Dois encontros do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) com a participação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) realizados nos últimos dias no RS indicam a formação de uma frente de luta.
O primeiro encontro, realizado na última semana, em Santa Cruz do Sul, reuniu cerca de 50 dirigentes de diferentes regiões, bem como de organizações e movimentos aliados, oportunizando o debate dos pontos de pauta a serem defendidos junto aos governos estadual e federal na mobilização que acontecerá dia 15 de maio, em Porto Alegre.

O segundo encontro aconteceu em Porto Alegre, na noite desta segunda-feira (28), mobilizando cerca de 80 pessoas, a maior parte aliados históricos dos movimentos, como dirigentes sindicais, representantes de partidos, deputados, vereadores, comunicadores, jornalistas e artistas. Em pauta no encontro a apresentação das reivindicações e formação de uma frente de apoio aos pequenos agricultores e aos atingidos pela crise climática que vão participar da mobilização.

Frei Sérgio Görgen, dirigente do MPA, explica que está na hora de os pequenos mostrarem sua capacidade de organização e mobilização, fazendo valer as palavras de ordem do movimento: “Quem alimenta o Brasil exige respeito”.
Para Görgen está claro que a solução para os problemas que o Brasil enfrenta em relação ao abastecimento e preços dos alimentos passa diretamente pela capacidade de produção da agricultura familiar e camponesa. “Os pequenos é que produzem comida, suas reivindicações são justas e esperamos que os governos tenham o discernimento de ouvir e atender a pauta a ser apresentada.”
“Vamos construir uma grande mobilização, negociar nossas pautas e cobrar soluções para nossas dificuldades. Queremos produzir alimentos e precisamos de recursos para isto. Recursos com subsídios e pouca burocracia. O dinheiro das políticas públicas do presidente Lula tem que chegar nas mãos de quem precisa. Vamos ajudar o Brasil a ter alimentos de qualidade na mesa de todos, principalmente os trabalhadores e os mais pobres das cidades”, aponta a pequena agricultora e dirigente do MPA Vanderléia Nicolini Chitó.

Leonardo Maggi, dirigente do MAB no RS, explicou os pontos de pauta que movem os atingidos e atingidas. “A centralidade da pauta dos atingidos está no âmbito da reconstrução pós-enchentes, especialmente no tema da habitação; construção de reassentamentos e reforma de casas, principalmente urbanos; o tema da alimentação, já que o povo atingido está com enormes dificuldades financeiras desde a enchente, muitos passando fome; e o tema da participação, já que os atingidos estão fora, desde as ações de reconhecimento, até mesmo da possibilidade de saber o enquadramento em que cada uma das famílias está junto as políticas públicas propostas no âmbito da reconstrução”. Para ele está claro que o movimento está com ânimo, confiança, organização e muita disposição para lutar para que as águas sejam para vida e não para morte.

No encontro realizado em Porto Alegre, Olívio Dutra, ex-governador do RS e ex-ministro, ressaltou a importância de os movimentos voltarem a ter protagonismo nas ruas, mobilizando suas bases e ajudando a organizar a sociedade a partir do protagonismo dos trabalhadores e trabalhadoras.
Relembrando o recente falecimento do papa Francisco, Olívio recordou a proximidade do pontífice com as pautas dos movimentos sociais e conclamou os presentes a engrossar as fileiras para garantir que o seu legado siga frutificando: “É preciso ampliar a área do roçado, para isso precisamos também multiplicar e compartilhar as boas sementes, assim como aumentar a quantidade de mãos dispostas à semeadura e ao cultivo”.

Veja as reivindicações dos pequenos agricultores
1) Para o governo federal:
– Missão Josué de Castro e criação do Fundo Especial de Apoio à Agricultura Camponesa – Fundo Alimento Saudável – FAS.
– Liberação imediata do Pronaf B através da Caixa Econômica Federal.
– Programa de Fomento Produtivo Rural para produzir alimentos.
– Mais recursos e menos burocracia para construção de casas novas e reformas.
– Liberação de recursos e desburocratização do financiamento para comprar terras.
– Recursos para construir cisternas e outros sistemas simples de abastecimento de água.
– Programa de sementes crioulas e varietais para as famílias camponesas, quilombolas e indígenas.
– Financiamento para compra de máquinas e equipamentos adequados para as famílias camponesas.
– Medidas para enfrentar as mudanças climáticas, de modo especial, o Pagamento por Serviços Socioambientais.
2) Para o governo estadual:
– Programa de Recuperação de Solo;
– Programa de Recomposição florestal para propriedades de pequenos agricultores atingidos pelas enchentes em 2023 e 2024.
– Programa de distribuição de sementes crioulas.
– Programa de Irrigação para pequenas propriedades agrícolas.
– Renegociação dos débitos com o Feapper.
– Recursos do Estado para construção de casas – complementação.
Reivindicações dos atingidos e atingidas
– Luta por moradia adequada, segura e saudável: Reconhecimento de todas as famílias atingidas; Por um amplo programa de reassentamento das famílias atingidas; ampliação e prorrogação da política de estadia solidária e aluguel social; regularização fundiária rural e urbana, acompanhado de programa de construção de casas; pelo direito de resistir nos territórios de moradia, sem ações de despejo das famílias atingidas; que sejam promovidas melhorias imediatas nas moradias provisórias para oferecer condições dignas de vida às famílias; acesso ao Auxilio Reconstrução (R$ 5.100,00 federal e R$ 2.500,00 Estado) para todas as famílias atingidas e ampliação do número de parcelas; garantir um crédito para aquisição de móveis para mobília das moradias, isso tanto para casas novas como reformadas.
– A luta para proteção e segurança das comunidades atingidas, levando em consideração: Mapeamento e monitoramento das situações de risco; por ampliação, qualificação e efetivo engajamento da Defesa Civil junto aos grupos de atingidos; que a Política de Assistência Social cumpra seu papel de garantia de direitos; que se desenvolva um programa de educação e capacitação ambiental e de proteção (vigilância sanitária) para boa preparação dos atingidos.
– A luta para fornecimento de comida (cestas de alimentos): Que sejam mantidas as ações de fornecimento de alimentos às famílias atingidas; garantir Programa de Aquisição de Alimentos de famílias de áreas rurais a partir da compra com doação simultânea para as famílias atingidas das áreas urbanas; que seja garantida a doação de gás de cozinha para todas as famílias atingidas de menor renda.
– A luta para ter água e energia elétrica de boa qualidade: Perdão de todas as dívidas de contas de água e luz; instalação de estruturas e equipamentos para melhorar a regularidade, capacidade e a qualidade do serviço de abastecimento de água e luz nas comunidades atingidas; garantir a Tarifa Social de Energia Elétrica para todas as famílias que vivem na mancha de inundação; instalação de cisternas de água (campo e cidade); instalação de placa termossolar e/ou fotovoltaica nas residências das famílias atingidas; construção de poços artesianos e encanamentos de uso comunitário; instalação de filtros doméstico de água em todas as residências das áreas atingidas.
– A luta pelo reconstrução das estruturas públicas de saúde e educação: Reforma, ampliação e reabertura dos espaços de atendimento do Sistema de Saúde Pública (UBS, UPAs, CAPS, Farmácias Populares, Hospitais), e também das escolas e creches das localidades atingidas; que nos espaços e rede básica de saúde das comunidades atingidas tenha melhora da qualidade do atendimento; monitoramento e limpeza dos canais e dutos de esgotamento sanitário e de águas de chuva; destinar recursos para o Programa de Melhorias Sanitárias Domiciliares (Instalação de Kit Banheiro em todas as casas); apoio para mutirões populares de limpeza e coletas de lixos em rios, canais e áreas ribeirinhas; aplicação do Plano de Saneamento Rural e proteção em relação a exposição do uso de agrotóxicos e resíduos de chiqueiros de animais.
– A luta para garantir ampla participação dos atingidos, os mais interessados para uma solução adequada; Que sejam instituídos Grupos de Trabalho para negociação (no município, estado e federal); reconhecimento de todos os atingidos, de acordo com cada realidade, independente de renda que possuía antes da enchente.
