Cirurgião plástico pede afastamento de hospital no RS após denúncias de ex-pacientes por problemas em operações


Polícia Civil registrou 17 queixas contra o médico Leandro Fuchs. Ocorrências descrevem problemas sofridos por mulheres depois das cirurgias e também negligência no atendimento. Cirurgião plástico Leandro Fuchs, em foto no seu perfil no Instagram
Redes sociais/Reprodução
O cirurgião plástico Leandro Fuchs pediu afastamento do Hospital Ernesto Dornelles, onde atuava como chefe do setor, após denúncias de ex-pacientes por problemas após cirurgias e negligência nos atendimentos médicos.
📲 Acesse o canal do g1 RS no WhatsApp
Já foram registradas junto à Polícia Civil 17 queixas, além de haver mais de 10 processos judiciais contra ele. Oito mulheres ouvidas pelo g1 contaram terem feito procedimentos com o profissional entre 2020 e 2023: são histórias de procedimentos sendo realizados por médicos residentes, falta de atenção e acolhimento durante a recuperação depois da cirurgia, sangramentos, infecções, mutilações e deformações (leia mais abaixo).
De acordo com o Hospital Ernesto Dornelles, o afastamento é temporário, feito a pedido do médico, e válido pelo menos até que “o processo de averiguação interna seja finalizado”. Um comitê interno foi criado pela instituição para analisar as denúncias. O prazo para conclusão é de 30 dias e termina em fevereiro.
O g1 entrou em contato com Fuchs na tarde desta terça-feira (30) em busca de uma posição a respeito do caso, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Em nota divulgada no dia 16 deste mês, ele disse que “convicto de que sempre atuei com respeito aos preceitos técnicos, éticos e legais da profissão, estou – e sempre estive – à disposição das autoridades para eventuais esclarecimentos” (leia, abaixo, a íntegra da nota).
LEIA MAIS
Cirurgião plástico é investigado por problemas após operações em Porto Alegre
‘Tenho raiva e vergonha do meu corpo’, diz paciente de cirurgião
Sobe para 17 número de denúncias contra cirurgião
Leandro Fuchs, cirurgião plástico em Porto Alegre, em foto em seu perfil nas redes sociais
Redes sociais/Reprodução
As denúncias
“Só inchaço”
Uma das ex-pacientes de Fuchs, que preferiu não se identificar, conta que consultou com o médico em novembro de 2020.
“Disse que eu ficaria uma Barbie, que tiraria toda a gordura do meu tronco, prometeu que eu ficaria do jeito que eu queria”, lembra.
A cirurgia aconteceu em fevereiro de 2021 e custou R$ 25 mil. Para ela, um sonho de 11 anos que se concretizava. Ela viu que tinha algo errado quando foi chamada para a sala de operação: ele não estava lá. As marcações em seu corpo que indicavam os locais em que haveria intervenções foram feitas por uma médica residente.
“Ele apareceu somente quando eu já estava toda riscada e, aí, viu que algumas marcações estavam erradas. Na mesa de cirurgia, ele rabiscou por cima”, diz.
Durante alta hospitalar, ela diz que o médico não estava e quem deu a liberação foi a residente. Durante a recuperação, teve complicações, mas ele estava viajando e quem atendeu foram residentes. “Eles diziam que era só inchaço”, conta.
“Minha lipo ficou mal feita mesmo após o reparo. Minha cicatriz da abdominoplastia é totalmente torta, parece que foi dado um bisturi com alguém com tremedeira nas mãos. Tive de tatuar nos flancos, pois me atormentava a vergonha de por um biquíni e aquilo aparecer. Meu seio, que ele prometeu ficar no lugar por 10 anos, caiu em 6 meses”, diz.
“Quase morri”
Katiane da Silva conta ter feito o implante de silicone com o cirurgião no ano passado, mas a recuperação do procedimento teve complicações.
“Precisei fazer o explante, pois estava com uma grave infecção. Fui para o Hospital de Clínicas, estava séptica. Muita dor, febre e com a pressão extremamente alta”, conta.
Katiane é enfermeira com um carreira de 20 anos. Jamais pensou que passaria por uma situação como essa.
“Quase morri. Perdi meu emprego, pois eu era PJ (pessoa jurídica). Estou há 7 meses assim”, afirma, dizendo que nunca teve um retorno do médico.
“Torta tu já era”
Ana Cláudia Siqueira relata ter sido operada por Fuchs em 2020 e pagou R$ 19 mil pelos procedimentos. A plástica era na região do abdômen. Hoje, diz estar “completamente frustrada, com baixa autoestima, deprimida e decepcionada”.
“Eu era sacoleira, vendia roupa, calçado, almejava muito, sonhei muito e guardava cada centavo para pagar a cirurgia. Mas deu tudo errado”, conta.
Ana relata que foi pedir satisfações ao médico por conta de como havia ficado o seu corpo. Disse que se via “completamente torta” e ele respondeu “Torta tu já era. Tu estava acima do peso quando te operei”.
“Então por que operou? Ele me disse ‘tu vai ficar maravilhosa, esbelta, linda, perfeita’. Então, ele vendia aquele sonho. Hoje, eu sou completamente torta, tenho raiva e vergonha do meu corpo, dificilmente tenho relação [sexual] e, quando tenho, é no escuro completo para que não vejam meu corpo. Tenho baixa autoestima e pavor do meu corpo. Ele acabou comigo”, conta.
“Se abrir de novo vai ser uma ‘cacaca'”
Outra paciente que não quis se identificar relata que, ao procurar Fuchs após não gostar do resultado da cirurgia estética que havia feito nos seios, ouviu que se abrisse de novo “vai ser uma cacaca”. Disse que, passando mais tempo, poderia fazer o reparo.
Ao g1, a paciente, diz que seus seios foram mutilados, que foi abalada psicologicamente, se separou e não tem condições de fazer um reparo, pois é uma cirurgia cara, e não confia em Fuchs para o procedimento.
Residentes faziam cirurgias
Outra paciente, que também não quis se identificar, passou por uma abdominoplastia e lipoaspiração em janeiro de 2023. O custo foi de R$ 18,6 mil. Ela disse que foi operada por dois médicos residentes. Após os procedimentos, teve duas infecções e seus pontos começaram a se abrir.
“Ele me disse que era normal, que tudo ia ficar bem”, conta.
A situação não melhorou e ela procurou outro hospital e outro médico. Passou por tratamento e só voltou a trabalhar em maio.
“Pretendo processar”, afirma.
Outra paciente conta que acredita que o médico marque muitas cirurgias para o mesmo dia, razão pela qual residentes acabam assumindo.
“Pude perceber porque ele está sempre no consultório e tem agenda fácil para operar, marca muita cirurgia no mesmo dia, uma cirurgia que leva horas, não daria para se fazer tantas”.
Paciente mostra cicatriz após a cirurgia
Reprodução/RBS TV
“Estava me cuidando errado”
Luana Machado Fantinel passou por cirurgia com Fuchs há um ano. Hoje, sente vergonha de usar biquínis ou roupas curtas.
“Minha cicatriz começou a alargar demais. Ele falou que era normal. Ele até arruma, segundo ele, porém isso tem custo e não tenho como. Além disso, tenho medo. Quando estive no escritório dele, logo que começou, falou que estava me cuidando errado. Mandou eu repousar mais. Que ficaria bom e me mandou fazer curativo. Nunca ficou”, conta.
Outra paciente relata que está com a “cicatriz torta, lipo mal feita, seio que caiu porque ele disse que meu seroma era só inchaço. Mas eu estou sem dinheiro pra pagar advogado. Falas dele: ‘é reação do teu corpo’, ‘olha como você era antes e agora’, ‘tem que esperar desinchar’, ‘continua as drenagens’, ‘daqui a seis meses volta para avaliarmos'”
Luana Fantinel relata que ficou com problemas na cicatriz após passar por cirurgia plástica
Reprodução/RBS TV
“Reparação física e moral”
O advogado Axel Rodrigues Pimentel representa 20 ex-pacientes do médico e conta que as ações judiciais querem “uma reparação física e moral a todas essas mulheres”.
“Essas mulheres juntaram economias ou fizeram empréstimos com intuito de realizar um sonho e foram literalmente mutiladas e encontram-se revoltadas e humilhadas”, afirma.
Ele conta que uma de suas clientes lhe procurou há algum tempo para relatar que Fuchs teria feito de forma incorreta o procedimento estético pelo qual passou, tendo sofrido com infecções e que não houve atenção e zelo do médico após a cirurgia. Depois, outras três mulheres buscaram o assessoramento dele.
Por meio delas, tomou conhecimento de um grupo no WhatsApp que reúne mulheres que foram pacientes de Fuchs. Há mais de 60 integrantes e os relatos e as imagens compartilhados são de diversos problemas médicos, como infecções, falta de cuidado e descaso com as reclamações.
“Neste momento, estou com aproximadamente vinte ações indenizatórias para serem ingressadas contra o médico e contra o hospital onde foram feitos os procedimentos. O número de ingresso de ações está aumentando a cada dia, haja vista que muitas mulheres que sofreram mutilações estavam com vergonha ou medo de denunciar e, agora, estão tomando a frente e divulgando”, afirma.
Relembre abaixo reportagem com as denúncias contra o médico
Polícia investiga denúncias contra médico por negligência em atendimentos
Nota do médico Leandro Fuchs
“NOTA À IMPRENSA
Exerço a Medicina há aproximadamente 30 anos, sempre tendo pautado os meus atendimentos pelo extremo respeito aos aspectos técnicos e éticos da profissão. Sou especialista em Cirurgia Plástica há mais de duas décadas e, atualmente, além de membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, atuo como regente no Hospital Ernesto Dornelles, onde oriento médicos graduados, com residência concluída em Cirurgia Geral, que estão se especializando em Cirurgia Plástica.
No que diz respeito às matérias veiculadas na imprensa, manifesto a seguinte posição:
i) todo procedimento cirúrgico está sujeito a riscos inerentes e a intercorrências estatisticamente comprovadas pela literatura médica e pela ciência, que são devidamente comunicados e consentidos pelos pacientes;
ii) a plena recuperação depende de diversos fatores, inclusive da rigorosa observância das recomendações médicas para o período pós-operatório;
iii) tirar conclusões precipitadas neste momento se constitui em desrespeito inclusive aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Convicto de que sempre atuei com respeito aos preceitos técnicos, éticos e legais da profissão, estou – e sempre estive – à disposição das autoridades para eventuais esclarecimentos.
Mantenho a convicção de que, ao final de todos os procedimentos investigatórios em curso, a verdade irá demonstrar a exatidão do aqui afirmado por mim.
Porto Alegre, 16 de janeiro de 2024”
VÍDEOS: Tudo sobre o RS
Adicionar aos favoritos o Link permanente.