André Lajst: quem é o analista político crítico à diplomacia do brasil

Andre Lajst é presidente da StandWithUs BrasilDivulgação

“Minha maior ambição é a paz. Sonho com o dia em que haverá paz entre palestinos e israelenses e acredito que a educação é um dos caminhos para que isso seja possível.” Essa foi a resposta dada por André Lajst ao ser questionado sobre o que está por trás de seu trabalho como presidente-executivo da StandWithUs Brasil, a maior organização não governamental do país dedicada à educação sobre Israel.

Aos 38 anos, André Lajst é cientista político especializado em Oriente Médio. Somadas, suas redes sociais têm quase meio milhão de seguidores. Desde os atentados terroristas do Hamas em 7 de outubro no sul de Israel, que resultou na morte de cerca de 1.200 pessoas e no sequestro de outras 240, ele tem feito uma série de aparições nos principais progamas de TV e escrito para os maiores jornais brasileiros, comentando sobre os desdobramentos da guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza. Segundo dados do Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo grupo terrorista, mais de 20 mil pessoas já morreram no conflito. Esses números, contudo, não podem ser verificados de modo independente e não fazem distinção entre civis e combatentes. 

A guerra em andamento deixou o trabalho de André em evidência, o que não tem agradado a todos, principalmente após os seus recentes posicionamentos críticos à diplomacia brasileira. Há aqueles que o acusam de ser parcial a favor de Israel e alguns que vão ainda mais longe, questionando suas credenciais acadêmicas e até mesmo acusando-o de ser um agente dos interesses israelenses no Brasil. Tal acusação, segundo ele, além de falsa, pode ser considerada antissemita, por reforçar o mito do judeu cosmopolita, que não é leal a nenhum país, tropo bastante utilizado pelos nazistas.

Alguns ativistas da causa palestina, porém, fazem oposição aberta antes mesmo do início da atual guerra contra o Hamas. Ano passado, manifestantes tentaram impedir que ele realizasse uma palestra na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), em Manaus, na qual falaria sobre empreendedorismo em Israel. Apesar dos protestos e até ameaças, a palestra foi realizada mesmo que, ao fim, ele tenha precisado deixar o local escoltado por policiais federais. 

Ainda assim, do lado palestino também há aqueles que, mesmo com as discordâncias, veêm em André um interlocutor legítimo. Seu debate com o professor de Direito da FGV Salem Nasser, no podcast Inteligência LTDA, é prova disso. O episódio tem cerca de quatro horas e já foi visto por quase um milhão de pessoas, desde que foi ao ar, seis meses atrás.

Dias após os atentados do 7 de outubro, o presidente-executivo da StandWithUs Brasil também aceitou debater, no mesmo podcast, com Thiago Ávila, ativista político pró-Palestina, alcançando cerca de 1.6 milhão de visualizações em uma conversa de mais de três horas e meia de duração. 

Questionado sobre esses debates e o critério que utiliza para decidir com quem dialogar, André explica: “Para que possa haver paz genuína é necessário que haja diálogo. Por isso, me disponho a conversar com todos aqueles que reconhecem a dignidade e o direito à autodeterminação tanto de palestinos quanto de israelenses.” Porém, é enfático: “Jamais debatarei com quem nega esses príncipios, justifica o terrorismo ou expressa opiniões racistas, sejam antissemitas, islamofóbicas ou preconceituosas com os árabes”. Fazer isso, segundo ele, seria legitimar esse tipo de discurso de ódio e se igualar a esse tipo de pessoa. 

Holoscauto e antissemitismo

Nascido em São Paulo, em 1986, André tem apenas um irmão, Diego,  três anos mais velho. Sua mãe, Diana Elfman, é argentina e o pai, Jayro Lajst,  brasileiro. Ambos são judeus e se conheceram em Israel, tendo histórias familiares marcadas diretamente pelo antissemitismo. Seus bisavós maternos mudaram-se para a Argentina no início do século XX, em virtude da perseguição antijudaica na Polônia e na Rússia. Do lado paterno, a questão é ainda mais sensível. O avô, Chaim Lajst, foi um sobrevivente do Holocausto. Ele foi enviado a Sobibor, na Polônia, e só escapou do campo de extermínio porque participou de uma rebelião, na qual matou com uma facada um guarda da SS. Esse episódio é conhecido na história da Segunda Guerra Mundial. Cerca de 300 prisioneiros fugiram, mas apenas 55 sobreviveram. Segundo André, esse foi “um exemplo de verdadeira resistência”, e acrescenta: “Meu pai não teve avós paternos. Todos eles foram mortos no Holocausto”.

Tudo isso influenciou diretamente na decisão de, aos 20 anos, em 2006, ele se mudar para Israel, onde permaneceu até os 29, voltando em 2015 para iniciar o sonho de educar os brasileiros sobre Israel, especialmente sobre o conflito israelo-palestino. Foi só três anos depois, em 2018, que ajudou a estabelecer a filial brasileira da StandWithUs Brasil, organização com sedes em Jerusalém e Los Angeles. O escritório nacional, que começou numa sala emprestada no Bairro Higienópolis e três funcionários em horário integral – incluindo o próprio André –, hoje conta com 30 funcionários. Quanto ao financiamento da organização, André frisa que não é admitida nenhuma verba proveniente de governos, seja de Israel, seja de outro país. “Todas as doações são de pessoas físicas e para preservar a privacidade delas, preferimos não revelar seus nomes, o que é totalmente legal e, posso até dizer, praxe.”

“A StandWithUs Brasil tem funcionários moderados que se identificam com todo o espectro político, judeus e não judeus, de diversos estados brasileiros. Em comum entre eles há o fato de acreditarem na legitimidade da existência de Israel como estado judeu e democrático”, explica. A organização possui uma série de departamentos focados no combate ao antissemitismo e o discurso de ódio nas sociedade brasileira. Dentre eles, um departamento de educação que realiza palestras em universidades públicas e privadas pelo país e outro focado no Holocausto, que leva sobreviventes para falar em escolas e promove ações culturais a fim de preservar a memória do genocídio de seis milhões de judeus.

Durante o tempo em que morou em Israel, André aprendeu hebraico e, antes de ir para a faculdade, serviu no exército do país, atividade obrigatória para todos os cidadãos israelenses. Esse, inclusive, é um dos pontos mais polêmicos de sua biografia e que muitos críticos apontam numa tentativa de desqualificá-lo, acusando-o de ser um agente dos interesses israelenses no Brasil. Questionado sobre o assunto, ele responde com naturalidade: “Sou um cidadão brasileiro, pois foi aqui que nasci e cresci, e isso é uma parte integral e importante de minha identidade, assim como ser judeu o é. Porém, como vários outros compatriotas, também sou descendente de um povo que encontrou em nosso país um lugar de refúgio para as perseguições que sofreu em outros lugares. Tenho também cidadania polonesa e israelense em virtude dessa história da família, da qual tenho muito orgulho.”

Lajst acrescenta: “Nesse sentido, essas outras cidadanias acabam sendo um atestado ainda maior da minha brasilidade. O Brasil é um país multicultural. Há mais libaneses aqui do que no próprio Líbano, por exemplo. Nem por isso esses brasileiros de ascendência libanesa têm a sua lealdade ao nosso país posta em xeque. Ressaltar que também tenho cidadania israelense para me acusar de ser mais leal a outro país não passa de antissemitismo. É o antigo libelo comum na Alemanha nazista, segundo o qual, os judeus são traidores da pátria.”

Exército israelense

Em relação ao serviço nas Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês), André afirma não ter vergonha desse episódio. Muito pelo contrário, mostra-se orgulhoso de ter servido no que ele descreve como um dos “exércitos mais éticos do mundo” e de poder ter ajudado a proteger a pátria que abrigou seu avô nos últimos dias de vida: “Meu avô faleceu em 2005 e está enterrado em Israel. Não teve a oportunidade de ver o seu neto vestindo o uniforme do exército Israelense. Tenho certeza de que ficou orgulhoso lá de cima”, acrescenta. 

Sobre as atividades que desempenhou nas IDF, contudo, não oferece detalhes. Afirma que serviu no setor de inteligência da força aérea e que, por questões de segurança, não pode falar muito a respeito. Porém, garante que as experiências que teve nesse período o mostraram não apenas a importância da existência do Estado judeu, mas também o seu comprometimento com a paz e a segurança tanto dos cidadãos israelenses, quanto dos palestinos. Nesse sentido, destaca, em especial, o conflito de Israel contra o Hamas, em 2012, em que alega ter visto com os próprios olhos foguetes disparados pelo grupo terrorista explodindo em casas de civis dentro do próprio enclave palestino, bem como ações das IDF para evitar o maior número possível de baixas civis. 

Antes do tempo no exército, ele estudou na Reichman University, na época chamada de IDC Herzlyia. Entre 2007 e 2010, fez bacharelado em Diplomacia, Governo e Estratégias, especializando-se em Contraterrorismo, Segurança Nacional e Oriente Médio. Em 2013, ainda na instituição, seguiu em um mestrado na mesma área de especialização, tornando-se mestre em 2015, ano em que retornou ao Brasil. Segundo André, o que motivou a volta ao país de origem foi perceber a necessidade de centros de estudos e think tanks especializados em Oriente Médio. Além da inexistência de organizações desse tipo, ele constatou o predomínio de um grande viés anti-Israel na maioria das universidades e acadêmicos brasileiros que pesquisavam sobre o tema.

A fim de fomentar um maior debate no país, trazendo uma perspectiva diferente e buscando difundir o interesse pela região, ele fundou a StandWithUs Brasil e, poucos anos depois, em 2020, ingressou no Programa de Doutorado em Ciências Sociais e Jurídicas da Universidade de Córdoba, na Espanha. Como parte dos requisitos para a obtenção do título de doutor, André tem se dedicado a pensar sobre os aspectos psicológicos do conflito palestino-israelense e como isso afeta os esforços para a construção da paz.

Currículo Lattes

Recentemente, a formação acadêmica do cientista político foi motivo de especulação, uma vez que ele não tinha o seu currículo cadastrado na plataforma do governo brasileiro, Lattes. Na época, André publicou um vídeo em suas redes sociais explicando que, uma vez que sua formação acadêmica inteira havia sido fora do Brasil, ele nunca havia tido a necessidade de fazer uso da plataforma, mas que estava providenciando isso. Ainda assim, mostrou cópias de seus diplomas e se dispôs a enviar seu currículo a quem desejasse ver. Tivemos acesso ao documento e também entramos em contato com as instituições de ensino onde ele afirma ter estudado e verificamos que, de fato, seus títulos são verdadeiros.

Perguntado sobre os planos para 2024, André afirmou que a única certeza é de que terá bastante trabalho, mas que ainda não conseguiu pensar em muita coisa e não conseguirá até que todos os cerca de 130 reféns que permanecem no cativeiro – inclusive um brasileiro – sejam libertos e o Hamas destruído. Segundo ele, só assim terá fim a guerra na Faixa de Gaza e a paz na região se tornará algo mais concreto, uma vez que para que todas as tensões cessem de vez é preciso que todos os grupos terroristas sejam derrotados e a violência abandonada por completo.

O cientista político ressalta que seu calendário ainda está parado no 7 de outubro e ressalta que a data entrará para a história como o maior massacre de judeus desde o Holocausto. Do ponto de vista profissional, porém, ele pretende finalizar o doutorado e, em seguida, ingressar em algum programa de pós-doutorado no exterior.  

Remetendo à pergunta que inicia esta matéria, André declara que sonha em se casar e constituir uma família. Deseja se tornar pai e espera que um dia seus filhos possam ver a paz entre palestinos e israelenses. Essa seria uma de suas maiores ambições e o que o motiva diariamente, sobretudo nos últimos meses, diante de todo o estresse de cobrir os eventos políticos do Oriente Médio.

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