O poder global estadunidense posto em cheque no segundo governo Trump

Por Rodrigo Vinícius Lima

O poder global é a capacidade que um Estado ou ator internacional possui de influenciar decisões, comportamentos e estruturas em escala mundial. Trata-se de um conceito dinâmico que ultrapassa a força militar e abrange dimensões econômicas, políticas, tecnológicas e culturais. Um país com poder global não apenas se impõe pela coerção (uma visão bem hobbesiana), mas também é capaz de moldar consensos, estabelecer padrões e definir os rumos de questões internacionais relevantes.

A globalização ampliou a complexidade dessa influência, ao mesmo tempo que intensificou a interdependência entre nações. Assim, o poder global não é mais exercido apenas pela supremacia direta, mas também pela capacidade de liderança simbólica, pela presença em redes transnacionais e pela articulação diplomática em espaços multilaterais.

Nesse contexto, os Estados Unidos consolidaram-se como a principal potência global do século 20, especialmente após a Segunda Guerra Mundial, com a assinatura do famoso acordo de Bretton Woods, que redesenhou o cenário capitalista e o comércio internacional (padrão dólar-ouro). Sua influência estendeu-se por meio de alianças militares, instituições financeiras internacionais, inovação tecnológica e, sobretudo, pelo poder brando, que exportou valores culturais, políticos e ideológicos.

Contudo, nas primeiras décadas do século 21, o cenário geopolítico tornou-se mais fluido, com o surgimento de novas potências e a contestação crescente da ordem liberal internacional. O poder global, portanto, passou a ser disputado em múltiplas frentes, exigindo dos Estados não apenas recursos, mas também capacidade de articulação, legitimidade internacional e coerência em suas políticas externas.

A partir da posse de Donald Trump em seu segundo mandato presidencial, iniciado em janeiro de 2025, percebemos que o governo não teve uma lua de mel digna e, logo, o poder global dos Estados Unidos passou a sofrer impactos significativos.

A continuidade da agenda “America First” e o famoso “dia da libertação” (uma enxurrada de tarifas contra uma grande parcela de países), com o objetivo de melhorar a balança comercial dos Estados Unidos, tem levado a uma postura mais isolacionista, com o país se afastando de organismos multilaterais e de acordos internacionais.

Essa retração da presença diplomática norte-americana tem gerado um enfraquecimento da influência tradicional dos EUA e tem, em primeiro lugar, colocado em xeque se aquela teoria da estabilidade hegemônica da década de 1970 é passível de críticas; e em segundo lugar, o protagonismo chinês nos demonstra que o poder global não necessita de um poder supranacional como condição de manter a ordem mundial estável.

No campo econômico, a adoção de medidas protecionistas e a tentativa de renegociar acordos sob termos unilaterais provocaram tensões com aliados históricos e minaram a previsibilidade das relações comerciais, algo que para a economia e para o tal mercado, custa muito caro. Isso contribui para um ambiente de incerteza global, afetando até as margens de lucro das empresas, ao mesmo tempo em que estimula outros blocos regionais a desenvolverem alternativas à liderança norte-americana.

O reposicionamento do país como uma potência mais voltada aos seus próprios interesses imediatos, em detrimento da estabilidade da ordem internacional, pode comprometer sua influência de longo prazo.

O segundo governo de Donald Trump está alterando significativamente o papel dos Estados Unidos no cenário global, típico de um imperialismo autoritário. Ao optar por uma política externa de retração e confronto, em vez de cooperação e liderança, o país corre o risco de perder seu status de potência central na governança mundial.

A manutenção do poder global exige mais do que força militar ou tamanho econômico – exige também credibilidade, coerência e responsabilidade no exercício da influência. Ao enfraquecer esses pilares, os Estados Unidos podem acelerar o processo de redistribuição do poder internacional e abrir caminho para uma nova configuração geopolítica em que sua centralidade não será mais garantida.

*Rodrigo Vinícius Lima é historiador ,cientista político e professor.

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