Drogas: uma epidemia silenciosa

Senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) no Plenário do Senado Federal durante sessão de debates temáticos destinada a discutir a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoalFoto: Roque de Sá/Agência Senado

Por que as pessoas começam a usar drogas? Essa é uma questão com respostas variadas, mas com um resultado único. A dependência química é um desafio extremamente complexo e afeta os indivíduos, sua família e a comunidade à sua volta. 

As drogas, lícitas ou ilícitas, são consideradas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) uma doença crônica e recorrente, com consequências devastadoras para a vida dos dependentes e seus familiares. O relatório da OMS “Global Status Report on Alcohol and health 2018” aponta que 3 milhões de pessoas morrem por ano pelo uso abusivo de álcool e outras substâncias, sendo a maioria homens. Isso significa que 1 a cada 20 mortes são por fatores como embriaguez, violência, abuso induzido pelo álcool, além de outras doenças e distúrbios. No geral, mais de 5% da carga global de doenças é do uso nocivo do álcool. O consumo dessas substâncias prejudica a saúde, ampliando o risco de desenvolver uma doença crônica como cirrose hepática, problemas respiratórios, danos no sistema cardiovascular, transtornos mentais e comportamentais.

Cerca de 284 milhões de pessoas entre 15 e 64 anos usaram algum tipo de droga em 2020 no mundo. Um aumento de 26% em comparação aos últimos 10 anos anteriores, segundo o “Relatório Mundial sobre Drogas 2022”, do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). O Brasil não fica para trás não. Dados do Ministério da Saúde, somente o Sistema Único de Saúde (SUS), registrou, em 2021, mais de 400 mil atendimentos somente as pessoas com transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de drogas e álcool. Um aumento de 12% em relação a 2020. O número de atendimentos realizados para o uso abusivo de álcool foi de 159 mil pessoas. Já o uso de múltiplas drogas e de substâncias psicoativas somam 151,3 mil atendimentos. Os transtornos mentais e comportamentais por uso de cocaína foram de 31,9 mil e do fumo 18,8 mil. 

Ainda me pergunto, por que as pessoas usam drogas? 

A pesquisa “Representações Sociais do Uso e Abuso de Drogas entre Familiares de Usuários”, da Revista Scientific Eletronic Library, estudou 37 famílias de dependentes químicos de álcool e crack, ambos os sexos, cujos parentes estavam em tratamento em hospitais ou no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Os resultados não são surpreendentes, mas comprovam que as drogas prejudicam as relações familiares, sendo responsáveis pelo conflito e desarmonia dentro das casas. Esses desentendimentos também reverberam na saúde financeira dessas famílias tanto pelo gasto com as drogas quanto pelas sucessivas internações em hospitais e clínicas.

As famílias adoecem ao lado do dependente químico, tornando-se “codependentes” em seu sofrimento psíquico. Essa dor faz o familiar se sentir vulnerável, culpado e até vítima das atitudes do dependente. Ao analisar as variáveis do crack é possível enxergar uma dupla vertente do problema: os efeitos físicos como o enfraquecimento e deterioração do organismo e os efeitos morais. Os resultados obtidos do estudo permitem concluir que os estados físico, mental e moral dos usuários influenciam exatamente as mesmas áreas da vida de seus familiares. O uso das drogas por alguém da família traz uma sobrecarga emocional muito grande onde o outro se sente corresponsável. A pressão emocional pode ser tão intensa que resulta em problemas de saúde mental para os familiares, como depressão e ansiedade.

“Um abismo chama outro abismo”, Salmos 42:7

A questão da liberação das drogas deve ser vista pela perspectiva sensível, considerando todo o impacto que as substâncias têm nas relações, na saúde e no financeiro. Normalmente, as famílias se tornam o primeiro sistema afetado pela dependência. Mas a sociedade também é impactada. Impossível negar a relação entre o consumo de drogas e o aumento da criminalidade. 

O uso das drogas pode levar a comportamentos impulsivos e a perda de autocontrole, fazendo com que o usuário se envolva em pequenos crimes e até a violência. É comum também, infelizmente, que os dependentes cometem pequenos delitos para sustentar o vício. 

Não importa a quantidade, se o usuário consome, tem mercado.

O tráfico de drogas é a principal atividade criminosa associada ao consumo. E é um mercado altamente lucrativo, só que do crime. O comércio ilegal de drogas tem consequências como corrupção, violência, dependência e danos à saúde pública, atravessando fronteiras internacionais, e está ligado a outras formas de crime, ampliando a violência e a criminalidade na sociedade. A presença de traficantes na comunidade aumenta a vulnerabilidade e gera um ambiente de medo. Pesquisas mostram que uma grande parte dos homicídios no Brasil ocorre perto de zonas de mercado de drogas ilícitas. 

“Estudos etnográficos apontados por Barcellos e Zaluar (2014) demonstram que há uma incidência maior de criminalidade, como o alto índice de homicídios, nas áreas próximas das dominadas por facções criminosas ligadas ao tráfico de drogas em relação ao resto da cidade e apontam que nas regiões afastadas do tráfico…, o índice de homicídio é menor, já que os criminosos protegem seus territórios e isso ocasiona muitas vezes em mortes de policiais, de traficantes das facções rivais ou das próprias facções. Os homicídios ocorrem desta forma nas proximidades… [de] locais considerados como zona de conflito”. Revista Ibero- Americana de Humanidades, Ciências e Educação. São Paulo (MARQUES; SANTOS, 2018, p. 05).

O estudo “A Relação entre as Drogas e a Criminalidade: do Ponto de Vista Jurídico e Criminológico” aponta uma série de medidas que podem ser consideradas nesse debate. Além da conscientização: tratamento e reabilitação; restrições à publicidade e restrições ao acesso; política de preço e impostos; políticas de redução de danos e fiscalização e aplicação da lei. O próprio estudo sugere a descriminalização e legalização como um dos tópicos, mas deixa claro que o objetivo deste ponto é “eliminar penalidades criminais para a posse pessoal e regular o mercado de drogas”. O foco da descriminalização e legalização das drogas não é o cidadão dependente químico nem as famílias. A legislação é um fator de extrema importância na prevenção ao uso de drogas.

Diminui a população carcerária, mas aumenta a população hospitalar?

Eu sou completamente contra as drogas. No Senado, votei a favor da PEC nº 45/2023, da qual sou signatário, que criminaliza a posse de qualquer quantidade de droga ilícita. Eu não quero ver pessoas se deteriorando e famílias sendo desfeitas, enquanto a impunidade reina no Brasil. Temos uma luta legislativa e uma briga contra narrativas mentirosas.

Eu não consigo enxergar os benefícios da “descriminalização” da droga. A descriminalização ou legalização das drogas facilita a atuação de pequenos traficantes, que vendem pequenas quantidades nas ruas e nas comunidades, mais próximos de nossos filhos e das futuras gerações. O traficante com mais recursos compra armas para dominar o território, aumentando a criminalidade e tornando as ruas menos seguras para o cidadão do bem. Como consequência, vai aumentar o consumo, destruindo as pessoas, nossos jovens e as famílias. Com o crescente número de dependentes químicos, os hospitais vão ficar cheios, colaborando para a crise no sistema de saúde do Brasil. 

A nossa luta no Senado não é fácil e a gente precisa de apoio. Eu apresentei o projeto de lei nº 3172/2023, que está em tramitação, que combate o uso de drogas com verba pública. O projeto destina 10% das verbas de propaganda governamental para campanhas antidrogas, a fim de conscientizar o cidadão sobre o uso das drogas. Eu fui relator de outro projeto que conseguimos aprovar no Senado e está agora na Câmara, o projeto de lei nº 2807/2022 que prevê a fixação de painéis antidrogas em entradas e saídas de escolas públicas. É uma forma de alertar e educar estudantes sobre os perigos das drogas.

Voltando à pergunta: por que as pessoas usam drogas? 

Existe uma variedade de razões para levar a pessoa a experimentar uma substância, entre eles: curiosidade e busca por algo novo; influência social; problemas emocionais; alívio da dor e fatores familiares. Mas, para que todos esses motivos sejam bem sucedidos para encarcerar o indivíduo na dependência das drogas, há um fator preponderante para todos eles: a disponibilidade.

Quando as drogas são fáceis de acessar, aumenta a probabilidade de uso. Quando a pessoa quer fugir da realidade, ela pode procurar vários caminhos. A droga não pode ser facilmente acessível. Em um ambiente onde a droga é normal e comum, as pessoas podem se sentir mais à vontade para experimentar. A representação glamurosa da mídia no uso das drogas, associadas a estilos de vida desejáveis, também pode aumentar a curiosidade e a pessoa fica mais propensa a experimentar. A falta de informação e o desconhecimento também são fatores que colaboram com a disposição em usar.

O uso de drogas por um indivíduo é resultado de uma combinação de fatores emocionais, financeiros e sociais. É muito importante que haja educação e conscientização. A dependência química, como vimos, não afeta somente o usuário, mas a sua família e a sociedade. Uma das minhas iniciativas no Senado Federal foi criar a Frente Parlamentar Católica Apostólica Romana (FPC) porque acredito que a religião pode influenciar positivamente as pessoas e a frente pode desempenhar um papel significativo nessa luta. A FPC é composta por parlamentares que podem se organizar para propor políticas públicas voltadas para a prevenção da dependência química; defender políticas que ofereçam apoio às famílias afetadas pela dependência, incluindo serviços de aconselhamento e grupos de apoio. O fortalecimento das redes familiares é essencial para a recuperação dos dependentes; apoiar as comunidades terapêuticas, além de promover campanhas de conscientização sobre os riscos associados ao uso de drogas e a importância da prevenção.

A atuação da Frente Parlamentar Católica na promoção do diálogo construtivo sobre o tema, alinhando valores éticos com ações práticas que beneficiam a sociedade, é uma oportunidade valiosa. 

Precisamos de sensibilidade e compreensão para abordar esse tema. A luta contra a dependência química deve ser uma responsabilidade coletiva, onde todos têm um papel na construção de um futuro mais saudável e livre do consumo abusivo dessas substâncias. Todos merecem ter a capacidade de sonhar!

Adicionar aos favoritos o Link permanente.