500 edições impressas inscrevem o Brasil de Fato MG como parte da história da esquerda mineira

Era 23 de agosto de 2013 quando a primeira edição impressa do jornal Brasil de Fato MG circulou pelas ruas de diversas cidades de Minas Gerais. Na capa, a manchete “Máfia dos ônibus em BH” colocava em pauta um assunto que ainda assola a população belo-horizontina, o que traduz a importância da publicação para mineiros e mineiras. 

Nesta semana, essa mídia impressa chega à 500ª edição, e as capas — a primeira forma de contato dos cidadãos com as ideias do jornal — ajudam a contar essa história. 

“No conjunto, as capas contam a história do jornal, mas elas também dizem muito sobre a nossa história recente. Elas sempre abordaram temas fundamentais, temas quentes, temas importantes, que dizem sobre a política, tanto a nível municipal, quanto estadual e federal”, reforça Larissa Costa, ex-editora do Brasil de Fato MG. 

Em 31 de janeiro de 2014, por exemplo, a edição nº 23 colocou os holofotes no escândalo de empresas construtoras do BRT de BH, que financiaram a campanha eleitoral do ex-prefeito Márcio Lacerda (PSB). A gestão voltou a ocupar as capas de outras edições, que informaram a população sobre um governo que provocou inúmeros desafios à capital mineira. 

No âmbito estadual, em novembro de 2014, a edição de nº 65 lançou luz sobre a dívida de MG, ocasionada pelo PSDB, que, à época, já ultrapassava R$ 100 bilhões. Os cifrões em torno da Cidade Administrativa ilustraram a capa, que há 11 anos pautou a população sobre a controversa construção do edifício. 

Disputas políticas

Também em 2014, o embate entre DIlma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) pela presidência do Brasil estampou a edição 61, numa clara demarcação entre dois projetos políticos absolutamente distintos, que deixaram marcas na história brasileira recente. 

Mais tarde, em 2016, outras edições emblemáticas trouxeram o resultado desse acirramento: as tentativas e o consequente golpe sofrido por Rousseff, eleita de forma legítima para o seu segundo mandato. 

Em março daquele ano, a frase “Eles querem desestabilizar a democracia” repudiou, na capa de uma edição especial do jornal, a mídia comercial que apoiava, declaradamente, o impeachment. Em abril, o mesmo tema apareceu ilustrado em um tabuleiro de xadrez, em referência ao jogo político da época, dando nome aos jogadores, como Michel Temer (MBD), que posteriormente se tornou presidente do país. 

“Essas 500 edições simbolizam, principalmente, que o projeto do Brasil de Fato MG faz sentido. Desde quando a ideia estava sendo construída, mais de 12 anos atrás, até hoje, temos ainda a intensa necessidade de um ambiente informativo alternativo ao modelo hegemônico, que consiga não cair na armadilha do sensacionalismo nem do reforço insistente e mal disfarçado dos valores e pontos de vista dos grandes grupos econômicos”, reflete Joana Tavares, ex-editora do jornal. 

Para ela, além das capas,  todas as matérias, entrevistas, artigos, editoriais, cada nota e cada legenda dessas 500 edições carregam o esforço de chamar a atenção das pessoas para as desigualdades e opressões, e para convocar para a esperança de que as coisas podem ser diferentes. 

“Não só subsidiar a indignação de conteúdo, mas também cultivar a esperança e os bons exemplos da luta coletiva: é visível o compromisso do Brasil de Fato MG com esses dois objetivos. E nos lembrar disso por 500 jornais já inscreve o jornal como parte da história da esquerda mineira”, lembra a jornalista. 

Para Larissa Costa, especialmente durante os períodos eleitorais, o jornal elaborou capas fundamentais que deixaram nítida a disputa de projetos em torno do país. 

“Mas sem abrir mão de um bom jornalismo, de um jornalismo de qualidade, ouvindo sempre o outro lado, valorizando os movimentos sociais, as universidades. São capas muito marcantes que de fato influenciaram nas lutas de cada momento histórico”, defende. 

Visibilidade

O desastre-crime da Vale em Mariana foi sempre recordado em edições especiais que denunciavam a impunidade; os retrocessos na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) promovidos por Temer; a ascensão da extrema direita com Jair Bolsonaro (PL); outro crime da Vale, em Brumadinho, em 2019; a vitória de Lula (PT); a política neoliberal do governo de Romeu Zema (Novo); a disputa recente entre Fuad Noman (PSD) e Bruno Engler (PL) pela prefeitura de BH. 

Todos esses e diversos outros temas necessários à disputa política e ideológica do Brasil e do mundo apareceram, neste cenário, a partir de uma visão popular. 

“Um exemplo de contracapa que me emociona ainda hoje é a da edição 321, de março de 2020, que traz um recado de humildade, compromisso e firmeza”, destaca Joana Tavares. 

Na ocasião, o Brasil de Fato MG publicou sua primeira edição após a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar oficialmente a pandemia de covid-19. O recado foi simples e objetivo: “a solução é coletiva”.  

Veio para ficar

Para o sociólogo e colunista do Brasil de Fato MG Rubens Goyatá, a ferramenta crava a sua importância na história ao fazer jornalismo em uma articulação próxima de movimentos populares e lutas sociais. 

“O jornal dialoga muito com a base do povo, e tem uma influência muito grande”, avalia. 

Segundo ele, o impresso teve uma especial contribuição de resistência ao “negacionismo criminoso” promovido por Jair Bolsonaro (PL) na pandemia. 

A jornalista e colunista Makota Célia Gonçalves Souza destaca que o jornal se diferencia das demais mídias na linguagem e na leveza de trazer para o cotidiano assuntos relevantes, sem ser massivo e impositivo, deixando espaço para o pensar e concluir sobre a realidade quem a vive no cotidiano.

“Em vários momentos, percebo que a leitura do Brasil de Fato MG ajuda a transformar pensamentos e ideias, quando vejo a juventude debater os fatos e notícias aqui trazidos, quando as pessoas interagem conosco a partir da leitura que o jornal traz”, acrescenta. 

“A edição 500 mostra que o jornal veio para ficar e contribuir para um novo pensar de um jornalismo moderno, contemporâneo sem ser um jornalismo marrom”, comemora. 

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