Pará, sede da COP30, é o segundo estado brasileiro que mais desmatou em 2024

O Pará, que sediará a COP30, é o segundo estado com maior área desmatada em 2024, segundo Relatório Anual de Desmatamento no Brasil, produzido pelo MapBiomas. Apesar da diminuição do desmatamento em relação ao ano anterior ser de 30%, nacionalmente e de 15% no Pará, o sucateamento dos órgãos de monitoramento federal e estadual, a falta de uma política efetiva de reforma agrária e regularização fundiária ainda fazem do Pará um dos estados onde mais há conflitos entre comunidades tradicionais e empreendimentos, como de agropecuária e mineração.

Segundo o MapBiomas, o Pará só perde para o Maranhão na lista nacional das áreas desmatadas. A unidade federativa está inserida no bioma amazônico, que tem a segunda  maior área desmatada do país, com 30.4% de supressão de vegetação nativa. Em 2024, a Amazônia foi ultrapassada pelo Cerrado no ranking. O bioma amazônico registrou o menor índice de desmatamento desde o início da série do MapBiomas, em 2019. Contudo, a situação ainda é preocupante, sobretudo para comunidades tradicionais, que lutam em defesa da floresta em pé.

“A Amazônia foi o segundo bioma que mais desmatou em 2024. Apesar disso, quando a gente compara com o ano de 2023, houve uma redução de desmatamento, e essa redução foi de 17%. Já sobre o estado do Pará, ele foi o segundo que mais desmatou no país”, explica Larissa Amorim, pesquisadora do Imazon e da equipe Amazônia do MapBiomas. Segundo ela, quando a gente olha para o ranking de unidades de conservação que mais desmataram em 2024, a APA Tronco do Xingu ocupa o topo do ranking de desmatamento. Ela está localizada entre os municípios de Altamira e São Felix do Xingu, que apresentam também altas taxas de devastação.

Conflitos em defesa da floresta em pé e das comunidades tradicionais

Segundo relatório de Conflitos no Campo de 2024, lançado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) em abril deste ano, o número de ocorrências de conflitos por terra aumentou 38% no Pará. Para o coordenador da CPT, Francisco Alan Santos, o índice de desmatamento e outros tipos de degradações ambientais seria menor se houvesse uma participação mais efetiva do estado nesses conflitos.

“Se a gente pega os dados do caderno, ele vai apontar esse índice do desmatamento ilegal, que aumentou. Então, apesar de alguns números mostrarem que o desmatamento caiu, temos também essa realidade, de áreas que devem ser monitoradas pelo Estado. E eu também falo do governo estadual do Pará”, aponta Alan.

Para ele, há uma necessidade de uma maior fiscalização das forças de segurança e de uma ação interligada dos órgãos responsáveis. “A gente sabe que teve uma frente de políticos que foram enfrentar o governo federal, para poder inibir essas fiscalizações, de não acontecerem. Então a gente vê que representantes do Estado, que são ligados com o empresariado, foram fazer uma frente para inibir as fiscalizações, para que não aconteçam”, alerta.

Brigada contra incêndios ilegais do povo Kumaruara – Foto: Divulgação

Guardiões ancestrais das florestas em pé, as comunidades tradicionais seguem sendo protagonistas no combate a desmatamentos e incêndios ilegais. É o que explica Tainan Kumaruara, do povo Kumaruara, do baixo Tapajós. “A gente percebe também que as áreas onde tá conservada a floresta mesmo em pé, a floresta fechada, são áreas onde tem povos indígenas ou alguma outra comunidade tradicional, ou tem ribeirinhos morando ali, ou é mesmo os quilombolas”, ressalta.

Uma das formas que o povo Kumaruara encontrou para combater rapidamente focos de incêndio foi se juntar a uma rede de brigadas indígenas e voluntárias de combate a incêndios ilegais. Eles são responsáveis por monitorar Santarém, município polo da região do Tapajós que registrou a qualidade do ar 30 vezes pior do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em abril de 2024, segundo a plataforma suíça de monitoramento IQAir, divulgada pela CNN.

“A gente se organizou dentro de uma rede de brigadas do Baixo Tapajós, onde ela vem se fortalecendo e vem criando alternativas pra gente diminuir os focos de calor e atuar com menor tempo. Quando tem um incêndio, a gente informa a brigada mais próxima”, celebra Tainan. Ela conta que seu povo está se organizando para que o tempo de combate seja ainda mais rápido, “levando em consideração que a gente tá dentro de uma Resex, Tapajós Arapiuns, então a governança desse território é do ICMBio, e o órgão não tem uma brigada institucional, muitas vezes não tem nem condições de dar um suporte para as brigadas que estão disponíveis pra atuar dentro do território”, afirma a liderança.

Daniel Govino, diretor de comunicação da Brigada Comunitária de Incêndio Florestal de Alter do Chão, explica a importância dessas ações comunitárias, mas também faz um alerta para os fatores que causam desmatamento na Amazônia. Segundo ele, o Brasil é responsável por 3% das emissões de gases de efeito estufa no planeta. Das nossas emissões, 46% vem da mudança do uso do solo – basicamente desmatamento – e 28% da agropecuária.

“Então, agropecuária e desmatamento são responsáveis por 74% das nossas emissões. O Pará e o Mato Grosso são responsáveis por 13% cada um, dessas emissões brasileiras. A gente poderia liderar os índices, com desmatamento zero, se fizéssemos reforma agrária, com monitoramento mais eficiente e punição de verdade para esses desmatadores”, propõe.

Daniel falou ainda que a Brigada de Alter trabalha de forma integrada com o ICMBio. “A gente está também na construção da Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, a gente faz parte do comitê. Com as mudanças climáticas, a situação ficou diferente, porque tá cada vez mais seco. Uma floresta que não pegava fogo antes, agora pega. Porém, o problema dos incêndios vem fora das áreas de conservação, fora das terras indígenas, vem das áreas griladas, vem das áreas públicas não destinadas”, conclui.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.