Janeiro Branco: saúde mental dos pets também deve ser levada a sério

Saiba o que causa e como identificar problemas de saúde mental nos animais de estimaçãoBruno Cervera/Pexels

O fato de que os animais de estimação podem ajudar as pessoas em relação a diversos fatores emocionais — tal como existem os animais de apoio, de assistência, entre outros — já é um fator bastante difundido entre especialistas no assunto. Contudo, pouco se fala quando o caminho é o inverso: como os humanos podem ajudar na saúde mental dos animais de estimação?

Como uma forma de conscientização, a campanha Janeiro Branco, surgida em 2014, foi também adotada pela medicina veterinária para colocar em evidência os cuidados com a saúde mental de cães, gatos, e outros animais domésticos.

Em 2015, o Senado instituiu o Estatuto dos Animais, decretando a lei que garante o acesso à informação sobre o bem-estar dos animais e outras obrigações, como:

  • Estímulo à conscientização e à educação para a guarda responsável;
  • Combate aos maus-tratos e toda forma de violência, crueldade e negligência praticadas contra os animais;
  • Proteção dos animais contra sofrimentos desnecessários, prolongados e evitáveis;
  • Promoção da saúde dos animais.

    Mesmo com a existência de leis que visam amparar os bichanos, especialmente cães e gatos, casos de abandono e maus-tratos ainda ocorrem por todo o país ocasionando sofrimento psiquíco aos pets.

    A médica veterinária Caról Luz, especialista em comportamento e adestradora, que atende pela rede Pet Care, aponta outros fatores que podem causar problemas emocionais em cães e gatos.

    “Considerando os cinco domínios do bem-estar animal, se algum deles estiver comprometido, então, teremos o acometimento negativo do domínio emocional [mental] do animal”, diz a especialista.

    Caról explica que o “modelo dos cinco domínios”, proposto por Mellor e Reid (1994), atua como um método sistemático de avaliação do estado de bem-estar de um animal, a partir de quatro domínios físicos ou funcionais — Nutrição, Ambiente, Saúde e Comportamento —, e um domínio mental — Estado Mental ou Afetivo.

    “Para avaliarmos o estado de bem estar de um indivíduo, precisamos verificar como está o atendimento das necessidades de todos esses cinco domínios, que são: nutricional, ambiental, fisiológico [saúde], comportamental, e todos esses compões o quinto domínio, que é o mental afetivo”, detalha a especialista, apontando, na sequência, alguns fatores podem gerar problemas emocionais nos pets.

    Em gatos:

    • Má nutrição;
    • Problemas de saúde/ doenças que geram dor e desconforto físico. Exemplos: insuficiência renal/asma/ dor em coluna/ joelhos/ problemas gástricos, ortopédicos, dermatológicos e endócrinos;
    • Privação do comportamento natural da espécie: gatos precisam pular, arranhar, se esfregar, caçar, perseguir, abocanhar, morder, brincar, lamber, etc;
    • Presença de outro gato e número reduzido e/ou má alocação de recursos como potes de água e comida, caixa de areia, caminhas, tocas, arranhadores, brinquedos, carinho, o próprio tutor, entre outros. A quantidade de um recurso deve ser o número de gatos + 1 e em diferentes cômodos da casa;
    • Falta de manejo/rotina adequados: alimentação, defecação e micção em local inapropriado, falta de enriquecimento ambiental e brincadeiras funcionais, físicas, cognitivas, sociais, alimentares e sensoriais;
    • Passeios, passeios de carro, idas ao veterinário, festas, visitas, a chegada de um bebê, dia de jogos, fogos de artifício, exames, manipulação excessiva, barulhos muito altos;
    • Falta de conhecimento/respeito à linguagem corporal felina e ao espaço dos gatos.

    Em cães:

    • Má nutrição;
    • Problemas de saúde/ doenças que geram dor e desconforto físico. Exemplos: problemas gástricos (dentes quebrados/doença inflamatória intestinal), ortopédicos (discopatia/luxação de patela/displasia), dermatológicos (dermatite atópica)  e endócrinos (hiperadrenocorticismo);
    • Privação do comportamento natural da espécie: cães precisam, correr, caçar, perseguir, abocanhar, morder, brincar, lamber, cavar, etc;
    • Em casas com mais de um cão, se houver número reduzido de recursos, o bem-estar emocional pode estar comprometido, pois gerará competição e conflitos: Exemplos de recursos:  pote de água, pote de comida, mordedores, caminhas, casinhas, brinquedos, carinho, o próprio tutor, etc. A quantidade de um recurso deve ser no mínimo a quantidade de cães na casa;
    • Falta de manejo/rotina adequados: alimentação, falta de passeios, falta de enriquecimento ambiental e brincadeiras funcionais, físicas, cognitivas, sociais, alimentares e sensoriais;
    • Passeios, passeios de carro, idas ao veterinário, festas, visitas, a chegada de um bebê, dia de jogos, fogos de artifício, exames, manipulação excessiva, barulhos muito altos;
    • Falta de conhecimento dos sinais de desconforto caninos e falta de respeito à linguagem corporal canina.

    Como identificar que os pets não estão emocionalmente bem?

    A médica veterinária indica também que os tutores observem os sinais dados pelos animais por meio das linguagens/posturas corporais e expressões faciais dos bichanos. Confira alguns exemplos:

    Sinais de um cão relaxado:

    • Face relaxada;
    • Lábios relaxados;
    • Orelhas relaxadas (nem em pé alerta, nem para trás com medo);
    • Cauda mantida na linha ou acima da coluna, balançando.

    Sinais de um cão estressado:

    • Corpo abaixado/encolhido;
    • Cauda para baixo;
    • Rosto tenso;
    • Pupilas dilatadas;
    • Sobrancelha enrugada.

    Sinais de um gato relaxado:

    • Face relaxada;
    • Orelhas para frente;
    • Pupilas em formato de amêndoa;
    • Cauda longe do corpo;
    • Patas e pernas relaxadas afastadas do corpo.

    Sinais de um gato estressado:

    • Corpo encolhido;
    • Costas arqueadas;
    • Cauda dobrada;
    • Pupilas dilatadas (redondas);
    • Orelhas para trás;
    • Assobiando.

    O site “Fear Free Pets” (“Pets Sem Medo”, em uma tradução livre) tem uma lista de posturas que indicam as emoções dos animais, conforme mostra o Programa de Certificação Veterinária. A lista se chama “O espectro do medo, da ansiedade e do estresse”. Confira nas imagens abaixo:

    Fatores emocionais podem afetar diretamente a saúde física dos pets?

    “Com toda certeza”, garante a especialista. “Da mesma forma que fatores físicos podem afetar a saúde mental dos pets, fatores emocionais poderão comprometer o físico do animal. Por exemplo: o distresse [estresse crônico] caracterizado pela alta e constante liberação do Cortisol [hormônio do estresse] leva à redução da imunidade, abrindo portas para demais doenças.”

    Para os animais de estimação, seja os que passam horas do dia sozinhos, ou mesmo os que têm a constante presença dos tutores, é fundamental ter opções para fugir do tédio e aliviar o estresse, o que é conhecido como “enriquecimento ambiental”, uma forma de fazer com que o pet possa exercitar seus instintos, mesmo dentro de casa. Caról Luz dá algumas dicas neste sentindo:

    • Uso de comedouros lentos funcionais, tabuleiros interativos, forminha de gelo, o próprio pote de ração ao contrário, rolo de papel, caixa de sapato, caixa de ovo, garrafa pet com ração dentro, ração enrolada na toalha, ração escondida em pequenas caixas (de remédio, por exemplo), brinquedos recheáveis (Petball, Kong, Bonequinha,) tapete de fuçar (forrageio), entre outros;
    • Usar a porção de ração para treiná-los (senta, deita, dar a pata, entre outros comandos);
    • Mordedores naturais (chifre, casco, traqueia, rótula, esôfago, costela, orelha, osso, vergalho de boi; orelha de porco; orelha de coelho, cenoura, chuchu, abobrinha, etc);
    • Mordedores de nylon, flex, soft, de madeira, etc;
    • Plantas atóxicas: capim de milho de pipoca ou alpiste/manjericão/alecrim/camomila/lavanda, etc;
    • Varinhas, arranhadores (sem ser de sisal), caixa de papelão, bolinhas;
    • Lembre-se sempre de monitorar a brincadeira e alternar os brinquedos diariamente para não perderem o valor;
    • Formar pista de obstáculos em casa com almofada/caminha/sapatos e fazer o pet percorrer.

    Em caso de dúvidas, a especialista em comportamento indica que os tutores procurem a ajuda de um médico veterinário de confiança e que, de preferência, já conheça o histórico do animal.

    Ativismo

    Tentando contribuir para a causa animal, a enfermeira e influenciadora digital Natália Borges, de Salvador, na Bahia, usa as redes sociais de suas cadelas de estimação, Amora e Love, como um meio de dar visibilidade para o tema.

    Natália decidiu se dedicar seu trabalho nas redes sociais para ajudar em causas de proteção animalReprodução/Natália Borges

    Natália decidiu dedicar seu trabalho à ajuda quando tomou a decisão de aumentar a família. “Não imaginava o tamanho da mudança que nossos filhotes [pets] trariam às nossas vidas”, conta a influenciadora ao Canal do Pet.

    “Amora foi a primeira a conquistar o coração da família. Logo depois chegou Love. Em pouco tempo, o dia a dia ficou mais feliz com os latidos, brincadeiras e o transbordar de sentimentos puros”, diz a enfermeira.

    Ela comenta ainda que em 2021, no auge da pandemia da Covid-19, começou a receber muitas mensagens de carinho dos seguidores, que também enviavam dúvidas e solicitações de ajuda.

    “Foi assim que percebi que era possível ajudar as pessoas por meio da internet. Criei uma consultoria em que por ligação ajudava famílias com orientações, ajustes de rotina, indicações de profissionais e serviços. A partir daí o perfil foi crescendo e nos tornamos uma grande rede de amor”, comenta Natália, que reforça que transformou o amor que sente por suas pets em um “instrumento para defesa e cuidado dos animais”.

    Com o trabalho nas redes sociais a influenciadora, que hoje conta com mais de 37 mil seguidores, conheceu e se aproximou de ONGs e profissionais que atuam na área de proteção e ajuda aos animais de todo o Brasil.

    Esse trabalho a levou a conhecer histórias de diversos animais, como o caso de Vencedor. “A história de Vencedor, cão que foi resgatado e precisou de apoio para realização de uma cirurgia fundamental para manutenção de sua vida, chegou pelo nosso Instagram por uma mensagem de socorro”, conta a enfermeira.

    “Dentre tantas mensagens que recebemos diariamente, essa em especial chamou minha atenção. A pessoa me informou já ter pedido auxílio a vários perfis e nunca ter tido retorno. Quando terminei de ler a história dele, não consegui conter as lágrimas. Entrei em contato telefônico e fui, no dia seguinte, ao abrigo onde ele é mantido numa cidade vizinha de Salvador”, conta a influenciadora.

    “Além de conhecer Vencedor, conheci também a história de muitos animais que vivem nesse abrigo e enfrentam diversas dificuldades. Vencedor precisava de apoio para realização de uma cirurgia fundamental para manutenção de sua vida. Foi assim que criamos a campanha ‘Ajude Vencedor’, um sucesso de compartilhamentos.”

    A influenciadora continua: “Com a ajuda de nossos parceiros, conseguimos oferecer gratuitamente todos os exames pré-operatórios, banho e medicamentos necessários, além de apoio por meio da divulgação de campanha nas redes sociais para arrecadação financeira para realização da cirurgia e pós-operatório.”

    Impacto das ações humanas na saúde mental dos pets

    Para Natália a relação dos humanos com os pets impacta diretamente a saúde mental dos animais. “Assim como os humanos eles também podem sofrer com ansiedade, depressão e estresse, impactando diretamente a vida do tutor e de sua família.”

    A influenciadora diz ainda que usa a internet como “um instrumento de ajuda para as famílias […] além de compartilhar histórias impactantes e informações sobre como as pessoas podem fazer a diferença na vida dos animais.”

    Ela finaliza: “Isso ajuda a mobilizar a comunidade e sensibilizar as pessoas para questões relacionadas aos direitos e ao bem-estar dos animais. Esse é o meu principal objetivo do trabalho na internet: influenciar com propósito.”

    É importante estar alerta aos sinais que os pets nos dãoshutterstock

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