
As matriarcas do axé comandaram a passarela ao longo do desfile da escola de samba Jardim das Palmeiras, que homenageou mães de santo e protestou contra o racismo religioso. A única representante de São José se apresentou na madrugada deste domingo (2), a partir de 1h10, na Passarela Nego Quirido.

Jardim das Palmeiras levou luta anti-racismo e exaltou mães de santo no Carnaval 2025 de Florianópolis – Foto: Mafalda Press/ND
A comissão de frente trouxe uma coreografia que mostrava mães de santo seguindo em frente mesmo diante de ataques contra religiões de matriz africana. O desfile da Jardim das Palmeiras teve uma predominância de mulheres no desfile, seguindo o que propunha o enredo, que exalta o protagonismo feminino em religiões de matriz africana.
Uma grande ala de baianas deu força para o samba-enredo da escola. As mulheres representavam as matriarcas do axé e, vestidas de branco, tinham guardiãs no início e no fim da ala. Elas representavam as Iyakekerê, conhecidas como mães-pequenas, a segunda pessoa mais importante no terreiro após as mães de santo.
Nunca é tarde para realizar o sonho
Aos 84 anos, Mariana Raimundo realizou o sonho de desfilar como baiana em uma escola de samba no desfile da Jardim das Palmeiras.
“É a minha primeira vez desfilando. Eu sempre adorei as baianas e agora fui convidada para ser uma. Eu estou realizando um sonho”, conta sorridente.
Poucas fileiras atrás, Ana Regina da Silva se posicionava para o 9º desfile do final de semana. Conhecida como Babaloo do 25, ela desfila para as 10 escolas de samba do Carnaval de Florianópolis. Aos 62 anos, Babaloo desfila na avenida desde os 7 anos.
“É correria. Mas ainda bem que a gente tem pulseirinha. Então eu já entro direto por aqui. O tema [do Jardim das Palmeiras] está lindo esse ano.”
Mães de santo da grande Florianópolis são destaque de carro alegórico

Mães de santo foram destacadas em carro alegórico da Jardim das Palmeiras – Foto: Gabriela Ferrarez/ND
A cor branca, que para religiões de matriz africana representa paz, positividade e transformação, foi predominante na passarela. Junto com o verde, o prata e dourado, a paleta dominou as duas primeiras partes do desfile, que falaram sobre os ritos feitos por mães de santo na umbanda e no candomblé.
O segundo carro alegórico trazia mães de santo e, sentada na diante do carro estava Claudete Machado. Prestes a completar 83 anos, a mãe de santo trabalha no Morro do Mocotó, no Centro de Florianópolis e inspirou o tema do samba-enredo do Jardim das Palmeiras em 2025.
“Sou formada como mãe de santo há 22 anos, mas estou na umbanda há 30. Na umbanda você entra por amor ou pela dor. Pela dor é quando a gente tem um problema e por amor é quando a gente gosta e quer entrar. Eu entrei pela dor, tinha um problema de saúde”, conta a mãe de santo, que sempre desfilou pela Jardim das Palmeiras antes de ser homenageada.

Aos 82 anos, a mãe de santo Claudete Machado trabalha no Morro do Mocotó, no Centro de Florianópolis – Foto: Gabriela Ferrarez/ND
‘A negritude luta contra a intolerância’
“A justiça há de vingar e o amor prevalecer. A negritude luta contra a intolerância”, diz o samba enredo composto pelos músicos Rafael Muniz, Leléo Medeiros e Lucas Donato.
A duas últimas partes do desfile escancaram o moralismo e a violência do racismo religioso. Uma ala estampou em roxo e preto a data de 1941, ano em que uma Lei do Silêncio impediu que os terreiros funcionassem de noite.
Em seguida, várias alas estamparam o rosto de mulheres importantes para as religiões de matriz africana.
- Iya Nassô, que fundou o terreiro de Candomblé mais antigo no Brasil no século XIX
- Eugênia Ana dos Santos, a Mãe Aninha, foi uma das fundadoras do Ilê Axé Opô Afonjá e instituiu o Corpo de Obás de Xangô no Opô Afonjá, com funções de proteção e resguardo
- Mãe Menininha, a quarta Ialorixá a assumir o trono, foi por 64 anos a Oxum mais bonita, como carinhosamente é cantada e celebrada
- Maria Stella de Azevedo Santos, a Mãe Stella de Oxóssi, o OdéKayode, foi a quinta Ialorixá a assumir o comando do Afonjá
- Mãe Olga Ventos que escolheram Dionísia Francisca Régis, a Mãe Olga, para comandar o Terreiro Ilê Maroiá Láji, o Terreiro de Alaketu, por 57 anos
- Mãe Malvina fundou em 1947 o primeiro terreiro de Umbanda da região da Grande Florianópolis
- Mãe Avelina lutou para a solidificação e presença das religiões de matriz africana na região da Grande Florianópolis
As palmas puxadas pela penúltima ala do desfile da Jardim das Palmeiras puxou o público, que levantou os braços para acompanhar a batida.
Casal de mestre-sala e porta-bandeira da Jardim das Palmeiras – Vídeo: Gabriela Ferrarez/ND