Polícia Civil indicia três PMs por morte de funcionário da Embasa; trabalhador estava desarmado quando foi abordado por agentes


Welson Figueredo Macedo, de 28 anos, foi baleado no bairro de Castelo Branco, em julho deste ano. Imagens e depoimentos contestaram versão apresentada pelos policiais. Welson Figueredo Macedo morreu após ser baleado com um tiro nas costas, em Salvador
Reprodução/Redes Sociais
A Polícia Civil concluiu um inquérito sobre a morte do jovem Welson Figueredo Macedo, de 28 anos. O funcionário terceirizado da Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa) morreu após ser baleado por um policial militar na noite de 9 de julho, no bairro de Castelo Branco.
À época, a PM disse que Welson era suspeito de roubar um casal e que ele teria sido atingido em meio a uma troca de tiros com os agentes. No entanto, imagens de câmeras de segurança contestam essa versão.
Os vídeos obtidos com exclusividade pela produção da TV Bahia mostram que Welson saiu do trabalho de moto, deixou um colega em casa e, minutos depois, foi abordado pelos PMs. Ele estava desarmado, com as duas mãos no guidão, enquanto pilotava o veículo.
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Em depoimento, as vítimas do assalto também disseram que não reconheceram Welson como um dos assaltantes.
Com base nessas e outras informações, os investigadores decidiram indiciar os três policiais militares envolvidos na ocorrência por homicídio e fraude processual. O inquérito foi remetido ao Ministério Público da Bahia (MP-BA) na segunda-feira (9).
Agora cabe ao órgão dar seguimento ao processo para avaliar se denuncia, ou não, os agentes à Justiça.
Em nota, a Polícia Militar lembrou que falta apenas o resultado dos laudos periciais para a conclusão da sindicância aberta internamente. Se constatarem a responsabilidade dos agentes no crime, eles podem ser demitidos da corporação.
Família luta por justiça
Os parentes do jovem Welson Figueredo Macedo lutam por justiça à memória dele enquanto lidam com o luto da perda. Para o pai do jovem, Elieson Macedo, tem sido difícil lidar com a dor.
“A família está destruída. Destruíram toda a minha família e a família de meu filho”, declarou em entrevista ao Bahia Meio Dia, telejornal da TV Bahia.
De acordo com Macedo, a mãe de Welson precisou sair do trabalho, pois segue muito abalada. O jovem deixou ainda esposa e um filho de 8 anos.
Welson deixou esposa e um filho de oito anos
Reprodução/Redes sociais
Relembre o caso
Em nota divulgada à época, a PM disse que agentes da 47ª Companhia Independente (CIPM/Pau da Lima) faziam rondas na região, quando avistaram três suspeitos assaltando um casal. Com a aproximação, o trio teria atirado contra a viatura e fugido em seguida.
Momentos depois, a corporação teria recebido denúncias de que eles estavam no fim de linha do bairro. Com isso, teria ocorrido troca de tiros entre agentes e suspeitos, com um dos criminosos baleado. O suposto assaltante seria Welson, levado para o Hospital Eládio Lasserre, onde morreu durante uma cirurgia. Os militares teriam ainda apreendido com ele um revólver e munições de calibre 38, além da motocicleta.
Cerca de quatro meses após o crime, a TV Bahia reuniu informações que contestam os relatos policiais. Tanto imagens da área quanto os depoimentos das vítimas do assalto indicam que Welson não estava armado. Confira:
O que mostram as imagens
Câmera de segurança mostra momento em que terceirizado da Embasa é baleado na Bahia
De acordo com a Embasa, o funcionário trabalhou regularmente o dia inteiro no dia 9 de julho. Registros da empresa mostram que ele deixou o posto de trabalho às 19h18, pilotando uma moto e com um colega na garupa.
Um outro vídeo, às 19h46, mostra Welson sozinho, trafegando pela praça de Castelo Branco após deixar o amigo em casa. Foram apenas quatro minutos entre o ponto onde ele deixou o parceiro e foi interceptado pela polícia, na Rua Caminho 35.
O relógio marcava 19h50 quando Welson foi visto desarmado e recebendo o tiro. Pelas imagens, é possível ver que a vítima levantou uma das mãos no momento em que policiais e a viatura se aproximaram.
Depois, às 19h52, um dos agentes levantou a moto e colocou o veículo no canto da pista.
Na sequência, os agentes mudaram a posição de Welson e suspenderam a camisa dele. Oito minutos se passaram até que a viatura da 47ª CIPM/Pau da Lima se movimentou e uma segunda viatura, da mesma companhia, chegou ao local.
Somente às 19h59, Welson foi colocado no carro dessa segunda equipe, que não participou da ação inicial. Às 20h, exatos 10 minutos após o disparo, ele foi levado para o Hospital Eládio Lasserre.
O trabalhador chegou vivo à unidade de saúde, passou por cirurgia, mas morreu às 21h20. A perícia aponta que a causa da morte foi traumatismo abdominal provocado por arma de fogo.
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O que apontam os depoimentos
O médico que atendeu Welson confirmou que ele deu entrada no hospital com farda e crachá da Embasa. De acordo com o profissional de saúde, o jovem estava acordado e consciente, mas não chegou a dizer quem disparou o tiro. Policiais militares estavam presentes no momento do atendimento.
Conforme apurado pela TV Bahia, o inquérito policial constatou as divergências nos depoimentos dos militares. Os PMs afirmaram que a viatura usada na ocorrência estava danificada e sem condições de trafegar até o hospital, por isso teriam acionado a segunda equipe. Porém, o veículo da 47ª CIPM/Pau da Lima percorreu 4,5 km até a base policial — a distância entre a Rua 35, local da ocorrência, e a unidade de saúde era menor: 4,2 km.
Os agentes também disseram em depoimento que, após confronto com os suspeitos e o pedido de socorro, várias pessoas teriam se aproximado do local, entre elas as vítimas do roubo. De acordo com os militares, a mulher roubada teria reconhecido o trabalhador baleado como um dos autores do crime ao apontar e dizer, repetidamente: “Foi ele”.
No entanto, o casal que teve a moto roubada não confirmou essa versão em depoimento. O rapaz disse que foi questionado se o homem caído era o ladrão, mas respondeu que não sabia. Ele disse que os militares, então, afirmaram que Welson estava junto com os outros suspeitos.
Já a moça declarou: “Nem cheguei perto do homem que estava ao solo. Só passei perto ao atravessar, mas nem olhei para o rosto dele. Em nenhum momento, os policiais mostraram alguma arma que estaria com o homem ao solo nem outros objetos. Não tenho como afirmar que o indivíduo que estava ao solo foi um dos autores do roubo que sofri”.
Além disso, a perícia da Polícia Civil não encontrou cartuchos de munição ou vestígios de troca de tiros.
Diante dos fatos que vieram à tona, a TV Bahia voltou a procurar as forças de segurança. Em nova nota, a Polícia Militar disse que uma sindicância foi instaurada pela Corregedoria, “com o objetivo de investigar denúncias sobre possível excesso cometido por parte dos policiais envolvidos na ocorrência”. Segundo a corporação, a sindicância encontra-se em fase final de apuração — a pendência é a conclusão de laudos periciais.
Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), em Salvador
Natally Acioli/g1 BA
Também por meio de nota, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) informou que determinou a apuração do caso e reforçou que a Corregedoria e o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil investigam a morte.
Em 27 de novembro, a assessoria do Ministério Público da Bahia informou, por meio de nota, “que acompanha com rigor as investigações do caso, que correm sob sigilo”. O MP sinalizou que o inquérito policial estava em andamento de forma regular e o “prazo para conclusão da investigação foi estendido com o objetivo de que sejam exauridas todas as diligências investigativas necessárias para produção de provas técnicas”.
Comoção na despedida
Terceirizados da Embasa fazem carreata após morte de colega em ação policial na BA
O sepultamento do corpo de Welson foi marcado por homenagens e indignação por parte de colegas e parentes diante da morte. Dois dias após o óbito, em 11 de julho, eles saíram em carreata, pedindo justiça pelo trabalhador. O grupo foi recebido pela Corregedoria da Polícia Militar, ocasião em que cobrou celeridade nas investigações.
Welson era natural de Ipirá, a cerca de 100 km de Salvador, mas morava na capital baiana há anos. Há 12 anos, prestava serviços terceirizados para a Embasa.
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