo: “Presente!”

Como é tradição, a marcha teve início na esplanada da Universidade da República e avançou pela avenida 18 de Julio até a praça da Liberdade. Sob o lema “30 vezes Nunca Mais: saibam cumprir. Onde estão?”, à frente da caminhada seguiam os familiares das vítimas, carregando faixas com os rostos de seus entes queridos, assassinados ou desaparecidos pela repressão da ditadura.

A luta por verdade, memória e justiça

A primeira Marcha do Silêncio ocorreu em 1996, organizada por mães e familiares de detidos e desaparecidos. A data foi escolhida em homenagem aos militantes Zelmar Michelini, Héctor Gutiérrez Ruiz, William Whitelaw e Rosario Barredo, assassinados em 20 de maio de 1976, em Buenos Aires, Argentina. Os assassinatos fizeram parte da Operação Condor — nome dado à coordenação repressiva entre as ditaduras sul-americanas durante as décadas de 1970 e 1980.

Por meio de uma campanha audiovisual nas redes sociais, diferentes setores da juventude participaram ativamente da organização e divulgação da 30ª Marcha do Silêncio. Em um dos vídeos, é retomada a pergunta histórica de Luisa Cuesta, mãe de Nebio Melo Cuesta: “Onde estão?”. Luisa faleceu em 2018 sem obter respostas sobre o paradeiro de seu filho.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o jornalista uruguaio Nicolás Centurión destacou que um número cada vez maior de jovens tem aderido às mobilizações do 20 de maio. Ao mesmo tempo, ressaltou que o movimento de direitos humanos no Uruguai tem conquistado avanços significativos em termos simbólicos e sociais.

Como exemplo, ele mencionou o que ocorreu no último fim de semana, quando os jogadores do Nacional — um dos principais times de futebol do país — entraram em campo usando camisetas com o slogan “Todos somos Familiares”. Pouco depois, os jogadores do Peñarol — o outro grande clube uruguaio — manifestaram seu apoio à iniciativa pelas redes sociais.

“Essa marcha foi uma das mais concorridas dos últimos anos”, disse Centurión, destacando que a data tem adquirido um valor simbólico cada vez maior no país.

No entanto, ele lamentou o pouco avanço em termos judiciais, mesmo durante os governos progressistas. “Alguns membros das Forças Armadas foram julgados, mas muito poucos. A verdade é que o Uruguai tem uma grande dívida pendente com sua democracia. Continuamos vivendo sob uma democracia tutelada, na qual, desde os tempos do terrorismo de Estado, se tenta esconder o paradeiro dos companheiros desaparecidos.”

Apesar disso, ele se mantém otimista. Reconhece que muitos repressores continuam morrendo impunes com o passar do tempo, mas celebra o fato de que, a cada ano, novas gerações se juntam à luta por memória, verdade e justiça.

“É muito emocionante ver crianças, adolescentes e jovens participando da marcha. Caminha-se em absoluto silêncio e, muitas vezes, é possível ver esses jovens perguntando a seus familiares ou amigos o que aconteceu durante a ditadura. De certa forma, são eles que herdarão essas bandeiras. Enquanto isso, do outro lado, esses militares covardes seguem firmes em seu pacto de silêncio e impunidade. A juventude não está do lado do esquecimento nem da impunidade”, concluiu.

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