Identidade de futuro

Identidade de futuroEduardo Rocha

Modelo de negócio

O crossover elétrico Volkswagen ID.4 é dinâmico e charmoso, mas só está disponível para aluguel

por Eduardo Rocha

Auto Press

A defasagem entre os mercados centrais de Estados Unidos e Europa e os periféricos como o Brasil criou uma situação inusitada para os veículos elétricos. Lá fora, eles começam a enfrentar um certo dilema por conta do limite de vida útil das baterias – que não têm uma destinação coerente com uma proposta ecológica e desvaloriza ferozmente os usados. Por aqui, no entanto, o mercado está numa fase anterior do jogo, quando o consumidor ainda se deixa levar pela novidade. Por isso a participação dos eletrificados é­ crescente – foi de 9,1% até agosto de 2024 –, além de darem enorme visibilidade às marcas. O resultado é que todas elas acabam investindo no setor. No caso da Volkswagen, a opção foi por trazer apenas dois modelos 100 elétricos – o furgão ID.Buzz e o crossover médio ID.4, que é o modelo avaliado.

O ID.Buzz foi escolhido por fazer um apelo à memória afetiva dos brasileiros – tanto que só é chamada de Kombi elétrica –, mas o ID.4 tem credenciais bem concretas, como o fato de ter sido o carro elétrico mais vendido na Europa em 2023, com cerca de 170 mil unidades emplacadas. No Brasil, no entanto, a realidade é bem diversa. Por isso, a Volkswagen decidiu oferecer os dois modelos somente na modalidade de aluguel. A princípio, o valor era de R$ 9.990 mensais, em um contrato de dois anos para rodar 36 mil km. Com o choque de preços ocorrido com a entrada da BYD no mercado, esse custo mensal caiu 30%, para R$ 6.990. Mesmo assim, até agosto, o ID.4 teve apenas 73 unidades emplacadas no país em 2024.

Esse resultado tem mais a ver com o mercado do que com o carro. Para começar, nem lá fora o ID.4 tem preço acessível – custa a partir de 44 mil euros, ou R$ 270 mil, mesmo preço de um BMW iX2, que custa no Brasil R$ 450 mil. Outra questão é que esse modelo de aluguel a modalidade é novo por aqui. A única versão oferecida no Brasil é a Pro. Trata-se de uma configuração intermediária na Europa, mas é bem equipada. Ela traz os faróis, lanternas e a barra central da grade dianteira em led, as rodas são de 21 polegadas, painel de instrumentos digital de 5,3 polegadas e central multimídia com tela de 10 polegadas com espelhamento sem fio de Apple Carplay e Android Auto.

O modelo chega com sete airbags e recursos ADAS Nível 2 (controle de cruzeiro adaptativo, sensores laterais, frenagem autônoma de emergência com função Stop&Go, assistente de conversão e centralizador de faixa de rolagem etc). Uma novidade é o novo sistema de estacionamento automático da marca, que além de manobrar o carro em vagas paralelas ou perpendiculares, é capaz de memorizar trajetos de 50 metros para percorrer autonomamente até estacionar.

Na parte de conforto, o modelo conta com revestimento em couro sintético e tecido e banco do motorista com ajuste elétrico, aquecimento e massagem. Tem ainda carregador de celular por indução, ar-condicionado de três zonas e iluminação interno por uma fita de led que percorre o painel de cor configurável, abertura e fechamento elétricos da tampa do porta-malas, câmera 360° e teto panorâmico de vidro.

O ID.4 Pro avaliado modelo 2023 era equipado com um único motor traseiro de 150 kW – 204 cv – e 31,6 kgfm de torque, com câmbio de marcha única e tração nas rodas traseiras, alimentado por uma bateria de 77 kW. Na Europa, a versão Pro 2024 passou a oferecer 286 cv e 55,6 kgfm, com uma bateria de 82 kW. A capacidade de recarga da bateria em corrente contínua também cresceu e passou de 150 kWh para 175 kWh, o que reduziu o tempo de recuperação de 80% da carga de 40 para 35 minutos. No carregador de 7,4 kWh, alugado pela própria Volkswagen, no entanto, essa mesma façanha vai consumir cerca de 9 horas e meia (Fotos de Eduardo Rocha, Auto Press).

 

Ponto a ponto

Desempenho – O ID.4 traz um motor elétrico traseiro com 204 cv e 31,6 kgfm de torque, suficientes para mover sem sofrimento este crossover seus 2.142 kg. São números bastante condizentes com a proposta familiar do modelo. Tanto que o zero a 100 km/h em 8,5 segundos não chega a ser um assombro para um elétrico, mas é bastante satisfatório para um crossover. De qualquer forma, a performance é bem convincente se o acelerador for pressionado para a liberação da potência do torque de forma instantâneo. O sistema de frenagem regenerativa não oferecer diferentes intensidades para uma maior interação dinâmica. Nota 8.

Estabilidade – A suspensão do ID.4 é rígida, como costuma acontecer com modelos europeus. Apesar disso, filtra bem as pequenas irregularidades da pavimentação, mas repassa o baque em desníveis maiores – o que mostra que está mais para crossover do que para SUV. O controle da carroceria é bem eficiente e nas curvas ele se vale do centro de gravidade rebaixado para se manter neutro e na trajetória desejada. Nota 9.

Interatividade – As informações ficam concentradas no painel de 5,3 polegadas fixado na coluna de direção. Os gráficos são minimalistas e bastante objetivos. A central multimídia de 10 polegadas da unidade testada mostrou uma certa resistência para espelhar os aplicativos Apple CarPlay e Android Auto, mas pelo menos o sistema tem um GPS interno. Além disso, alguns comandos são confusos (leia Impressões ao dirigir). O ID.4 traz ainda recursos ADAS, como alerta de colisão com frenagem autônoma, controle de cruzeiro adaptativo com Stop&Go, alertas de faixa, de ponto cego e de tráfego traseiro cruzado, entre outros. Nota 7.

Consumo – Pelos dados do Programa de Etiquetagem Veicular, o ID.4 é o crossover médio 100% elétrico mais gastador – mas também é um pouco maior que seus rivais diretos. Ele consome 0,63 Mj/km, contra 0,58 do Nissan Leaf, 0,57 do BMW iX2, 0,52 do Volvo EX30 e o 0,51 Mj/km do Renault Megane E-Tech. Com isso, consegue uma autonomia de 370 km com sua bateria de 77 kWh. Nota 9.

Conforto – A rigidez da suspensão do ID.4 é típica de modelos europeus e só chega a prejudicar o conforto em pavimentos muito precários. Em pisos regulares, o conforto de rodagem é alto, inclusive por outros fatores, como um ótimo isolamento acústico, aliado ao fato de ter um motor silencioso. Os bancos são ergonômicos, com abas bem ressaltadas que seguram bem o corpo. Nota 8.

Tecnologia – A plataforma do ID.4 é a MEB, de 2019, a mesma usada por modelos da Audi, Skoda e Seat. Ela bastante rígida e leve, com o bloco de baterias integrado ao piso. O crossover também traz diversos recursos ADAS, como sistema de estacionamento semiautomático com memória, freios regenerativos, etc. Nota 9.

Habitabilidade – O ID.4 conta com um entre-eixos de 2,77 metros e uma boa altura, de 1,62, medidas que por si só já geraria um espaço digno de SUV. Acontece que o modelo também é construído com uma plataforma modular que oferece piso plano e o volume dedicado ao motor bastante avançado. Resultado é uma área de habitáculo extremamente generosa e um porta-malas que humilha os rivais diretos, com 543 litros de capacidade. Como se trata de um modelo médio, a largura da cabine permite que três adultos se instalem no banco traseiro com conforto. Nota 9.

Acabamento – O marketing de carros elétricos sempre busca valorizar materiais ecológicos e recicláveis. Essa ideia inclui um certo desprendimento, que acabam por deixar de fora materiais consagrados como luxuosos. Ainda assim, a montagem e a escolha de materiais de revestimento deixam o ID.4 bastante requintado e agradável. Além do capricho nos detalhes, traz um o design interno bastante elegante e moderno. Nota 9.

Design – O ID.4 é um bom exemplo do estilo orgânico que a Volkswagen pretende implementar na próxima geração de automóveis – mesmo os com motor a combustão. A frente traz faróis elevados em forma de gota, conectados por um friso prateado, que é interrompido pela logo da marca em branco. Não há canto vivos e as superfícies são fluidas. A lanternas traseiras mantêm a forma de gota e são interligadas por um faixa de led com sobrelente fumê. Aparecem centralizados o nome do modelo e a logomarca em branco. Uma faixa em prata percorre as laterais desde a base da coluna dianteira até a coluna traseira. O resultado é um carro com volumes equilibrados, linhas atraentes e um toque de esportividade. Nota 10.

Custo/benefício – O Volkswagen ID.4 não tem preço. Literalmente. Como a Volkswagen oferece o modelo apenas para aluguel, com uma quilometragem livre de 36 mil km em dois anos, é preciso fazer as contas para saber se é adequado para o uso de cada consumidor. Pelo menos a marca reconheceu que com um aluguel de R$ 9.990 não iria a lugar nenhum e reduziu o valor para R$ 6.990. Sem nota.

Total – O Volkswagen ID.4 somou 78 pontos em 90 possíveis, ou redondos 87% do total.

 

Primeiras impressões

Excesso de minimalismo

O ID.4 tem uma combinação inusitada de requinte sem luxo. Ou seja: tudo no crossover da Volkswagen é refinado e de bom gosto, mas os materiais utilizados buscam cumprir a missão ecológica embutida no conceito de carro elétrico – sendo efetiva ou não. O console marrom em couro sintético harmoniza muito bem com o revestimento em cinza e creme dos bancos e creme do volante. Há ainda preto brilhante na moldura do console central, uma guarnição em prata e preto fosco nas áreas menos nobres, como as partes inferiores dos painéis. As cores e os materiais remetem dão um meio natureba, que contrasta com o ar tecnológico emprestado pelas telas do painel e da central multimídia. Um toque de humor é dado pelos pedais cromados com uma seta no acelerador e um sinal de pausa no freio.

Apesar do ambiente aconchegante, que ainda traz um teto panorâmico, os comandos do ID.4 não são muito amigáveis. O crossover traz a ideia de reduzir ao máximo o número de botões e controle. Não há, por exemplo, um sistema para dosar o nível de recuperação de energia nas desacelerações, que na prática acabam servindo para controlar as reações do carro e melhorar a interatividade.

Nessa sanha de criar comandos originais, o ID.4 traz comandos em um pequeno painel de toque à esquerda que mistura luzes e desembaçadores de forma pouco prática. Um outro exemplo, até inusitado, é o comando de abertura dos vidros. No lugar de um botão individual para cada janela, há um botão para definir a fileira do vidro, da frente ou de trás, e mais um botão para definir o lado do vidro. No fim das contas, trocou-se um comando direto por outro em duas etapas para economizar um botão – e complicar a vida do motorista.

No entanto, mesmo soluções incomuns acabam sendo incorporadas para quem usa o carro no cotidiano. E viram até uma questão menor quando de coloca o ID.4 em movimento. Como se trata de um elétrico, a resposta ao pisar no acelerador é imediata. A frenagem tem um toque agradável, a suspensão é firme, mas não desconfortável, e o carro contorna as curvas mais acentuadas com bastante facilidade. O ID.4 deixa sensação de solidez e controle para quem está ao volante. Há pequenos detalhes que poderiam ser revistos – como os comandos dos vidros e o fato de a luz do porta-malas apagar depois de 30 segundos, mesmo com a tampa aberta, entre outros.

O crossover da Volkswagen, acima de tudo, se mostrou agradável no dia a dia e tem uma autonomia que permite se despreocupar da questão da autonomia, pelo menos na cidade (são 370 km, segundo os critérios do InMetro). O melhor para o usuário é desenvolver a mesma rotina de celular: plugar o carro na tomada em cada oportunidade e também todas as noites.

 

Ficha Técnica

Volkswagen ID.4 Pro

Motor: Elétrico, traseiro, síncrono de corrente alternada. Alimentado por um conjunto de baterias de íons de lítio com 77 kWh. Controle eletrônico de aceleração.

Transmissão: Por engrenagem de relação única com inversor de fase para a ré. Tração dianteira e controle eletrônico de tração de série.

Potência: 150 kW, ou 204 cv.

Torque máximo: 31,6 kgfm.

Suspensão: Dianteira do tipo McPherson, independente com barra estabilizadora, amortecedores hidráulicos e molas helicoidais. Traseira independente multilink com barra estabilizadora, amortecedores hidráulicos e molas helicoidais. Oferece controle eletrônico de estabilidade de série.

Pneus: dianteiros com 235/45 R21 e traseiro com 255/40 R21.

Freios: Discos ventilados na frente e tambor atrás. Oferece ABS com EBD e frenagem automática de emergência. Sistema regenerativo de energia.

Aceleração 0-100 km/h: 8,5 segundos.

Velocidade máxima: 160 km/h

Carroceria: Crossover em monobloco, com quatro portas e cinco lugares. Comprimento de 4,59 metros com 1,85 m de largura, 1,62 m de altura e 2,77 m de entre-eixos. Possui airbags frontais, laterais e de cabeça de série.

Peso: 2.142 kg.

Capacidade do porta-malas: 543 litros.

Autonomia: 370 km na norma InMetro.

Lançamento no Brasil: 2023.

Produção: Zwickau, Alemanha.

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