Adolescente sofre necrose nos dentes após fazer aplicação de lentes com mulher que não é dentista; FOTOS


Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP) afirma que o procedimento deve ser realizado em clínicas odontológicas e apenas por um cirurgião-dentista. Jovem ficou com os dentes desgastados e escuros após aplicação de lentes de resina fora de consultório odontológico
Arquivo Pessoal
Uma adolescente, de 17 anos, teve os dentes desgastados com necrose pulpar e óssea [morte da polpa dentária e dos ossos] após fazer a aplicação de lentes de resina com uma mulher que não era dentista. Ao g1, Agatha Yolanda Nascimento dos Santos Caires disse ter pago R$ 1 mil pelo procedimento. “Não tinha noção que ela não era dentista”, desabafou.
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Moradora de São Vicente, no litoral de São Paulo, Agatha contou ter conhecido a mulher por meio do pai, que é pedreiro e havia sido contratado pela profissional. Segundo o relato, o homem decidiu presentear a filha com a aplicação das lentes após ver “muitas pessoas” passando pelo procedimento.
“Ele [o pai] conversou com ela [a mulher] sobre o valor das lentes, porque eu queria colocar e já estava procurando um profissional, só que a gente não tinha noção que ela não era dentista, entendeu?”, relatou a adolescente.
De acordo com ela, Andreza Aline Gasparini Lima cobrou inicialmente R$ 1,2 mil pelo serviço, mas fechou o acordo por R$ 1 mil para o pai dela, sendo que metade seria descontada do trabalho dele como pedreiro e o restante em transferência via Pix.
Ao g1, o advogado Gabriel Ferreira Lacerda, que representa Andreza Aline, informou que ela é considerada “hábil” para prestar o serviço de aplicação de lentes de resina. Ele acrescentou que a cliente “não se passou por dentista e tampouco exerceu a função” (veja o posicionamento completo adiante).
Jovem de 17 anos ficou com os dentes desgastados e escuros após aplicação de lentes de resina
Arquivo Pessoal
Procedimento
A aplicação aconteceu em junho deste ano, na casa de Andreza, em São Vicente (SP). Agatha contou que voltou ao local três dias depois do procedimento, uma vez que três lentes tinham caído. Segundo a jovem, a profissional justificou a situação dizendo que ela não tomou os cuidados necessários.
“Não conheço o material de dentista só que vi que algumas coisas que ela estava usando eram muito parecidas com [os utensílios] de manicure”, disse Agatha. “Ainda falei para ela que parecia, e ela falou que realmente parecia, só que não era, que eram materiais profissionais”.
A jovem acrescentou ter questionado a mulher sobre as lentes estarem “coladas”, impedindo o uso do fio dental. De acordo com a adolescente, Andreza Aline passou uma “broca” nos dentes dela e orientou que tentasse novamente, mas sem sucesso.
Agatha relatou que outras lentes caíram em seguida, mas sequer voltou à residência da mulher para não ser cobrada pelo serviço. Ela passou a sentir incômodo na gengiva e percebeu que a arcada dentária estava ficando “escura”.
Preocupada, a adolescente encaminhou uma foto para a irmã, que é estudante de odontologia. A parente recomendou que ela procurasse uma clínica odontológica com urgência para remover as lentes, pois estava com infiltração nos dentes e com a gengiva inflamada.
Após a remoção, a jovem iniciou um tratamento caseiro antes de seguir com o odontológico.
“Comprei um enxaguante bucal próprio pra gengivite, que a dentista me recomendou, e estou tomando um remédio também”, desabafou ela. “[Fiquei] bem triste, né? Com 17 anos estou com dente assim, escuro e feio. É horrível”.
Agatha disse ter entrado novamente em contato com Andreza, mas a mulher negou que o serviço tenha causado os problemas. “Ela mentiu bastante. Falou que fiz muito mais coisa lá do que as lentes e resina, que ela fez mais trabalhos na minha boca”, afirmou a jovem.
Advogado da mulher
Gabriel Ferreira Lacerda, o advogado de defesa de Andreza Aline Gasparini Lima, informou que a cliente pode para prestar o serviço de aplicação de lentes.
De acordo com o advogado, o serviço foi realizado “sem custos”, em um acordo baseado nos serviços do pai de Agatha na casa de Andreza Aline. As obras, ainda segundo a defesa da mulher, não foram feitas pelo pedreiro.
Foto mostra os dentes de Agatha Yolanda durante a remoção das lentes
Arquivo Pessoal
Pai ficou ‘decepcionado’
O pedreiro Fabrício Tavares dos Santos Caires, de 41 anos, considerou um “erro” ter contratado Andreza Aline.
“Estou decepcionado porque ouvi todos os argumentos dela com a minha filha no telefone e não houve nenhum reconhecimento de erro. Ela sempre quer ter razão no que foi feito e em momento nenhum revê os erros”, afirmou ele.
Um documento assinado por um dentista formado, obtido pelo g1, aponta a condição dos dentes de Agatha. O profissional declarou que a paciente apresentava “quadro infeccioso periodontal”.
“Dentes desgastados com necrose pulpar analisada em radiografia, necrose óssea devido a má adaptação de facetas em resina, facetas infiltradas e mal adaptadas, ocasionando em quadro grave de periodontite”, descreveu o dentista.
O que diz o CROSP
O Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP) declarou, com base na Lei Federal 5.081/66, que compete ao cirurgião-dentista, habilitado e com inscrição ativa, praticar os atos pertinentes à odontologia, inclusive o procedimento mencionado.
“Diante das normas vigentes da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Vigilâncias Sanitárias, a assistência odontológica deve ocorrer em ambiente estruturado e licenciado como estabelecimento odontológico”, afirmou o CROSP.
Em nota, o conselho acrescentou que, em pesquisas feitas junto ao banco de dados dos profissionais inscritos do Conselho Federal e Regional de Odontologia (CFO e CROSP), não foi possível localizar registro profissional em nome de Andreza Aline Gasparini Lima.
O CROSP informou que “adota providências à apuração de infrações às normas éticas praticadas pelos respectivos inscritos, respeitado o direito de defesa, o sigilo legal dos procedimentos internos”.
Além disso, se for necessário, o CROSP também pode notificar outros órgãos pertinentes, como Polícia Militar e Vigilância Sanitária, para que sejam adotadas outras medidas condizentes com a infração identificada.
A família da jovem registrou um boletim de ocorrência pela internet. O g1 entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), em busca de mais informações, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
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