
Os carros da China já são uma realidade no nosso dia a dia e, para o mercado, são uma oportunidade de negócio. E perto do cenário de carros a combustão, que sempre teve meia dúzia de grandes marcas, ainda há muito a conhecer sobre centenas de marcas chinesas. Principalmente de eletrificados. O empresário Wagner Orletti sabe disso e está de olho nas oportunidades.
Nesse contexto, um grupo capixaba que já comercializa 10 marcas de veículos resolveu apostar na 11ª. A chinesa Omoda & Jaicoo. Já ouviu falar? É uma linha premium que chega para disputar o mercado dominado pelos chineses que foram pioneiros. O Grupo Orletti começou em 1966, fundado por cinco irmãos de uma família de Pinheiros, no Norte do Estado. Hoje, o grupo atua no Espírito Santo, em Minas e na Bahia.
Além das 11 marcas de veículos, que vão de ônibus aos novos chineses eletrificados (híbridos e elétricos), o grupo atua com Auto Center, pneus, peças, acessórios e ainda no segmento de consórcios. O CEO do grupo, Wagner Orletti, acredita que a sustentabilidade do negócio está na diversificação e não descarta incorporar novas marcas.
Veja abaixo a entrevista com Wagner Orletti, CEO do Grupo Orletti.
O que o ES ensinou ao Grupo Orletti e como isso contribuiu para o crescimento que vocês alcançaram?
Como você disse, o grupo foi fundado em 1966 pelos irmãos Orletti, inicialmente na agropecuária. Eles são do Sul do ES e migraram para o Norte para atuar no segmento agrícola. Já em 1993, como a família sempre teve um viés comercial muito forte, iniciamos atividades no ramo automotivo, em Teófilo Ottoni, Minas Gerais.
Apesar de começarmos esse ramo fora do Estado, sempre foi um desejo muito forte voltar. E isso por motivos muito claros. Quem está em Minas vê o Espírito Santo com muito potencial. Vitória é uma cidade linda, o Estado respira desenvolvimento, tem uma renda per capita elevada e qualidade de vida. Isso sempre nos atraiu.
Qual é o desafio de trabalhar com tantas marcas diferentes de veículos?
Começamos com a Volkswagen em Teófilo Ottoni. Antes, era comum um grupo ter apenas uma marca, porque as próprias montadoras exigiam exclusividade. Porém com a chegada de muitas novas marcas e uma concorrência maior, as margens diminuíram, e a escala passou a ser fundamental para a sobrevivência.
Percebemos que, se ficássemos com apenas uma loja ou uma marca, o negócio não se sustentaria. Começamos adquirindo lojas da mesma marca em cidades vizinhas e depois expandimos para outras marcas. Isso trouxe competitividade e capilaridade, dois pontos essenciais para crescer nesse mercado.
O mercado mudou muito, especialmente com a chegada de veículos chineses. Como vocês decidiram que era hora de investir neles?
Antes dos chineses, já vínhamos expandindo por necessidade de sobrevivência. Agora, com a chegada dos chineses, o cenário mudou ainda mais. Muita gente associa o chinês apenas ao carro elétrico, mas há os eletrificados também, como os híbridos. Hoje, o mercado brasileiro está muito mais voltado para os híbridos – eles já representam cerca de 85% desse nicho.
Os chineses dominam a tecnologia do elétrico e têm muita competitividade. As marcas tradicionais podem até alcançar essa tecnologia, mas dificilmente vão conseguir bater os preços dos chineses. Então, para nós, era mais arriscado ficar de fora. Entramos com marcas chinesas no segmento premium, como a Omoda & Jaecoo, que vieram para agregar faturamento e ampliar a nossa presença.
E como você enxerga a concorrência nesse setor?
O mercado automotivo é extremamente competitivo, especialmente no Brasil. As margens são muito pequenas, e por isso é essencial ter escala. No Espírito Santo, os grupos são muito bem estruturados e profissionais. Isso nos exige excelência.
Não basta vender o carro, é preciso ter um pós-venda diferenciado. Esse é um dos pilares da nossa estratégia: atendimento de qualidade e uma marca bem posicionada aos olhos do consumidor, com visão de longo prazo.
Você acredita que dá para construir essa reputação com os veículos chineses?
Acredito sim. As marcas chinesas estão se posicionando de formas diferentes. Algumas focam no segmento popular, outras no premium, como é o caso da Omoda & Jaecoo, que representam nosso grupo. É natural haver confusão entre as marcas, mas o nosso foco é claro.
Posicionamos essas marcas no premium, com design, tecnologia e performance. E o consumidor vai percebendo isso. A confiança vai sendo construída com o tempo, com produto de qualidade e atendimento sólido.
E como é o consumidor capixaba nesse contexto?
Não dá para tratar o Espírito Santo como um mercado único. A Grande Vitória tem uma das maiores rendas per capita do país, e por isso o segmento premium tem grande potencial aqui.
Já o interior é muito agrícola – um dos que mais cresceram no país. Só no ano passado, o setor agro cresceu 40% no interior capixaba, enquanto a média nacional foi de 8%. Esse público demanda picapes, veículos voltados ao trabalho no campo.
Cada região exige uma estratégia de produto diferente. E isso é algo que sempre levamos em conta.
Quais são os riscos do setor automotivo no Estado e o que garante o sucesso do Grupo Orletti nesse ambiente?
Os riscos não são exclusivos do Espírito Santo, mas sim do Brasil como um todo. A instabilidade econômica e as taxas de financiamento elevadas são um desafio para o setor automotivo. Mas o brasileiro é criativo e sabe buscar alternativas – há negociações com montadoras e bancos que viabilizam taxas melhores.
No interior, o agro ainda sustenta um crescimento sólido, o que nos dá segurança. E no segmento premium, há menos dependência de financiamento, o que reduz o impacto das crises. Nosso foco é oferecer produtos certos para cada público, com boa gestão e atenção constante ao mercado.
E por que o consumidor deve escolher um chinês e não marcas mais tradicionais?
Porque o mercado está mudando. Nesse sentido, o medo do carro chinês e do elétrico está sendo superado. As baterias estão mais duráveis, bem como a autonomia melhorou muito. O híbrido que estamos trazendo agora, por exemplo, tem 1.200 km de autonomia.
Além disso, os números comprovam: quase 10% do mercado já é de carros chineses. O consumidor está se abrindo a essas novas opções. E apostamos forte nisso, com produtos competitivos, tecnologia avançada e atendimento premium.
Como você avalia o ambiente de negócios no ES?
O Espírito Santo é um estado privilegiado em relação aos demais do Brasil. Começamos nossas atividades em Minas Gerais, onde ainda temos unidades em crescimento, e também atuamos na Bahia. Porém, decidimos voltar ao Estado porque percebemos sua pujança e diferenciais. O ambiente de negócios aqui é muito melhor, e isso é reconhecido.
Temos um histórico de governos que compreendem a importância do empresariado, que sabem dialogar, promover o crescimento e dividir renda com a sociedade. São mais de 25 anos de estabilidade, com segurança jurídica e incentivo ao empreendedorismo.
Além disso, o investimento em infraestrutura é notável. Veja os portos: Imetame, Portocel, Barra do Riacho. Todos fazem o movimento de ampliar capacidade. Do mesmo modo, isso atrai empresas de fora e nos dá segurança para investir.
Ter uma montadora sempre foi um sonho para o Espírito Santo. Como você enxerga esse movimento?
Uma montadora não é apenas uma montadora. É um símbolo de desenvolvimento, um marco para o Estado. Já tivemos um ensaio disso no passado, como com a Ford, e hoje temos a Marco Polo, em São Mateus. Há conversas sobre trazer mais montadoras, principalmente com esse crescimento das chinesas.
Montadora gera um ecossistema: fornecedores, empregos, serviços. Existe interesse do governo e de empresários, e pode, sim, haver espaço para o Grupo Orletti como fornecedor, parceiro logístico ou distribuidor. Quem sabe até formar um pool de empresas para viabilizar isso. Estaríamos muito interessados em colaborar com um projeto assim.
E sobre o Norte do Estado, de onde você é… Como vê o crescimento da região?
Eu sou de Pinheiros e falo com muito orgulho. O Norte, que já foi visto como o “patinho feio”, hoje é uma das regiões mais promissoras do Espírito Santo. O agro é muito forte, mas agora chegou também a indústria.
O incentivo da Sudene foi fundamental nesse processo, especialmente nas margens da BR, como Linhares, São Mateus e agora Aracruz com os portos. O crescimento é visível. E nós, do Grupo Orletti, estamos presentes e colaborando com esse desenvolvimento.
Como outros negócios, além de veículos, impactam o crescimento do Grupo Orletti?
Escala é essencial. Temos atuação em consórcios, atacado de peças e pneus, Auto Centers… Tudo com sinergia no setor automotivo. Recentemente, abrimos uma unidade na Serra focada em atacado de peças e pneus, atendendo o Espírito Santo e estados vizinhos.
E tem mais: no ano passado, trouxemos para o Brasil a Point S, maior rede mundial de Auto Centers, com mais de 6 mil unidades em 50 países.
Já temos mais de 20 franquias nomeadas e pretendemos chegar a 300 em três ou quatro anos. Isso nos dá capilaridade, competitividade e alavanca nosso crescimento.
Estar no ES facilita essa capilaridade?
Sem dúvida. A posição geográfica do Estado favorece muito a logística. No segmento de distribuição, você precisa ter unidades espalhadas e o Espírito Santo permite esse crescimento para os estados vizinhos.
Hoje atuamos no ES, Bahia bem como em Minas. Nesse sentido, a ideia é consolidar essas operações antes de pensar em outras regiões. Porém, claro, estamos sempre atentos às oportunidades.
Você falou bastante do agro. Há investimentos do grupo nesse setor?
Sim. Nossa origem está no agro e isso continua nas veias do grupo. Temos propriedades que produzem café, mamão e outros produtos. Também atuamos com o café. Uma das empresas da família é voltada para compra e exportação de café, com crescimento constante.
Por isso falo tanto do agro — ele é parte fundamental do nosso DNA e tem colaborado com o desenvolvimento do grupo.
No Norte, é comum o café virar moeda. Já vendeu carro por saca de café?
Já sim! É comum e aceitamos com prazer. Se tiver café na família, pode nos procurar. Fazemos negócio. Isso é muito comum no Norte do Brasil: café, cacau, soja… acabam virando moeda, inclusive futura. E o café, hoje, está supervalorizado.
Onde o Grupo Orletti quer chegar?
O Grupo Orletti é, por natureza, expansivo. Queremos crescer com as mesmas marcas em novos territórios, ou com novas marcas nas regiões em que já atuamos. Estamos atentos ao movimento das marcas chinesas, à eletrificação do setor automotivo, e buscamos constantemente novas oportunidades.
Estamos abertos para trazer mais marcas, tanto para a Grande Vitória quanto para o interior. Nosso objetivo, já escrito há algum tempo, é estar entre os três maiores grupos onde atuamos. Hoje, já somos isso em várias regiões. O futuro depende da receptividade dos nossos clientes e de como transmitimos nosso valor todos os dias.
Wagner Orletti é CEO do Grupo Orletti
Veja abaixo a entrevista completa: