Número de mortes por policiais aumentou 30,42% em Pernambuco em 2023


Polícia matou em média uma pessoa a cada três dias no estado no ano passado. Levantamento foi feito pelo g1, com base em dados da Secretaria de Defesa Social, que mudou a forma de registrar os casos. Policiais durante operação na comunidade do Detran, na Iputinga, Zona Oeste do Recife
Reprodução/WhatsApp
De janeiro a dezembro de 2023, 120 pessoas foram mortas por policiais e agentes de segurança pública em Pernambuco. Em média, a polícia matou uma pessoa a cada três dias no estado. O número é 30,42% superior ao registrado no ano de 2022, quando os agentes de segurança pública foram responsáveis por 92 mortes em Pernambuco.
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O levantamento foi feito pelo g1 com base em dados da Secretaria de Defesa Social (SDS), que mudou desde o ano passado a fórmula de cálculo desse tipo de crime, separando as mortes por agentes do estado dos demais casos de homicídio (entenda mais abaixo).
Esse é o pior resultado para esse indicador desde 2018, quando 115 pessoas foram mortas por agentes de segurança. Questionado sobre o assunto, o secretário de Defesa Social, Alessandro Carvalho, disse que não admite “excesso algum” por parte das polícias (veja resposta abaixo).
As mortes por policiais em 2023 ocorreram em 42 cidades do estado. Mais de um terço dos casos, porém, estão concentrados em Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes.
Confira a lista abaixo:
Abreu e Lima: 4
Afogados da Ingazeira: 1
Araçoiaba: 2
Barreiros: 3
Bezerros: 1
Bom Jardim: 1
Cabo de Santo Agostinho: 1
Camaragibe: 2
Caruaru: 4
Catende: 1
Escada: 3
Garanhuns: 2
Goiana: 2
Gravatá: 3
Ibimirim: 2
Igarassu: 1
Ipojuca: 6
Ilha de Itamaracá: 1
Jaboatão dos Guararapes: 10
Macaparana: 1
Moreno: 1
Nazaré da Mata: 1
Olinda: 14
Orocó: 1
Parnamirim: 2
Paulista: 3
Pedra: 1
Pesqueira: 1
Petrolina: 3
Pombos: 1
Recife: 20
Ribeirão: 8
Salgueiro: 2
Santa Filomena: 1
Santa Maria da Boa Vista: 1
São José da Coroa Grande: 1
São Lourenço da Mata: 2
Surubim: 1
Taquaritinga do Norte: 1
Toritama: 1
Tracunhaém: 2
Vitória de Santo Antão: 1
O caso de maior repercussão foi o de Alex da Silva Barbosa, de 33 anos. Um dia após trocar tiros com a polícia, resultando na morte de dois policiais militares, Alex foi encontrado no bairro de Tabatinga, em Camaragibe, e morto com tiros na cabeça no tórax.
Antes, cinco parentes de Alex haviam sido assassinados por homens encapuzados em dois endereços diferentes. A polícia investiga todas as mortes do caso.
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Dos mortos, 118 eram do sexo masculino e duas eram mulheres. Dois terços das vítimas tinham menos de 30 anos (82 pessoas) e oito eram menores de 18 anos.
As estatísticas mostram que as mortes por agentes do estado foram concentradas na Região Metropolitana do Recife, com 55,84% dos casos – sendo 16,67% deles apenas na capital e os outros 39,17%, nos demais municípios do Grande Recife.
Confira o número de casos por região do estado:
Região Metropolitana (menos o Recife) – 47 (39,17%)
Zona da Mata – 24 (20%)
Recife – 20 (16,67%)
Agreste – 16 (13,33%)
Sertão – 13 (10,83%)
Um estudo da Rede de Observatórios de Segurança, divulgado no final do ano passado, mostrou que todos os mortos pela polícia no Recife em 2022 eram pessoas negras, assim como observado em 2021. Em Pernambuco, a proporção de negros entre as vítimas de operações policiais foi de 89,66%, no mesmo período.
Mudança no registro dos dados
Até 2022, Pernambuco tinha apenas um indicador de mortes violentas, o de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI), no qual eram registrados todos os tipos de homicídio.
Desde o ano passado, com a posse da governadora Raquel Lyra (PSDB), os casos de morte por intervenção de agente do estado foram retirados dos números do CVLI.
Atualmente, são contados como CVLI:
Homicídio doloso;
Latrocínio;
Feminicídio;
Lesão corporal seguida de morte.
Em contrapartida, o governo criou um novo indicador, as Mortes Violentas Intencionais (MVI). Nele, são contabilizados todos os CVLIs e as mortes por intervenção de agente do estado.
Durante o ano de 2023, Pernambuco registrou 3.633 casos de MVI e 3.513, de CVLI. A diferença entre eles são as 120 mortes provocadas por policiais.
Para a coordenadora estadual do Observatório de Segurança e do Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop), Edna Jatobá, a mudança é positiva. Segundo a cientista social, o modelo anterior, que incluía todas as mortes no indicador CVLI, era menos transparente.
“Para a gente é um ganho significativo muito importante porque antes, dentro do CVLI, a gente não conseguia observar a quantidade de morte em decorrência da atividade policial por mês. […] Para a gente conseguir esse dado antes, a gente precisava recorrer aos boletins trimestrais de análise criminal”, explicou a pesquisadora.
Edna Jatobá também apontou que as mortes decorrentes de intervenção policial possuem excludente de ilicitude, que é quando se considera a legítima defesa do agente de segurança. Dessa forma, as mortes não se classificariam como crimes.
“Mesmo que alguma parte [das mortes] seja praticada de maneira dolosa, que seja um homicídio mesmo, isso quem vai dizer é um inquérito policial e depois um processo na justiça. O excludente de ilicitude, o termo fala por si só, ele exclui a possibilidade de ilícito, de crime”, explicou Edna Jatobá.
Troca de comando e posição do governo
No dia 22 de janeiro, a governadora Raquel Lyra (PSDB) substituiu os comandantes das polícias Civil e Militar de Pernambuco. A mudança aconteceu dois dias após confrontos entre torcidas organizadas do Sport e do Santa Cruz no Grande Recife, que deixaram um policial militar e dois torcedores baleados.
O coronel Ivanildo Cesar Torres de Medeiros assumiu o comando geral da Polícia Militar no lugar do coronel Tibério César dos Santos. Já o delegado Renato Márcio Rocha Leite passou a chefiar a Polícia Civil, que era ocupada pela delegada Simone Aguiar.
O g1 procurou a Secretaria de Defesa Social (SDS) desde o dia 17 de dezembro de 2023 para falar sobre os dados referentes às mortes provocadas por agentes de segurança pública. No entanto, não obteve retorno.
Na quinta-feira (25), em entrevista coletiva durante a solenidade de transmissão de posse da chefia da Polícia Civil, o secretário de Defesa Social, Alessandro Carvalho, foi questionado pelo g1 sobre o assunto e disse que Pernambuco é um dos estados com a menor letalidade por violência policial no país e que não admite “excesso algum”.
“Se formos comparar os números consolidados pela Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública), nós estamos da 20ª posição para baixo. […] Qualquer excesso será apurado e as providências serão tomadas. Nós tivemos um caso que chamou muita atenção logo que cheguei. A investigação foi feita e a resposta foi dada com prisão”, afirmou o secretário, referindo-se ao caso das mortes em Camaragibe, que resultou na prisão de policiais militares em dezembro.
Perguntado se os recentes episódios de violência policial influenciaram na decisão de trocar o comando das polícias Civil e Militar, Carvalho disse que não. “Eu não posso atribuir isso ao comandante. Foram ações de uma pequena fração do efetivo que estava na rua, que decidiu por conta própria e vai responder por seus atos”, declarou o gestor.
No mesmo evento, o novo chefe da Polícia Civil, delegado Renato Márcio Rocha Leite, afirmou que o foco inicial da gestão é a redução nos índices de Mortes Violentas Intencionais (MVIs).
“Esse é um número que a gente vai combater com muita veemência. Esperamos reduzi-los, chegar a atingir a meta que está sendo prevista pelo Juntos [pela Segurança] e, ao final do ano, conseguir bater um resultado menor do que vem ocorrendo nos anos anteriores”, falou o delegado.
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