Osias Gomes: o homem que transformaram em louco

Corria o ano de 2017 e eu cumpria mais um sábado de trabalho. Ao terminar a aula e sair da sala, uma aluna me abordou e me entregou um convite para o lançamento do novo livro do pai. Fiquei empolgado, porque já conhecia o autor, por outros livros. Fui ao lançamento na expectativa de conhecer a obra O Diário Secreto de Osias Gomes: a morte anunciada de João Pessoa, escrita por José Caitano de Oliveira.

Confesso que esse livro ficou um bom tempo em minha prateleira, até que necessitei lê-lo para poder fazer uma série de entrevistas que programei para 2020. Fui ler com um olhar técnico, profissional, para tentar extrair nas entrevistas um bom conteúdo.

No entanto, ao terminar o livro, veio uma sensação de tristeza profunda pela história que tinha acabado de conhecer. O olhar profissional foi substituído por um sentimento humano de solidariedade com o que tinha acabado de conhecer. Vamos aos fatos.

Osias Nacre Gomes, personagem central do livro, foi diretor do jornal A União (órgão de imprensa oficial) durante o governo de João Pessoa. Ele guardou muitos segredos, e custou caro saber demais. Segundo o autor do livro, José Caitano, quatro homens invadiram a casa de Osias Gomes, próximo ao meio-dia, retiraram-no de casa à força e o internaram no hospício da capital – o famoso Juliano Moreira – sem nenhuma recomendação médica ou judicial. Ele ficou lá por longos quatro meses sem nenhum contato com a família. Nesse período, espalhou-se pela boca miúda que o ex-diretor do jornal A União teria enlouquecido.

Vamos lá: como alguém é internado como louco sem nenhum atestado médico? A resposta é simples: Osias sabia demais! Se ele abrisse a boca para relatar o que via João Pessoa fazer na redação do jornal, poderia surgir uma nova versão para a sua morte e a Revolução de 30 poderia não ser vitoriosa. Na dúvida, preferiram a fama de louco para tirar qualquer chance de credibilidade do que ele falasse. E conseguiram. Osias Gomes só falou 53 anos depois, por meio do seu diário.

Mas, afinal, o que tanto o mais novo “louco” da cidade sabia? Não vou explicar nada, apenas citarei um trecho do diário de Osias: “Já mostrei que o próprio João Pessoa me fornecia todas as tardes, à hora crepuscular, os termos, notas e informes para os editoriais. A matéria era dele e não raro as próprias expressões do revide”.

Inclusive, a famosa nota publicada no jornal, em que era informada a ida de João Pessoa a Recife, foi colocada no A União a mando do chefe do executivo. A partir dessa nota, João Dantas soube da presença do seu inimigo em Recife, e o resto da história nós sabemos. O que pensaram os aliados de João pessoa: e se Osias disser que João Pessoa era o verdadeiro autor das ofensas à família Dantas? E se ele disser que foi João Pessoa que obrigou a soltar a nota da sua visita a Recife? Se ele falasse, o rumo da história poderia ter sido outro. Pois é, Osias foi carimbado como louco por saber desses detalhes.

Escrevi este texto pesando muito nos perseguidos, pois os apoiadores de João Pessoa tentam, mais uma vez, fazer um revisionismo de fatos e personagens que foram tão trucidados na sua memória pela tal da Revolução de 30. Despeço-me com as próprias palavras de Osias: “Quebro minha jura de silêncio nestas afirmações redigidas a frio, 53 anos após a revolução. Não devo a ninguém, nem de um lado nem de outro”.

*Rafael da Silva Virginio é professor de história da rede particular de João Pessoa. É especialista em História da Paraíba.

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

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