HÁ VINTE ANOS – Um presidente frouxo, com medo da farda

Por desinformação, falta de vontade para criticar o presidente da República ou medo de perder fontes de informação dentro do governo, boa parte dos jornalistas joga na conta do ministro José Viegas, da Defesa, o desastroso episódio que resultou em uma nota do Exército defendendo a ditadura de 64 e a tortura.

Viegas é apontado como um ministro fraco, que não manda nos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, e que só agiu no episódio depois de cobrado pelo presidente. Deveria ter demitido o Comandante do Exército e não o fez – por medo ou pusilanimidade. Nada mais falso.

O ministro foi surpreendido no último domingo com uma nota da Comunicação Social do Exército publicada pelo jornal Correio Braziliense. Com o carcomido discurso de antigamente, ela defendia a ditadura e o emprego da tortura contra seus desafetos. Viegas redigiu um ofício cobrando explicações ao general Francisco Albuquerque, Comandante do Exército. Convocou-o à sua casa para lhe entregar o ofício em mãos. Deu-lhe um prazo de 24 horas para responder ao ofício.

Na manhã do dia seguinte, antes mesmo de conhecer a resposta do general, foi ao encontro de Lula na Base Aérea de Brasília. Já o tinha alertado, e aos ministros José Dirceu, da Casa Civil, e da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sobre a gravidade do caso. Sugeriu aos três a demissão do Comandante do Exército que há muito tempo afronta sua autoridade com o respaldo de aliados como o senador Aloizio Mercadante e o ministro Luiz Gushiken.

Lula preferiu esperar a resposta do general ao ofício. O general mentiu na sua resposta. Disse que não tomou conhecimento da nota antes de vê-la publicada. Ele recebeu o esboço da nota em Nova Iorque, onde se encontrava na sexta-feira. Aprovou-a. Lula fez de conta de que acreditou no general. Mandou-o redigir nova nota desautorizando a anterior. E se contentou com ela.

Se Viegas errou, e a meu ver errou, foi porque não pediu demissão. Que deixasse Lula arcar com o ônus de acreditar na mentira de um general. E de não ter coragem de impor sua autoridade a quem lhe deve obediência.

O general deveria ter perdido o comando porque mentiu ao presidente da República e ao seu superior imediato, o ministro da Defesa. Na melhor das hipóteses, deveria ter perdido o comando porque não comanda sequer seus subordinados encarregados de divulgar notas em nome do Exército.

Lula não foi sábio nem prudente ao fingir acreditar numa farsa. Foi frouxo.

 

(Publicado aqui em 24 de outubro de 2004)

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