Pioneiros do sabor: restaurantes de Brasília que resistiram ao tempo

Pioneiros do sabor: restaurantes de Brasília que resistiram ao tempoRedação GPS

Garçons que se transformam em família, receitas que atravessam gerações e cardápios que traduzem diversidade. Em uma capital que reuniu gente do Brasil e do mundo antes mesmo da sua inauguração, a gastronomia local reflete pluralidade. E, apesar de planejada, Brasília sempre soube como acolher tradições vindas de longe.

Com cenários que se remodelam ao longo dos anos, redutos gastronômicos emblemáticos da cidade ficaram pelo caminho, levados por razões diversas. Mas alguns resistem ao tempo e às adversidades, desafiam incertezas e mantêm vivos sabores e memórias. Quem atravessa suas portas não encontra apenas um prato tradicional, mas uma parte da história de Brasília servida à mesa.

1956: A brasa que não apagou

Antes da inauguração da nova capital, os operários que trabalhavam na construção da barragem do Paranoá já precisavam de um bom lugar para comer. Foi em 1956 que surgiu a Churrascaria Paranoá. Localizada às margens da barragem que dá nome ao restaurante, tornou-se a favorita de Juscelino Kubitschek. O cordeiro assado na brasa com sal grosso e alecrim, um dos pratos preferidos do ex-presidente, segue no cardápio, mantendo viva a tradição.

Churrascaria Paranoá

1960: Inaugurados com Brasília

Se Brasília nasceu oficialmente em 21 de abril de 1960, o Restaurante Roma já servia seus primeiros clientes desde o dia 15 daquele mês. Localizado na W3 Sul, este verdadeiro relicário da cidade assistiu à avenida ir do auge à decadência com o passar das décadas, mas resiste no mesmo endereço, reunindo avós, filhos e netos seduzidos pelo clássico filé à parmegiana.

No mesmo ano, no comércio da 107 Sul, rua da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, nascia outro ícone: a Pizzaria Dom Bosco. Seu conceito é simples, mas infalível: pizza de mussarela quentinha acompanhada de um copo de mate gelado. Para a experiência ser completa, a fatia precisa ser dupla. Desde então, o balcão é parada obrigatória para quem quer um lanche rápido e saboroso.

Enquanto isso, na movimentada Rodoviária do Plano Piloto, o padeiro mineiro Tião apostava na receita que mudaria sua vida com a inauguração da primeira unidade da Pastelaria Viçosa. Não demorou para a combinação do pastel crocante com o caldo de cana geladinho conquistar de operários a presidentes.

1966: Tempero do mundo

Mesmo jovem, a cena gastronômica da capital já começava a refletir as influências multiculturais da cidade. Foi nesse contexto que, em abril de 1966, dois imigrantes árabes fundaram o Bar Beirute, na 109 Sul. Responsável por um dos quibes mais desejados do Quadradinho, o local logo virou ponto de encontro de jornalistas, artistas e boêmios, que ali se reuniam para tomar cerveja, mesmo que fosse na calçada – as mesas eram disputadíssimas.

Neste mesmo ano, Brasília ganhou um pedaço da França com o La Chaumière. Frequentado por políticos e intelectuais, o restaurante testemunhou Ulysses Guimarães assinar um cheque com uma dedicatória ao chef Severino Xavier e viu Fernando Henrique Cardoso saborear inúmeras vezes seu prato favorito: o steak au poivre.

1978: A carne de sol da capital

Se há um restaurante símbolo da autêntica cozinha nordestina na cidade, é o Xique-Xique. Aberto em 1978 na 708 Norte, o sucesso foi tanto que no ano seguinte inaugurou sua primeira filial, na 107 Sul. A carne de sol com feijão de corda, paçoca e mandioca com manteiga de garrafa tornou-se um verdadeiro patrimônio brasiliense.

Anos 1980: A década de ouro

A década de 1980 consolidou casas icônicas. Em 1982, o Restaurante Careca apresentou aos brasilienses a cozinha oriental com sua unidade na 411 Norte. Bem servidos, seus pratos chineses ainda fazem sucesso, com destaques para o frango agridoce, a carne acebolada e a banana caramelada.

O que viria a se tornar o “lanche brasiliense raíz” chegou em 1985, quando o Sky’s Burger abriu as portas na comercial da 106 Sul. O segredo? Sanduíches de qualidade em porções generosas e com ingredientes simples. O creme de morango, os crepes e o açaí também ganham o coração dos brasilienses, que fazem fila na lanchonete até de madrugada.

Em 1988, dois gigantes entram em cena: o Dom Francisco, fundado por Francisco Ansiliero na 402 Sul, e o Don Romano, tradicional da QI 11 do Lago Sul, mas cuja história se iniciou na Asa Norte. Enquanto o primeiro ficou conhecido pela picanha, o bacalhau e o tambaqui, o segundo se consagrou como referência em pizzas de forno à lenha e massas artesanais.

Pouco depois, em 1989, chegava o Libanus, que desde então carrega a medalha de ouro no quesito cerveja gelada. Boteco referência na Asa Sul, localizado na CLS 206, ficou famoso pelos encontros descontraídos, pelo “árabe completo” e pela picanha na chapa, que atravessaram décadas sem perder a preferência dos clientes.

Anos 1990: Portas abertas para novos clássicos

Na última década do século do seu nascimento, Brasília viu novos clássicos surgirem e rapidamente entrarem para a lista de queridinhos. Um deles é o Fred, que inaugurou na 405 Sul em 1991, revelando o picadinho mais famoso da capital. Apesar de especializado em culinária alemã, foi esse prato abrasileirado que se tornou seu cartão de visitas.

Sem mesa posta

Mas nem só de longos almoços e jantares se faz a tradição gastronômica brasiliense. Algumas experiências icônicas acontecem em pé, no balcão, na rua ou até na entrada de superquadras. Entre elas, fazer um lanche na Vitamina Central (506 Sul), inaugurada em 1976; lambuzar-se com os cachorros-quentes do Landi (405 Sul) e do Dog da Igrejinha (107 Sul), servidos desde 1987 e 1995, respectivamente; encarar as “bombas” do Guará, encontradas pelo bairro desde o início dos anos 1980; ou desbravar as mais diversas culinárias em complexos permanentes, como a Feira da Torre de TV, iniciada na década de 1970; a Feira Central de Ceilândia, em operação desde 1984; e a Quituart, fundada em 1988 no Lago Norte.

Aos 65 anos, a gastronomia de Brasília reflete o espírito da cidade: heterogênea e diversa. Da alta cozinha às carrocinhas, da comida afetiva às novas experiências sensoriais, a capital do país segue provando que é um caldeirão de influências e sabores, sempre pronto para surpreender.

*Por Larissa Duarte – matéria originalmente publicada na edição 42 da Revista GPS|Brasília

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